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Revista Quebrando Silencio 2023

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ANTES E DEPOIS

A experiência de ser mãe é acompanhada de mudanças no corpo e na mente que precisam ser compreendidas

PODER DE ESCOLHA

Toda gestante precisa ter voz e ser respeitada

PARTO (A)NORMAL

O que você precisa saber para evitar abusos e maus-tratos na maternidade

PROT EÇÃO A Q UE M G ERA UMA VIDA

JEANETE LIMA

Omilagre da vida se renova a cada gestação e faz da maternidade uma experiência singular, permeada de signi cados e emoções. Da concepção até o nascimento e o desenvolvimento da criança, existe um caminho cruzado por situações inusitadas e atores que podem favorecer ou frustrar essa vivência sublime.

Lembro-me de quando eu e meu esposo planejamos a chegada do nosso lho. Inicialmente, houve euforia e felicidade, mas, à medida que a gravidez avançava, meu corpo se transformava e os enjoos frequentes mudaram nossa rotina. Antes do parto, o medo e a insegurança se instalaram em minha mente. Uma cesárea de emergência foi realizada para salvar a mim e ao bebê, por causa da perda signi cativa de líquido no rompimento antecipado da bolsa, seguido da não-dilatação e de horas de espera. O turbilhão de emoções e surpresas continuou ao amamentar e cuidar do bebê. A recuperação da cirurgia e o retomar a vida levou tempo, mas a boa equipe de pro ssionais de saúde, a assistência do meu esposo e a rede de apoio dos familiares e amigos me ajudaram a superar as di culdades e viver o melhor dessa experiência.

Infelizmente, nem sempre a maternidade resulta em realização. Fatores como falta de planejamento familiar e de vínculo a uma maternidade no pré-natal, desinformação, ausência de uma rede de apoio e de acompanhante na sala de parto, bem como o descumprimento das leis que garantem o direito ao atendimento médico adequado, podem potencializar o padecimento da mãe e do lho. Mais grave e traumático é quando ocorrem maus-tratos.

Ainda não há consenso sobre o termo correto para se referir à imposição de um grau signi cativo de dor e sofrimento evitáveis à parturiente e ao bebê. Há entidades e acadêmicos que chamam a prática de “violência obstétrica”, enquanto outros, incluindo a Organização Mundial de Saúde (OMS), referem-se a ela como “abusos, desrespeito e maus-tratos durante o parto nas instituições de saúde”.

Fato é que esse problema diz respeito aos maus-tratos físicos, psicológicos, xingamentos, negligência e procedimentos impostos pelos pro ssionais de saúde que desrespeitam a autonomia materna para tomar certas decisões. Todo tipo de abuso antes, durante ou depois do parto, viola o direito à vida e à saúde, podendo afetar seriamente a mãe e o bebê. Por isso, em caso de violência, a denúncia deve ser levada aos órgãos competentes.

O nascimento de uma vida transforma vidas. Com acolhimento, apoio, informação e um bom acompanhamento médico em cada fase é possível proporcionar uma experiência feliz na maternidade. Cuidar de quem gera a vida é promover o que Jesus nos oferece: “Eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância” (João 10:10).

JEANETE LIMA é educadora e coordenadora da campanha Quebrando o Silêncio na América do Sul

Fotos: ©Jorm S Adobe Stock e Gustavo Leighton/DSA
É preciso combater todo tipo de abuso antes, durante ou depois do parto
EDITORIAL QUEBRANDO O SILÊNCIO 2

SUMÁRIO

2 EDITORIAL

Proteção a quem gera uma vida

4 ENTREVISTA

Poder de escolha

6 ENTENDA

Responsabilidades compartilhadas

14 REDE DE SALVAÇÃO

As mães precisam de cuidado e companhia

8 SONHO OU PESADELO?

Como tornar o parto mais seguro e evitar traumas

22 RESENHA

Consulte o manual

24 FAMÍLIA PLANEJADA

O que levar em conta antes de ter filhos

16 PARADOXOS DA MATERNIDADE

O choque entre a expectativa e a realidade

20 ANTES E DEPOIS

O pós-parto e as mudanças no corpo e na mente da mulher

Edição Especial • 2023

Editores: Anne Seixas, Jefferson Paradello

e Márcio Tonetti

Projeto grá co: Eduardo Olszewski

Designer: Ana Bergamo

Foto da capa: imagens Adobe Stock, montagem

Eduardo Olszewski

Casa Publicadora Brasileira

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Tiragem: 1.004.274 exemplares 21046/46105
Fotos: Adobe Stock

POD E R D E E SCOLHA

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Trazer uma criança ao mundo envolve muitas situações e pessoas. Porém, a mãe é a protagonista. Se a equipe médica não respeita os desejos e necessidades dela no momento do parto, ocorre a violência obstétrica. Esse termo de ne o uso de procedimentos dispensáveis, agressões físicas ou verbais e condutas invasivas contrárias à vontade daquela que está prestes a dar à luz. Ocorrências desse tipo têm ampliado o debate sobre algumas práticas utilizadas nos centros de obstetrícia. É o caso das cesarianas, método que ainda divide opiniões. Embora esse tipo de procedimento possa salvar vidas nas situações em que o parto vaginal oferece risco à mãe ou ao bebê, o elevado número de cesáreas eletivas é um fenômeno que merece atenção. Países sul-americanos como Brasil, Chile, Colômbia, Paraguai e Equador lideram o ranking dos que mais realizam esse tipo de cirurgia sem uma indicação médica real ou contra a vontade da gestante, segundo pesquisa publicada na revista cientí ca The Lancet, em 2018. A  enfermeira obstetra, professora e pesquisadora Vivianne Silva acompanha o dia a dia de pacientes no hospital público em que trabalha. Na entrevista a seguir, a mestre em Enfermagem da Mulher pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e doutora em Enfermagem pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro nos ajuda a entender e evitar a violência no parto.

ENTREVISTA
informações sobre procedimentos de parto é fundamental para combater a prática da violência obstétrica
VIVIANNE SILVA
ANNE SEIXAS
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Foto: ©chompoo | Adobe Stock

A cultura de se realizar cesáreas tem in uência nos índices de violência obstétrica?

Sem sombra de dúvidas. Às vezes, a violência obstétrica pode vir disfarçada de auxílio para ajudar a gestante. Mas ainda é difícil apresentar o outro lado, uma vez que os grupos educativos sobre o assunto são incipientes. Fato é que as mulheres passam hoje por uma grande mudança no entendimento do que é o parto, independentemente de classe social e etnia. Isso varia dependendo de onde ela será atendida, se no sistema público ou privado. O apelo para que a cesariana seja escolhida também está relacionado à dor causada durante o parto. Na rede privada, essa cultura prende-se muito à justi cativa de que a cesariana causa menos sofrimento à mulher. Já na rede pública, é adotada para poupar os pro ssionais dos gritos que, em sua dor, as mulheres emitem durante o parto normal.

Quais são os riscos de um procedimento como esse de forma desnecessária?

A cesariana costuma ser apresentada como um benefício à mulher. Assim, ela pode entender que a equipe salvou sua vida, desconhecendo, porém, os riscos e malefícios associados a esse procedimento, que, vale lembrar, não é uma via de parto, mas uma intervenção cirúrgica. Muitas mulheres submetidas à cesariana acabam tendo que retornar às instituições de saúde por causa não somente de questões estéticas, mas também devido a inferências anatômicas e infecções, além dos diagnósticos errôneos. Muitas vezes, a parturiente acaba na mesa cirúrgica sem nem saber o motivo. A cultura cesarista é muito focada em medicamentos e procedimentos. Por isso, a paciente acaba submetida às ordens médicas sem saber exatamente o porquê. Dessa maneira, ela pode ser violentada das mais diferentes formas, inclusive sicamente.

E quais seriam as vantagens do parto normal em relação à cesariana? Que benefícios ele traz para a mãe e o bebê?

Ele é muito mais seguro para ambos. Um dos motivos é a preservação do sistema reprodutivo. Mulheres que passam por cesarianas têm maior probabilidade de hemorragias. Isso pode resultar

em histerectomia, que é a retirada cirúrgica do útero e seus anexos, de forma desnecessária. Geralmente, o modelo cesarista traz o pressuposto de que a mulher que se submeteu a esse procedimento não poderá ter um parto vaginal em novas gestações. O parto normal também garante menor índice de bebês prematuros, visto que cada parto e cada gestação têm o seu tempo dada a questão hormonal. O puerpério dessas mulheres é muito mais rápido, com menores índices de complicações e até de dores. Ela será a protagonista do próprio parto e terá as possibilidades de escolhas para as posições mais confortáveis.

Você trabalha diretamente com partos, assistindo as parturientes e a equipe médica. Quais práticas precisam mudar nesse processo para torná-lo mais respeitoso para a mãe?

Quanto mais orientada ela estiver sobre seus direitos, menor será a incidência da violência obstétrica. É imprescindível que haja um acompanhante no momento do parto. Ele é um grande aliado para evitar o ato violento. A presença das doulas também fortalece o apoio emocional. Essa pessoa pode perceber violências às quais a mulher nem sempre está atenta devido à atividade do parto. A capacitação contínua dos pro ssionais também é importante para que eles sejam sensibilizados.

Qual seria a equipe ideal para assistir uma mulher no seu processo de parto?

O melhor parto é aquele em que o pro ssional não precise fazer nada. Trata-se de um processo siológico, natural. A medicina, especialmente a ocidental, tomou posse desse processo tão intrínseco dos seres humanos. O ideal é que os prossionais sejam aqueles que usam as evidências cientí cas como base para as decisões, procedimentos e eventuais intervenções.

Como a mãe pode se preparar para ter um parto respeitoso, que valide seus desejos e preferências nesse processo?

Orientação prévia, a presença do acompanhante e, num plano ideal, a mudança das culturas institucionais.

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RE SPONSABILIDAD ES COMPARTILHADAS

Pais e mães precisam apoiar-se mutuamente para tornar a chegada de um filho mais leve e feliz

JEFFERSON PARADELLO

Apia está cheia de louça suja. O cesto de roupas transborda. No sofá está a mãe cansada após um longo dia cuidando de seu bebê, que tem poucos meses de vida. O marido trabalha fora. Sai quando o sol nasce e retorna apenas quando já está escuro. Ao chegar em casa, o que deve fazer? Dar um beijo na esposa, na criança, e ir descansar para o dia seguinte, ou vestir a camisa e cuidar do bebê?

Assim como a mãe, o pai também tem papel fundamental a desempenhar não apenas na provisão nanceira para suprir as necessidades dos lhos, mas também no fortalecimento dos vínculos por meio de sua atuação nas demandas do dia a dia. Isso demonstra o suporte e amor por sua esposa. Acerca disso, o apóstolo Paulo, em sua carta aos Efésios, escreveu: “Maridos, que cada um de vocês ame a sua esposa, como também Cristo amou a igreja e se entregou por ela” (5:25, NAA).

Isso signi ca conhecer suas necessidades, suas preocupações e buscar formas de aliviá-las diante das mais diferentes cargas. Com isso, ele faz todo o possível para assegurar sua felicidade, seja no que diz respeito à maternidade ou em outras situações da vida a dois. O casamento deve ser uma parceria sólida. A chegada de uma criança requer ainda mais compreensão e auxílio por parte de ambos.

A seguir, entenda a importância de se ter responsabilidades compartilhadas:

NO SUPORTE À MÃE

Após o nascimento de um filho, por diversas razões (veja os detalhes na p. 16), há mulheres que enfrentam uma situação delicada: a depressão pós-parto ou outras condições adversas relacionadas. Nesse momento, o apoio do esposo é fundamental para dar suporte físico/emocional e na própria atenção ao bebê.

ENTENDA
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NAS TAREFAS DE CASA

Dentro de um lar, as responsabilidades não devem se restringir apenas à mãe, principalmente quando há uma criança. Tarefas simples e complexas devem ser compartilhadas. Elas precisam ser definidas com base em uma conversa franca e madura, visando deixar claro o papel de cada um.

NO EXEMPLO

Aos olhos de um filho, o exemplo dos pais tem um peso muito importante. Mesmo que esteja em uma idade em que não compreenda totalmente o significado das palavras, aquilo que fazem e a forma como tratam outras pessoas, por exemplo, impacta a mente em formação e ajuda a moldar o caráter.

NAS FINANÇAS

Quando se une em matrimônio, o casal precisa ter definido, com antecedência, um dos assuntos mais cruciais do relacionamento: as finanças. Como será o funcionamento do lar? Ambos irão trabalhar? E com a chegada de uma criança, a esposa se dedicará integralmente aos cuidados dela? Ter o apoio de ambos evitará conflitos.

NA EDUCAÇÃO

NO TEMPO DE QUALIDADE

Por vezes, a rotina diária compromete o tempo que é dedicado aos filhos. Sobretudo nos anos de formação da criança, a presença materna e paterna são ativos valiosos para o seu desenvolvimento. Frente a isso, os pais precisam separar momentos de qualidade para conversar, interagir, brincar, perguntar, ensinar, demonstrar carinho e participar ativamente da vida de seus filhos.

Educar uma pessoa não se restringe apenas ao ambiente escolar. Isso, na verdade, começa em casa. Pai e mãe precisam ser participativos nesse processo, mas antes devem discutir como enxergam os mais variados temas, os valores que pretendem transmitir e, acima de tudo, devem estar alinhados quanto a isso. A não concordância em pontos fundamentais para o outro pode prejudicar a própria relação.

NA FORMAÇÃO DOS VALORES ESPIRITUAIS

Pais também possuem suas crenças espirituais. Muitos optam por repassálas aos filhos, enquanto outros esperam que essa seja uma descoberta individual. Por isso, devem dialogar sobre como pretendem lidar com o assunto e o que querem que seus filhos aprendam. Os valores espirituais podem influenciar o caráter e contribuir para a formação dos valores morais, sociais e, inclusive, profi ssionais.

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Fotos: ©ssstocker, MINIWIDE, mast3r, SurfupVector, Olha, Vector Juice, NTL studio | Adobe Stock

SONHO OU PESADELO?

CHARLISE ALVES

O

que fazer para tornar o parto mais tranquilo e seguro

QUEBRANDO O SILÊNCIO 8 CAPA
Fotos: Adobe Stock, montagem Eduardo Olszewski

chegada de um lho é um momento único e muito esperado pela maioria dos casais. Mas a experiência do período gestacional até o nascimento do bebê nem sempre é boa. Por vezes, é conturbada e até traumática. A escolha de um bom obstetra para acompanhar o pré-natal é um passo indispensável e fundamental para a segurança da gestante. Mesmo assim, com todos os cuidados, a mulher está suscetível a sofrer abusos, desrespeito e maus-tratos durante esse período.

A ginecologista e obstetra do Hospital Adventista de São Paulo, Stephani Gomes, a rma que a violação pode partir de qualquer pro ssional e abranger falhas estruturais no sistema de saúde de clínicas e hospitais.

Marceli Santos (pseudônimo) foi vítima desse problema quando engravidou pela primeira vez, em 2008. Durante as consultas em uma clínica, seu ginecologista nunca falou sobre a caderneta da gestante, documento praticamente obrigatório, em que constam informações importantes sobre o histórico da paciente. De acordo com ela, o médico sequer pediu que tomasse imunizantes cruciais, e, pela falta de orientação, cou sem as vacinas. “Como era a minha primeira gestação, não conhecia os métodos corretos. Admito que não me preocupei em buscar informação sobre como deveria ser o pré-natal ideal. Apenas acreditei no meu médico”, relembra.

Além da negligência em privar a gestante de cuidados importantes, o pro ssional realizou um procedimento no próprio consultório sem a autorização da paciente. “Achei que ele iria fazer o exame de toque, mas a agressividade me assustou e comecei a gritar de dor, sem imaginar o que estava fazendo”, ela lembra. O médico comunicou que havia deslocado a bolsa para acelerar o parto, apesar de o bebê estar com apenas 34 semanas. O marido de Marceli também se assustou ao ver o sangramento e desmaiou. A lha do casal nasceu no dia seguinte, em uma cesárea de emergência, em consequência do sofrimento fetal.

O QUE É VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA?

Embora o termo “violência obstétrica” divida opiniões, as diferentes formas de “abusos, desrespeito e maus-tratos durante o parto nas instituições de saúde”, como de ne a OMS, são um problema real que precisa ser combatido. “Por isso, é importante que a mulher que está em trabalho de parto ou que acabou de dar à luz conheça seus direitos. O pro ssional de saúde tem a obrigação de explicar a nalidade de cada intervenção ou tratamento, bem como os riscos existentes e as alternativas disponíveis”, especi ca a doutora Giuliana Fernandes, professora universitária e enfermeira obstétrica. Um exemplo de violência durante o parto que teve

grande repercussão foi registrado no Rio de Janeiro. O médico anestesista que estuprou uma mulher anestesiada no centro cirúrgico foi preso pelo crime cometido.

Uma pesquisa da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) revela que a violência obstétrica no Brasil atinge 36% das gestantes, tanto na rede pública quanto na rede privada. Outra pesquisa da Fundação Perseu Abramo apontou que 25% das mulheres, ou seja, uma em cada quatro, já sofreu algum tipo de abuso desse tipo. No Brasil, não há lei federal ou outra regulamentação nacional sobre o que con gura ou não violência obstétrica. No entanto, a violação dos direitos das gestantes e parturientes pode ser enquadrada como lesão corporal e importunação sexual, por exemplo.

Diferentemente do Brasil, alguns países na América do Sul, como a Argentina e o Suriname, possuem leis federais que tipi cam a violência obstétrica. No caso da Argentina, existe, desde 2009, a lei 26.485, que trata de violência contra a mulher e contempla, no artigo 6, a violência obstétrica. No entanto, a legislação argentina não prevê penalizações para os pro ssionais de saúde que a praticam. Um estudo estima que a cada quatro dias uma mulher é vítima de violência obstétrica no país.

No Suriname, esse tipo de abuso foi inserido nas leis penais e se tornou crime. Já o Chile segue na contramão desses países e busca alternativas para solucionar a falta de regulamentação e sanções sobre a violência obstétrica, já que é expressivo o número de casos desse tipo em seu território. Para se ter ideia, o Observatório de Violência Obstétrica do Chile veri cou que mais de 50% das mulheres pesquisadas relataram ter sofrido maus-tratos.

COMO IDENTIFICAR

Para a doutora Giuliana, quando a mulher é privada de orientações durante o acompanhamento gestacional, ela pode estar suscetível a não identi car sinais de violência. Conforme a doutora Stephani acrescenta,

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uma forma de detectar a violência obstétrica é quando a mulher não é acolhida, respeitada e devidamente orientada sobre medicações, manobras ou mudança de conduta. Ela alerta para frases claramente desrespeitosas ditas a pacientes: “se você não zer a força certa seu bebê nascerá parado”, “deixa eu ajudar você empurrando a barriga” e “cale a boca, não grite”.

Xingamentos, gritos, recusa de atendimento, comentários constrangedores e procedimentos sem autorização e desnecessários do ponto de vista clínico são atitudes classificadas como violência obstétrica. O mesmo ocorre quando há tentativas de impedir que a mulher escolha sua posição de parto, quando há falta de analgesia e negligência.

Existem, ainda, técnicas médicas adotadas rotineiramente sem comprovação cientí ca, como a episiotomia, realizada com base na crença de que facilitaria o nascimento e preservaria a integridade genital da mulher. Outro exemplo é a chamada manobra de Kristeller, que é a pressão sobre a barriga forçando a saída do bebê. O Ministério da Saúde brasileiro considera que a episiotomia de rotina, a manobra de Kristeller e

NÃO SE CALE

Cada país da América do Sul tem um canal para receber as denúncias de violência obstétrica. No Brasil, basta discar o número 180 (Central de Atendimento à Mulher) ou 136 (Disque Saúde). No Chile e na Argentina é o 144. De forma geral, os demais países sul-americanos também possuem um canal específico para denunciar casos de violência contra a mulher. Procure saber como funciona no país em que você reside.

outros procedimentos semelhantes são prejudiciais ou ine cazes e, por isso, devem ser eliminados.

PREVENÇÃO

O conhecimento é a melhor maneira de prevenir a violência obstétrica. Por isso, é fundamental que tanto a mulher quanto seu acompanhante estejam beminformados sobre o pré-natal, o trabalho de parto e a maternidade. As doutoras Stephani e Giuliana sugerem algumas precauções que podem minimizar os riscos e tornar a chegada do lho mais tranquila e segura:

1. Visite o hospital antes do parto. Assim, é possível se informar sobre as práticas adotadas pela instituição.

2. Escolha bem o pré-natalista Busque um pro ssional que passe con ança e que a acompanhe até o m da gestação.

3. De na com a equipe do pré-natal o seu plano de parto Nada mais é do que um documento, recomendado pela OMS, com indicações daquilo que a mulher deseja para o seu parto. Esse documento deve ser entregue e protocolado na maternidade.

4. Conheça suas patologias. Também é preciso se informar sobre o que é ou não aceitável nos atendimentos realizados.

5. Mantenha-se saudável no período da gestação. Isso inclui boa alimentação e a prática de exercícios físicos.

6. Tenha sempre um acompanhante. A presença de outra pessoa previne a violência obstétrica.

No Brasil, a Lei Federal 11.108/2005 garante às parturientes o direito à presença de acompanhante desde o momento do trabalho de parto até o contexto imediato ao nascimento no Sistema Único de Saúde (SUS), seja da rede própria ou conveniada. A informação é ouro tanto para a parturiente quanto para o acompanhante. “O parto é desa ador e a equipe não é familiar. O acompanhante precisa dar sustentação, e ele não consegue fazer isso se estiver surpreso, inseguro ou mal-informado sobre o processo de parir”, a doutora Giuliana observa.

PARTO HUMANIZADO

O aumento da violência obstétrica tem feito muitas mulheres optarem pelo parto humanizado, um método que, segundo a OMS, “respeita o processo natural e evita condutas desnecessárias ou de risco para a mãe e o bebê”. Giuliana, que é doutora em Enfermagem pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, explica que o objetivo da assistência humanizada é permitir que o processo siológico do nascimento aconteça.

Humanizar o parto signi ca, portanto, deixar a mulher como protagonista. Ou seja, dar a ela liberdade de escolha para conduzir esse processo de uma forma mais siológica, inclusive podendo parir na posição desejada, seguindo, é claro, os critérios da

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Foto: ©vpanteon Adobe Stock

equipe de obstetrícia para a segurança da própria mulher. O parto humanizado é mais associado ao parto normal ou vaginal, mas a cesárea também pode ser considerada um parto humanizado, desde que a escolha seja da gestante ou que haja indicação real de risco para a mãe ou o bebê, e que não envolva nenhum tipo de violência obstétrica.

Estudos científicos evidenciaram que mulheres que adotaram posições verticalizadas – de pé, sentadas, ajoelhadas ou andando – reduziram a fase ativa do trabalho de parto (em média, 1h20 a menos). Sem contar a redução de 20% de analgesia de parto e a redução de 30% de cesarianas. O parto humanizado pode ocorrer de várias formas: na horizontal, de cócoras, no hospital, em casa e até em uma banheira com o auxílio de enfermeiros, médicos, doulas e familiares.

“A mulher que está bem conectada com o seu corpo consegue perceber intuitivamente as posições que lhe trazem mais conforto, e esses movimentos com frequência estão associados à abertura de espaços e ângulos na pelve que vão favorecer a descida do bebê. Se ela está desconfortável, isso provavelmente esteja relacionado com a pressão do bebê em estruturas que estão gerando mais dor, e que poderiam ser mais facilmente liberadas com a livre movimentação”, explica a doutora Giuliana.

O parto humanizado é uma forma de inibir a violência obstétrica. Porém, nada assegura completamente que a violação não vai acontecer. O melhor meio para prevenir abusos e maus-tratos é o conhecimento sobre os direitos na gravidez.

TRAUMAS E SOFRIMENTO

Ser vítima de qualquer tipo de violência traz consequências, ainda mais num período em que a mulher está mais sensível devido aos hormônios da gravidez. A doutora Giuliana sublinha que “a repercussão da violência obstétrica afeta a qualidade de vida das mulheres, e pode resultar em abalos emocionais, traumas, depressão, di culdades na vida sexual, entre outros”.

A história de Marceli, vítima de violência obstétrica por parte de seu médico, teve um nal feliz. “Graças a Deus, à minha família e à intervenção de outros médicos, minha lha nasceu saudável e hoje está com 14 anos de idade”, relata. Apesar de não querer ter mais lhos devido ao trauma que passou, após quatro anos, em 2012, engravidou, mas sofreu um aborto espontâneo. Em 2018, de forma não intencional, cou

grávida novamente. Dessa vez, tudo ocorreu bem e seu lho nasceu sem nenhuma intercorrência ou violação por parte da equipe de obstetrícia. “Apesar dos traumas que vivi, me tornar mãe foi uma bênção de Deus”, ela reconhece.

CHARLISE ALVES é jornalista e mãe de dois lhos

TIPOS DE VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA

▪ Tratamento humilhante e degradante.

▪ Abuso de medicamentos.

▪ Praticar parto por cesariana (existindo condições para realizar um parto normal), sem o consentimento voluntário, expresso e informado da mulher.

▪ Forçar a mulher a parir deitada e/ou imobilizada.

▪ Impedir que a mãe segure e amamente o bebê imediatamente após o nascimento.

▪ Falha no atendimento às emergências obstétricas.

DIREITOS DA MÃE

▪ Estar informada sobre as diferentes intervenções médicas que podem ocorrer durante o parto e o pós-parto, e participar ativamente nas decisões tomadas nesse contexto.

▪ Ter um parto que respeite os tempos biológicos e psicológicos, evitando práticas invasivas e fornecimento injustificado de medicamentos.

▪ Estar informada sobre a evolução do seu parto e o estado de saúde do seu bebê.

▪ Não se submeter a qualquer exame ou intervenção cujo objetivo seja a pesquisa.

▪ Escolher uma pessoa de sua confiança para acompanhá-la.

▪ Ter o bebê ao seu lado durante sua permanência na unidade de saúde, desde que o recém-nascido não necessite de cuidados especiais.

Fonte: Magaly Pereyra Cousiño, especialista em ginecologia e obstetrícia
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Fotos: ©Anatta_Tan, Fernanda | Adobe Stock

REDE DE SALVAÇÃO

Em um período em que acontecem mudanças drásticas na vida da mulher, o apoio no cuidado com o bebê é fundamental

CYNTHIA HURTADO-MÜLLER

Obebê nasceu e a mãe está encantada observando como, depois de nove meses, é possível distinguir suas feições, tocar suas mãozinhas e nalmente tê-lo em seus braços. O que talvez ela não perceba é a transformação que seu corpo e sua mente estão experimentando. O parto não é somente o nascimento de um bebê; é também o nascimento de uma mãe.

A origem da palavra puerpério vem dos vocábulos latinos puer (que signi ca criança) e peri (ao redor). Consiste basicamente no período imediato ao nascimento, estendendose por cerca de seis a oito semanas. Esse é o

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Foto: ©Shotmedia
SUPORTE

tempo necessário para que o corpo da mãe – incluindo os hormônios e o sistema reprodutivo feminino – retorne às condições anteriores à gestação. No entanto, existem órgãos que aparentemente mudam para o resto da vida, como o cérebro.

Ao se tornarem mães, as mulheres passam por uma transformação radical graças às ondas hormonais. O cérebro muda mais durante a gravidez e o puerpério do que em qualquer outro momento da vida, incluindo a puberdade. De acordo com um artigo publicado pela Nature Neuroscience, parte da razão para isso é um processo de poda sináptica em que o cérebro “interrompe” a função de áreas de que não precisa mais para construir as áreas que agora são cruciais para proteger e cuidar de seu bebê (link.cpb.com.br/2b0f4e).

Existem, inclusive, pesquisas que mostram como o cérebro materno gera novas redes neurais especializadas em responder efetivamente a sinais como o choro. Nesse período, também aumenta a atividade cerebral das áreas associadas à empatia, ao autocontrole e à re exão, para estar mais alerta e cuidar do bebê (link.cpb.com.br/609d53). Não é maravilhoso?

APOIO NECESSÁRIO

O puerpério é um processo que envolve muitas mudanças e certo nível de estresse motivado por privação do sono, atenção constante ao bebê, cansaço, falta de tempo para si, podendo, às vezes, desencadear até mesmo a temida depressão pós-parto.

Todo o sistema familiar, com suas rotinas e seus espaços, é reorganizado para incluir esse novo membro. Por essa razão, trata-se de um momento crítico, em que é necessário muito apoio, especialmente no ambiente mais íntimo.

A puérpera nunca deveria car sozinha. Com todas as mudanças que está experimentando, ela precisa que alguém a apoie (veja outros detalhes na p. 6). Por isso é tão importante ter uma rede de apoio, envolvendo o pai, a família e a comunidade. Especialmente as mães de primeira viagem precisam do cuidado

O PARTO NÃO É SOMENTE O NASCIMENTO DE UM BEBÊ; É TAMBÉM O NASCIMENTO DE UMA MÃE

e da companhia de pessoas que respeitem suas necessidades, seu tempo e deem reforços positivos, dizendo quão bem elas estão se saindo e que os momentos difíceis passarão.

A escritora Ellen White a rma que “as necessidades físicas da mãe não devem de modo algum ser negligenciadas. Dela dependem duas vidas; seus desejos devem ser bondosamente considerados, e suas necessidades precisam ser supridas generosamente” (A Ciência do Bom Viver [CPB, 2021], p. 231). Mas como fazer isso? Do que a puérpera precisa?

A seguir, veja alguns aspectos chaves para ser considerados:

1 NÃO COMPARE. A última coisa que uma mãe precisa é ser comparada com outras mães e seus processos. Frases como “quando tive meu bebê, não fazia o que você está fazendo...” são totalmente desnecessárias. Parte do processo de adaptação é que a mãe conheça o que funciona para ela, não para os outros.

2 COMEMORE PEQUENAS VITÓRIAS. Se a mãe conseguiu fazer o bebê dormir sem problemas, comemore! Se a mãe fez com que o bebê pegasse o seu peito de forma adequada, comemore! Os bebês não podem elogiar suas mães por fazê-los dormir ou alimentá-los, mas você pode.

3 ESCUTE-A. É muito comum que, devido a todo esse turbilhão hormonal que a mulher vive durante a gravidez e na fase do puerpério, haja momentos em que ela se sinta só, culpada, triste ou ansiosa. Ela pode até sentir que não é uma boa mãe. Portanto, ofereça apoio, ouça e mostre que está lá para ela. Tente entender o que ela está passando sem julgar ou invalidar seus sentimentos e, assim, ela se sentirá segura e, acima de tudo, apoiada.

4 O PAPEL DO PAI É INDISPENSÁVEL E INSUBSTITUÍVEL. Tanto para o pai quanto para os lhos mais velhos, é importante a participação nos cuidados do bebê: trocar a fralda, dar banho, fazer carinho, etc. Com o passar do tempo, o papel do pai se tornará cada vez mais importante para a criança. Nas primeiras semanas, seu papel principal é apoiar a mãe, para que ela possa cuidar de seu lho.

Essa nova fase é tão intensa e cansativa quanto deslumbrante! Os dias passarão lentamente, mas os anos passarão voando!

Convido você a aproveitar essa fase e acompanhar da melhor forma a mulher que mudou sua vida ao se tornar mãe.

CYNTHIA HURTADO-MÜLLER, psicóloga, é mestre em Psicopatologia, Psicologia da Saúde e Neuropsicologia

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PARADOXOS DA MAT E RNIDAD E

“Eu não sei se realmente queria ser mãe”, revelou aos prantos a jovem mãe do bebê de um mês e meio. Os cabelos molhados, presos em um coque no alto da cabeça, não escondiam as olheiras das muitas noites sem dormir. Aquela parecia ser a primeira vez que ouvia suas próprias palavras, provavelmente ecoadas muitas vezes dentro de sua cabeça nos últimos dias. Ao externalizar os sentimentos que vinha experimentando nessa fase da vida, ela não hesitou em dizer que eram de decepção e frustração. Decepção por perceber que a maternidade não era nada do que ela havia pensado ao longo de nove meses e frustração principalmente por não saber o que esperar do futuro.

Situações de divórcio, perda do emprego, morte de um ente querido e problemas nanceiros geram crises de ansiedade e podem levar à depressão. Mas e quanto aos fatores que podem fragilizar a saúde emocional de quem acabou de dar à luz? O primeiro passo para compreender o imenso desa o emocional que surge com a maternidade é analisar o choque que existe entre a expectativa e a realidade que se apresenta com a experiência de ser mãe.

O puerpério é compreendido como o período que decorre desde o parto até que o estado de saúde geral da mulher volte à condição anterior à gestação. A partir dessa de nição é possível pensar em um problema a ser resolvido: a expectativa ou mesmo o desejo de voltar a ter a condição física

e emocional vivida antes da gestação. Sem dúvida, é nesse período que as mulheres mais duvidam do restabelecimento desse equilíbrio.

TRANSFORMAÇÃO DA REALIDADE

A mudança após o parto é tão radical que faz com que a maior parte das mulheres viva, ao mesmo tempo, uma experiência sublime e apavorante. Essa ambivalência possui um imenso potencial de adoecimento psíquico. Mas, em geral, não é o que se espera das mães. Socialmente, pressupõe-se que as mulheres assumam a maternidade como algo sublime e, principalmente, que sejam levadas a acreditar numa sensação de plenitude natural. Seguindo essa forte in uência social, parece ser zona proibida para as mães experimentar qualquer sentimento que seja oposto a esses.

PSICOLOGIA
O que fazer quando a experiência de ser mãe frustra as expectativas
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PAULA FERREIRA
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No entanto, saúde mental e mudança são dois conceitos que estão intimamente relacionados. Em geral, a maioria das pessoas tende a buscar previsibilidade e garantir que as coisas aconteçam conforme esperam. Héctor Lisondo, autor do livro Mudança Sem Catástrofe ou Catástrofe Sem Mudanças (Casa do Psicólogo, 2004), explica que a mudança é o estado permanente dos seres vivos. Apesar disso, de acordo com o autor, aceitar transformações como parte essencial da vida é um dos principais desa os emocionais enfrentados pela maioria das pessoas, que em geral lutam pela conservação das coisas, pessoas e situações.

É a partir dessas alterações, sobretudo quando não se enxerga recursos ou apoio para seguir em frente, que a depressão encontra terreno fértil para se instalar na mente. Ela surge imersa nesse contexto e é muito facilmente confundida pela maioria das famílias como uma fase “normal” da vida gestacional e pós-gestacional.

A MUDANÇA DEPOIS DO PARTO É TÃO RADICAL QUE FAZ COM QUE A MAIOR

PARTE DAS MULHERES VIVA, AO MESMO TEMPO, UMA EXPERIÊNCIA SUBLIME E APAVORANTE

Por isso, muitas mulheres que deram à luz costumam ouvir frases do tipo: “é assim mesmo”, “comigo foi até pior”, ou “já já passa”, o que acaba por tornar ainda mais doloroso atravessar esse período.

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a prevalência de transtornos depressivos relacionados ao parto e pós-parto em países em desenvolvimento é, em média, de 19,8%. Outros estudos internacionais, como os que foram descritos no artigo intitulado “Depressão pós-parto: discutindo o critério temporal do diagnóstico”, de autoria da psicóloga Evanisa Helena Maio de Brum, revelam que entre 10% e 20% das mulheres desenvolvem transtornos mentais relacionados ao parto e pós-parto (link.cpb.com.br/913ec7).

PROCESSO DE CURA

A aceitação dos sentimentos contraditórios representa uma batalha importante a ser enfrentada na mente das mães, buscando compreensão mais clara do papel da maternidade e do desa o às estruturas mentais prévias. Por exemplo, uma jovem mãe criada em uma estrutura familiar exigente e perfeccionista será profundamente afetada pelo caos temporário ocasionado pelas roupas sujas, louça na pia, alteração de horários e rotina caótica da casa. Outro caso é o de uma mãe que aprendeu a dar conta de tudo sozinha, absorvendo todas as tarefas e responsabilidades para si sem pedir ajuda. Essas situações mostram a extensão do desa o que a maternidade

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representa. E se isso não for superado com êxito, pode, com muita facilidade, levar a quadros depressivos.

Evidentemente, não podem ser esquecidas as diferenças sociais presentes entre mulheres que precisam trabalhar fora, encarar uma tripla jornada de trabalho ou que sejam as responsáveis nanceiras pela família. O fato é que quanto maior for o desa o social enfrentado pelas mães, maior será o potencial de impacto da experiência em sua saúde mental.

Como integrantes da sociedade, é importante estar atentos para o reconhecimento dessa fase da vida como fonte de intenso sofrimento psíquico, potencializado pelo pouco apoio encontrado pelas mulheres para atravessálo. Dentre os sintomas importantes a ser considerados, pode-se destacar a perda ou excesso de apetite, irritabilidade intensa, di culdade para criar vínculo afetivo com o bebê, tristeza intensa e choro excessivo. Esses sintomas podem ser identi cados por pessoas próximas ou pela própria mãe. Quanto antes essa pessoa reconhecer um estado de adoecimento e iniciar o tratamento adequado, melhores são as possibilidades de recuperação e restabelecimento do equilíbrio psíquico.

CONEXÃO COM A MATERNIDADE

Para encarar as profundas mudanças e, principalmente, os desa os da maternidade, é preciso criar uma conexão com as próprias limitações e imperfeições, o que inclui a aceitação da incapacidade de prever e controlar presente e futuro, reconhecendo um estado humano muitas vezes carente de apoio e suporte. Nenhuma escola será mais e ciente para alcançar esse amadurecimento emocional do que a maternidade e sua constante exposição ao pouco controle sobre o que está ao redor.

E que passos uma jovem mãe pode dar para alcançar, de maneira preventiva, o equilíbrio emocional nessa fase da vida? Aqui vão três pontos importantes:

1 Abrace a mudança e conviva com todas as incertezas que ela traz.

2 Tolere os sentimentos contraditórios presentes na maternidade.

3 Reestruture regras como “tenho que fazer tudo sozinha”, “pedir ajuda é sinal de fraqueza” e “não posso falhar”.

Por m, precisamos assumir um papel mais ativo no suporte às jovens mães, oferecendo-lhes uma rede de apoio que vai desde a simples escuta sem julgamento até o suporte com atividades cotidianas. A maternidade é uma das mais ricas possibilidades de transformação e enriquecimento psíquico. Uma nova mulher surgirá dessa experiência, madura, segura, exível, mais bem preparada para a vida. Tolerar os sentimentos, reestruturar as regras internas e se ver como merecedora de apoio são passos importantes para alcançar isso. Sem dúvida, o reconhecimento de ser apenas uma pessoa com limitações, que não busca a perfeição e que aceita ajuda, tornará você a melhor mãe possível. Curta cada momento!

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PAULA FERREIRA é psicóloga e supervisora clínica
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QUANTO MAIOR FOR O DESAFIO SOCIAL ENFRENTADO PELAS MÃES, MAIOR SERÁ O POTENCIAL DE IMPACTO DA EXPERIÊNCIA EM SUA SAÚDE MENTAL
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ANT E S E DE POIS

Após a maternidade, não tenha medo de se olhar no espelho

Eu estava em frente ao espelho e simplesmente não conseguia me reconhecer. A quarentena estava perto de acabar e me sentia insegura. Havia me tornado mãe há apenas um mês, o mais intenso da minha vida. A maternidade é uma experiência que transforma, e o pós-parto é um momento de intensas modi cações físicas, emocionais e sociais para a mulher. Os primeiros dias são marcados pela adaptação que leva ao cansaço, muitas vezes chegando perto da exaustão. Adaptação ao bebê, amamentação, noites interrompidas ou não dormidas. Sim, a maternidade também é tudo isso. Embora possa fazer parte da vida de uma mulher, a verdade é que ela não a de ne. Por isso, chega um momento em que se faz

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ELIANE MELO

necessário resgatar todos os papéis. A nal, somos mais que mães, não é mesmo? Gosto de chamar esse momento de reencontro! E ali estava eu, olhando para o espelho, tentando me reencontrar. Existia saudade de quem eu era.

Tudo o que descrevi é um movimento saudável que deveria acontecer com todas as mulheres. Um movimento re exivo em que se percebe que a maternidade é algo a mais acrescentado à sua vida, e esse papel não exclui quem você já foi. Aliás, ele potencializa. Mas quando isso não acontece, pode surgir um sentimento de tristeza, incompletude, insu ciência e até arrependimento, e desencadear uma depressão pós-parto. O número de mulheres que desenvolvem depressão nesse período é assustador (veja a p. 16). Ela geralmente tem início entre a quarta e a oitava semana após o parto e traz irritabilidade, choro frequente, sentimentos de desamparo e desesperança, falta de energia e motivação, desinteresse sexual, alterações alimentares e do sono, sensação de ser incapaz de lidar com novas situações e queixas psicossomáticas. Dentre os fatores que podem desencadear a depressão, dois me chamam a atenção: insatisfação em relação à imagem corporal e problemas conjugais.

IMAGEM CORPORAL

As mudanças diante da gravidez são acompanhadas por frases como: “você está grávida, precisa comer por dois” ou “que barriga mais linda”. Porém, é no pós-parto que as cobranças começam. Nesse momento, nos deparamos com um novo corpo. As mamas aumentam de tamanho, a barriga incomoda, assim como a presença de estrias e a acidez. O medo da mudança em relação à vagina existe. Um novo corpo surge e, muitas vezes, também a di culdade de aceitá-lo. A sociedade pressiona para que o retorno ao corpo anterior aconteça. Muitas mulheres se sentem incapazes e não gostam do que veem. A autoestima ca prejudicada e os impactos chegam à vida íntima do casal.

PROBLEMAS CONJUGAIS

A chegada de um bebê é um presente, mas também representa um dos desa os mais profundos que um casal experimentará. Ajustes são necessários para ambos. Na cabeça da mulher, é natural que surjam dúvidas relacionadas ao desempenho sexual, o medo de que a relação sexual gere dor, a insegurança de que a vagina não mais satisfaça sexualmente o marido, crenças equivocadas de que o parto normal “estraga” seu corpo e o potencial de sentir prazer. Emocionalmente, existe con ito e confusão em relação à maternidade e aos desejos sexuais. É como se os dois não pudessem habitar a mesma pessoa. A rotina, previsibilidade e regularidade, tão importantes para o bebê, geram pais responsáveis, mas que podem ter diculdades para voltar a se relacionar como casal. Todas essas questões são desa os reais do período pós-parto.

RETORNO À NORMALIDADE

É preciso esperar pelo menos 40 dias para retomar a atividade sexual. Durante esse período, o corpo trabalhará intensamente para que todos os órgãos voltem a funcionar normalmente. É importante esclarecer que sexo não é só penetração. A intimidade sexual e o prazer podem ser desenvolvidos a partir de outros estímulos, a começar pelo desejo que é alimentado por meio do carinho, cuidado, conversas, cumplicidade e conexão.

Importante atenção deve ser dada para a musculatura do assoalho pélvico. Esses músculos são muito requisitados durante a gravidez e precisam ser reabilitados no período puerperal. Eles são importantes para a continência urinária e fecal, apoiam os órgãos pélvicos e também são essenciais para o prazer sexual. Depois de seis horas do parto normal, a mulher pode exercitar seu assoalho pélvico. Se ela passou por uma cesárea, deve esperar por oito horas.

REENCONTRO

Após a maternidade, não tenha medo de se olhar no espelho. Se reencontre com a mulher que um dia você foi. Nesse período, você pode estar diferente sicamente, mas com a capacidade de viver uma maternidade que não exclui seu prazer nem prejudica seu casamento. Lembre-se: a maternidade não precisa limitar, ela pode potencializar.

ELIANE MELO é psicóloga, sioterapeuta pélvica e idealizadora do per l @elianemelo.destrave, no Instagram

DO PARTO, VOCÊ PODE ESTAR DIFERENTE FISICAMENTE, MAS ISSO NÃO EXCLUI SEU PRAZER NEM DEVE PREJUDICAR SEU CASAMENTO QUEBRANDO O SILÊNCIO 21
DEPOIS

CONSULT E O MANUAL

Livros apresentam dicas práticas sobre saúde e maternidade

ADRIANA TEIXEIRA

Você sorri 15 minutos por dia? Percebe gatilhos que levam a doenças indesejadas? Sabe identi car o melhor médico e o melhor tratamento?

Já fez seu planejamento para sentir-se bem nas mais diversas situações da vida? Toda mulher precisa tomar tempo para o autocuidado e para a busca adequada de pro ssionais que a ajudem no processo. Isso é extremamente importante a m de que possa também cuidar dos seus.

Obter informação segura em uma época de excesso de conteúdo é um verdadeiro oásis. O livro Sinta-se Bem (CPB, 2021), escrito pela doutora Lidia La Marca, ginecologista, obstetra e oncologista, é leitura obrigatória para toda mulher que se preocupa com a saúde no âmbito integral. Trata-se de uma verdadeira joia encontrada em um “mar de informações”. Para a mulher grávida, planejar o parto inclui ser ativa na análise, não temendo mudar de médico, se for preciso, a m de obter a assistência desejada. Na seção “Controles e exames”, a doutora Lidia destaca os cuidados necessários na consulta ao ginecologista. Perguntas como: “O médico se esmera nas consultas?”, “Ele se informa do histórico clínico de seus pacientes?”,

“Há uma relação de diálogo e compreensão?”, “Quanto tempo ele dedica à consulta?”, “Qual é a opinião dele sobre e medicina alternativa?” devem ser feitas para que haja uma boa análise do caminho a seguir.

O livro traz algumas normas de conduta indispensáveis tanto para os médicos quanto para as pacientes. Por exemplo: o interesse do médico no histórico da mulher mostra que ele quer conhecer o contexto mais amplo da vida dela, e isso pode ajudálo a relacionar a saúde física com a psicológica e até mesmo social da paciente. O tempo dedicado pelo médico para entender o problema que a ele é levado precisa ser analisado, pois isso demonstrará a empatia do pro ssional com a paciente. O fornecimento de explicações detalhadas e claras são também fatores que ajudam na escolha do médico, principalmente nos casos de intervenções maiores, como o parto, por exemplo. O médico precisa ser minucioso ao analisar todas as variáveis existentes em uma gravidez e passar segurança à futura mamãe. Quanto à prescrição de medicamentos é interessante observar se o médico detalha quais podem ser os possíveis efeitos, atrelando isso à tolerância da paciente ao tratamento.

O livro ainda ajudará a leitora a perceber quais são suas atitudes diante do pro ssional e com isso identi car pontos de atenção. Expectativas devem ser declaradas. Assim, constrói-se uma relação de reciprocidade entre o médico e a paciente. Na escolha do ginecologista são importantes as referências. Não se deve con ar apenas nos títulos acadêmicos nem na publicidade feita sobre o médico. É válido também informar-se sobre a orientação terapêutica do médico, unindo os dados obtidos às expectativas quanto ao tratamento.

Conhecimento é a chave que traz liberdade e segurança, principalmente nos vários momentos frágeis pelos quais a mulher passa. A exposição a um ginecologista precisa ser feita com muito critério e cuidado, pois a intimidade da mulher é exposta, e por isso a relação deve ser con ável, com pro ssional que seja capaz de responder às muitas dúvidas e assim atenuar os medos e as ansiedades.

A obra ainda ressalta temas de prevenção adquirida por meio de remédios naturais (alimentação saudável, atividade física, ar

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Foto: Banco de imagem CPB

puro, descanso, con ança em Deus, temperança, luz solar e água) e de exames de rotina. Além da prevenção, há destaque para cuidados em caso de distúrbios e doenças que acometem as mulheres, com dicas preciosas para o tratamento e mesmo a cura.

“Passear” pelas páginas do livro será como fazer várias consultas ao médico, sem sair de casa. Na seção “Consulta ao médico”, a leitora terá a oportunidade de sanar as dúvidas sobre o assunto abordado de forma prática e e ciente. As “Regras de ouro” são essenciais no tratamento das mais variadas doenças que infelizmente acometem muitas mulheres (cefaleia, excesso de peso, insônia, cólon irritável, problemas nas articulações, patologias venosas, patologias coronarianas agudas, tumores, problemas nas mamas, di culdades hormonais).

Sinta-se Bem também é recheado de boxes com informações adicionais e práticas (como cálculo de peso ideal e análise de sintomas e diagnósticos, por exemplo). As análises de casos são momentos importantes da leitura, pois permitem um entendimento mais prático do assunto destacado na seção. Longe de ser uma leitura acessível apenas aos médicos, a obra é bastante didática, trazendo glossários ao longo das páginas, o que permite melhor compreensão dos conceitos abordados. Um verdadeiro guia da saúde integral da mulher, que deve ser lido, relido e consultado a qualquer momento. Um médico à disposição, sempre à mão. Estudar os conselhos, as dicas, os cuidados sugeridos, ter acesso à informação de qualidade e embasamento desfará conceitos pré-concebidos e trará a liberdade da prevenção, cura e proteção contra possíveis abusos.

GUIA DA MATERNIDADE

Toda mulher precisa reconhecer seu valor, saber quem é e o que Deus pensa dela. Quando passa para a fase da maternidade, deve ainda entender que não está sozinha e que é amada e guiada por Alguém maior. Isso atribui uma dose de leveza extremamente necessária à execução

da tarefa. Nesse contexto, o livreto Ser Mãe: O Que É? (CPB, 2008), de Ellen White, destaca o papel de igualdade que a esposa tem com o marido na valorização do trabalho e ainda esclarece sobre a vasta in uência que a mãe exerce sobre os lhos. Consciente disso, a mãe assumirá o papel de rainha, e não escrava, do lar e compreenderá sua nobre missão em modelar o caráter do lho. A alegria da santidade de tal obra trará saúde física e emocional para a mãe sobrecarregada de cuidados e a libertará de pesares que o mundo impõe, fazendo-a por vezes acreditar que está privada de crescimento nas mais variadas áreas da vida.

que possa resistir à tentação de conformar-se aos padrões do mundo. Sua obra é para o tempo e para a eternidade” (p. 7). “Que cada mãe compreenda quão grande são os deveres e suas responsabilidades e quão grande será a recompensa da delidade. A mãe que alegremente assume os deveres que jazem diretamente em seu caminho sentirá que a vida para si é preciosa, porque Deus lhe deu uma obra a realizar. Nesta obra ela não precisa necessariamente comprimir o espírito nem permitir que seu intelecto se debilite. O trabalho da mãe é dado por Deus, para que crie os lhos na doutrina e admoestação do Senhor” (p. 9).

“A esfera de atividade da mãe pode ser humilde; mas sua in uência, unida à do pai, é tão duradoura como a eternidade. Depois de Deus, o poder da mãe para o bem é a maior força conhecida na Terra” (p. 19).

Munida de materiais como esses, a jornada da mãe se torna leve, sem culpas, com propósito e proteção.

Apreciará cada oportunidade como um sagrado dever e será motivada a crescer física, mental e espiritualmente, a m de desenvolver seu maior projeto, a criação dos lhos. Tendo os olhos xos em Jesus, sua carga de cuidados será abrandada e valorizada, com a certeza de que seu nome será escrito no Livro da Vida. Será confortante para a mãe ler frases como: “Compreenda a mãe tão somente o elevado caráter de sua obra e tome a armadura de Deus, para

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DE MATERIAIS COMO ESSES, A JORNADA DA MÃE SE TORNA LEVE, SEM CULPAS, COM PROPÓSITO E
ADRIANA TEIXEIRA, mestre em Linguística Aplicada, é mãe e editora
MUNIDA
PROTEÇÃO

FAMÍLIA PLAN E JADA

Na hora de decidir ter filhos, é preciso levar em conta alguns critérios

YVÁN BALABARCA CÁRDENAS e VICTORIA MARTINEZ TEJADA

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Todos aguardavam na sala, até que a tensão deu lugar ao choro da criança que acabara de nascer. Aqueles que ajudaram no parto se aproximaram e, com um sorriso, anunciaram à família reunida: “É uma linda menina!” Apenas os que presenciam o esperado nascimento de um bebê podem descrever a alegria que essa notícia traz.

Deus fez os seres humanos com a capacidade de procriar (Gênesis 1:28). Desde a criação, deu ao homem e à mulher a ordem para povoar a Terra, que acabava de sair de Suas mãos e estava perfeita, com recursos disponíveis e com a perspectiva de vida eterna.

Antes do pecado, o plano era que eles pudessem ter lhos que se convertessem em adoradores. Homens e mulheres que louvassem ao Senhor com a perfeita simetria da santidade e o caráter santo daqueles que, em seu livre-arbítrio, escolheriam o caminho da adoração e obediência ao Santo dos santos.

No entanto, os primeiros pais da humanidade decidiram se rebelar contra Deus, comendo do fruto proibido, única coisa que lhes havia sido vedada, sucumbindo, assim, ao engano de Satanás (Gênesis 3:1-7). Desde então, as coisas mudaram bastante. Os lares se tornaram o centro do ataque do mal, e se dividiram entre aqueles que servem a Deus e aqueles que O negam, rebelando-se diante de Sua autoridade e resistindo ao Seu amor. Nesse contexto do grande con ito, as famílias aos poucos deixaram de formar homens e mulheres piedosos, capazes de ser éis administradores dos recursos que Deus deixou na Terra, transformando-se em pessoas que buscam seus próprios interesses.

MUDANÇA COMPLETA

Chegamos aos nossos dias com uma população estimada em 8 bilhões de habitantes, de acordo com a ONU. Milhões deles vivem com até US$ 1,90 por dia. Para piorar, em 2020, devido ao impacto da Covid19 na economia, houve uma nova onda de desemprego, e a pobreza aumentou nesse

período. Felizmente, os números mostram que os índices de pobreza começaram a melhorar novamente, assim como vinha ocorrendo antes da crise sanitária (link.cpb.com.br/2c10ba).

Por outro lado, em 2020 nasceram 17 pessoas a cada mil habitantes. Isso mostra um grande contraste com o ano de 1963, quando registrou-se 36 nascimentos a cada mil habitantes (link.cpb.com.br/04290b). A taxa de natalidade tem diminuído década após década, tendência que tem sido in uenciada, entre outros fatores, pela previsão de uma futura falta de recursos naturais. Com base em cálculos de uma ONG chamada Global Footprint Network, a WWF divulgou que os recursos disponíveis para todo o ano de 2022 foram consumidos até o m de julho. Ou seja, o consumo desenfreado tem levado o mundo a esgotar os recursos do planeta, acumulando dé cits a cada ano (link.cpb.com.br/ed7755).

É por isso que organizações em todo o mundo vêm desenvolvendo, há décadas, uma estratégia global para diminuir os nascimentos no mundo. Mas será que isso colide com a ordem bíblica de povoar a Terra? Vamos analisar isso com cuidado!

PLANEJE COM ATENÇÃO

Quando Deus deu essa ordem, a Terra estava vazia. Na Nova Terra, conforme lemos na Bíblia, os seres humanos não continuarão a se reproduzir, pois Deus deixou claro que lá os seres humanos serão como os anjos, e não haverá mais casamento

CURA PARA OS TRAUMAS

Nem tudo na vida sai conforme o planejado. Há situações que fogem do nosso controle e deixam cicatrizes. A violência é uma marca profunda e injustificável. Mas Deus não quer que você carregue esse peso pelo resto da vida. Ele está pronto a oferecer alívio. O exemplo deixado por Jesus foi o de perdoar quem ofende e esperar que haja uma mudança de conduta. Perdoar significa reconhecer a necessidade de estender ao outro aquilo que Deus estendeu a todos os seres humanos: uma oportunidade de recomeço (Colossenses 3:13, Efésios 4:32). Se você foi vítima de abusos e maus-tratos na maternidade, peça ajuda a Deus para viver uma nova vida livre dos traumas e ressentimentos, além de buscar ajuda psicológica.

E se você é um(a) profissional da área obstétrica e escolheu trabalhar em favor do outro, não permita ser a fonte de sofrimento de alguém. A vida é uma dádiva sagrada e deve ser respeitada e protegida.

(Marcos 12:25). Isso nos leva a re etir que talvez não seja uma questão de ter muitos lhos como antes, mas de planejar a família que desejamos ter e que podemos manter com dignidade e condições estáveis.

Os lhos são um presente de Deus (Gênesis 4:1; 33:5), e, na cultura hebraica, por exemplo, era uma grande bênção que a mulher estéril desse à luz (Salmo 113:9; 1 Samuel 1:6-8; Lucas 1:7).

É Ele que forma os lhos no ventre materno (Salmo 139:13-16) e os conhece antes mesmo de nascerem (Gálatas 1:15). Isso é muito interessante, porque Deus quer que os lhos sejam uma bênção no lar. E deseja que as famílias

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sejam felizes e desfrutem de plena comunhão entre si e com Ele.

Por outro lado, existem textos que recomendam que algumas pessoas permaneçam solteiras para se dedicar aos interesses de Deus (1 Coríntios 7:7, 8, 27, 32, 34; Mateus 19:12). Então, pela lógica, essas pessoas não deveriam se preocupar em ter descendentes. Sendo assim, existem pessoas que, por amor ao Senhor, decidiram não se casar. À luz da Bíblia, existem as duas recomendações: uma para se casar (1 Coríntios 7:9) e outra, de acordo com o dom que tenha recebido, para car solteiro e, portanto, não ter lhos.

No entanto, aqueles que já estão casados devem planejar ter os lhos que possam manter e cuidar, de acordo com as forças e benefícios que seu trabalho pode oferecer, tomando o cuidado de não negligenciar seu lar. Os métodos de planejamento

POIS TU FORMASTE O MEU INTERIOR, TU

ME TECESTE NO VENTRE DE MINHA MÃE.

GRAÇAS TE DOU, VISTO QUE DE MODO ASSOMBROSAMENTE MARAVILHOSO

ME FORMASTE; AS TUAS OBRAS SÃO ADMIRÁVEIS, E A MINHA ALMA O SABE

MUITO

BEM. (SALMO 139:13, 14)

familiar são uma excelente opção (sempre em conversa com um médico ou especialista) para planejar o nascimento dos lhos e, assim, contar com recursos e energia para acompanhar seu desenvolvimento.

GRAVIDEZ NÃO PLANEJADA

Quando se fala em uma gravidez não planejada na adolescência ou em qualquer outra época da vida, em maior ou menor grau, existem alguns riscos, como falta de acompanhamento médico adequado, ocorrência de pré-eclâmpsia (hipertensão arterial especí ca da gravidez) e eclâmpsia (forma grave da doença), fístula obstétrica, trauma devido a uma perda. Sem falar no medo, na ansiedade, no estresse, nos problemas familiares nos casos de abuso/estupro e até na rejeição do bebê.

Estando casados, o momento ideal para se ter um bebê dependerá basicamente de dois aspectos: o biológico, aquele em que a mulher apresenta boa saúde e menores riscos, e o social. Estudos mostram que, a cada ano que o casal adia a gravidez, seus rendimentos aumentam em 10% (link.cpb. com.br/aed435). Então, seria recomendável que o casal planejasse seu primeiro lho no momento em que sua renda fosse compatível com os gastos familiares.

Quanto mais lhos o casal deseja ter, mais planejamento isso exige. Pelo fato de a gestação acabar afetando a vida pro ssional da mulher de forma mais intensa, é necessário que o homem entenda e assuma o desa o de crescer econômica e socialmente.

Assim, do ponto de vista cristão, é melhor planejar uma família que possa ser mantida feliz, de acordo com o plano maravilhoso de Deus.

YVÁN BALABARCA CÁRDENAS é doutor em Educação Familiar; VICTORIA MARTINEZ TEJADA é doutora em Educação. Eles dirigem o Ministério da Família de uma das sedes administrativas da Igreja Adventista nos Estados Unidos

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