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PNLD 2023 | O3 - O ENCONTRO DA CIDADE CRIANÇA COM O SERTÃO MENINO - Arco 43 Editora

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O que será que um menino da agitada cidade de São Paulo tem em comum com um garoto do interior do estado de Alagoas? Não se avexe, não, que, apesar de essas duas realidades parecerem contramão, criança é criança em qualquer ocasião! A vó Sinhana, guardiã de um tesouro que vale mais que ouro, vai apresentar aos leitores e a esses dois primos as fantásticas histórias e canções da tradição popular. Escrita em estrofes de seis versos e sete sílabas poéticas, forma consagrada do cordel, este livro homenageia grandes cordelistas e repentistas nordestinos. Uma verdadeira celebração das tradições populares de nosso sertão.

Livro DO R SSO

PROFE



Marco Haurélio Ilustrações de Laerte Silvino


© Arco 43, 2021 Todos os direitos reservados Texto © Marco Haurélio Ilustrações © Laerte Silvino Direção-geral: Vicente Tortamano Avanso Direção editorial: Felipe Ramos Poletti Gerência editorial: Gilsandro Vieira Sales Gerência editorial de produção e design: Ulisses Pires Edição: Paulo Fuzinelli Assistência editorial: Aline Sá Martins Apoio editorial: Maria Carolina Rodrigues Supervisão de design: Andrea Melo Edição de arte: Daniela Capezzuti Design gráfico: Ana Matsusaki Supervisão de revisão: Elaine Silva Revisão: Andréia Andrade e Gabriel Ornelas Supervisão de iconografia: Léo Burgos Pesquisa iconográfica: Daniel Andrade e Priscila Ferraz Supervisão de controle de processos editoriais: Roseli Said Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Haurélio, Marco O encontro da cidade criança com o sertão menino / Marco Haurélio ; ilustrações de Laerte Silvino. -2. ed. -- São Paulo : Arco 43 Editora, 2021. ISBN 978-65-86987-55-3 (aluno) ISBN 978-65-86987-56-0 (professor) 1. Cultura popular - Literatura infantojuvenil 2. Literatura de cordel 3. Literatura infantojuvenil I. Silvino, Laerte. II. Título. 21-89016    CDD-028.5 Índices para catálogo sistemático: 1. Literatura de cordel : Literatura juvenil 028.5 2. Literatura de cordel : Literatura infantojuvenil 028.5 Maria Alice Ferreira - Bibliotecária - CRB-8/7964

2a edição, 2021

Rua Conselheiro Nébias, 887 São Paulo, SP – CEP: 01203-001 Fone: +55 11 3226-0211

Em respeito ao meio ambiente, as folhas deste livro foram produzidas com fibras obtidas de árvores de florestas plantadas, com origem certificada.


Às minhas avós Luzia (em memória) e Alaíde (Dinha), que regaram, com suas histórias e cantigas, o Jardim da Tradição.


Vamos viajar agora Para o sertão nordestino, Num recanto de Alagoas, Onde vivia um menino, Criado por sua avó Desde muito pequenino. Zé Silva, menino esperto, Nascido lá no sertão, Num vilarejo no qual Não tinha televisão, Mas mesmo assim não faltavam Brincadeira e diversão. Menino muito aplicado, Ele ia para a escola Montado no Pouca-Prosa, O seu jumento pachola, E no retorno, à tardinha, Brincava de jogar bola. Subia nos umbuzeiros E nadava nas lagoas, Depois, quando anoitecia, No sertão das Alagoas, Ia ouvir a sua avó Contar histórias das boas.


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E, à luz fraca da candeia, Ela lia os seus cordéis: Histórias de cangaceiros, Vaqueiros e coronéis E de princesas amadas Por cavaleiros fiéis. Zé viajava nas asas Do pavão misterioso, E empunhava uma espada Junto com João Corajoso, Sentindo-se personagem De um mundo maravilhoso. Sua avó Sinhana era A guardiã de um tesouro: Histórias da tradição Que valem mais do que ouro E são, na boca do povo, De valor imorredouro.


Porém, por aqueles dias, Houve grande inquietação, Pois Zé Silva viu Sinhana Com uma carta na mão: Era de um seu filho ausente, Que se chamava João. João, o seu filho mais velho, Há anos que abandonara O sertão das Alagoas E nunca mais retornara. Receber dele uma carta Era coisa muito rara. Ele veio pra São Paulo, Onde um dia se casou. Ela só sabia disso, Pois mais ele não contou. Por isso o conteúdo Da carta tanto a afetou.


No papel estava escrito: “Mãe, eu peço seu carinho, Pois pela primeira vez Vou levar o meu filhinho Para conhecer a avó E ela conhecer Joãozinho. Eu vou chegar no Natal, A 24 do mês. Vou com meu filho Joãozinho E a minha esposa Inês. Vamos ficar para ver A Festa de Santos Reis.”. Sinhana preocupou-se Ao saber da novidade, Pois não era acostumada Ao pessoal da cidade. Mesmo assim seu coração Pulsou de felicidade. Zé percebeu sua avó Muito inquieta na cadeira. Perguntou se estava bem E a resposta foi certeira: – Vou estar bem de verdade Quando chegar terça-feira.


E, de fato, terça-feira À porta dela bateu Alguém chamando: – Mainha! Quando Sinhana atendeu, Viu que era o filho João, Na hora empalideceu. Ele lhe pediu a bênção, Como em tempos de criança. – Deus que o abençoe, meu filho! Não perdi a esperança De revê-lo com saúde… Vamos, entre sem tardança! João mostrou-lhe sua esposa, Inês, e também o filho, Com o mesmo nome dele E no olhar o mesmo brilho. Sinhana, ao ver o seu neto, Quase saía do trilho. Depois de abraçar a todos, Passada aquela emoção, A matrona levou todos À sala de refeição, Onde serviu-lhes café Com leite e bom requeijão.


Porém Joãozinho, seu neto, Não gostou da novidade, Pois talvez já estivesse Sentindo muita saudade Da vida e das lanchonetes Que deixara na cidade. Mesmo assim, era educado E acompanhou os seus pais. Foi quando Zé Silva entrou Preocupado demais, Por ver a casa da avó Com os parentes a mais. Seus pais, que moravam perto, Deixavam-no com Sinhana, Sua mãe o visitava Duas vezes por semana, Por isso sua presença Ali era soberana. Sentiu ciúme, porém Não quis ali demonstrar. Pediu a bênção do tio, Vendo o primo se abismar, Pois não era acostumado Às tradições do lugar.


Depois, mais tranquilizado, Chamou o priminho João Para brincar no terreiro E os dois seguiram, então, Porque criança é criança Em qualquer ocasião. Lá, meninos e meninas De vizinhos e agregados, Que, logo depois da escola, Iam despreocupados Brincar de “boca de forno” Nos terreiros, nos cercados. João, o primo de Zé Silva, Longe de casa que estava, Lembrou-se do video game, Que ali não funcionava. O que era “boca de forno” Ao seu primo perguntava. Zé disse: – É uma brincadeira Em que o “rei” manda buscar Um objeto ou então Outra coisa realizar. O que chegar atrasado Quatro “bolos” vai levar. – “Bolos”? – perguntou João. – Sim, mas não são de comer. São aplicados na mão Pra o cabra assim aprender, Que deve ser mais ligeiro, Se não vai se arrepender!

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Mas vendo o primo assustado, Zé falou: – É brincadeira! Os “bolos” são bem “fraquinhos”. João disse: – Quanta besteira! E não quis participar, Se encostando na porteira. Mas quando viu os meninos Brincando com alegria Quis entrar, porém achou Que ninguém mais o queria. Por isso ficou de fora, Pensando no que faria. Quando Zé Silva acabou, Chamou-o: – Vamos pegar Imbu na manga de vó? João não quis contrariar, E foi com seu primo Zé Pra conhecer o lugar.


O chão coalhado de umbu, E João bem preocupado Disse: – Não temos vasilha Para levar, tá ligado? Zé disse: – Moço, se acalme. Por que você tá vexado? Mostrando sua camisa, Lhe disse: – A vasilha é esta. A partir daquele instante, O dia foi só de festa, De brincadeira e de risos, Assim é que a vida presta. Sua avó os recebeu, Preparou uma umbuzada. E dessa vez João comeu Sem mostrar cara fechada, Sinhana o pegou no colo, Bastante emocionada.

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E cantou uma cantiga Falando em “fogo-pagou”, Ele já a conhecia, Pois seu pai o acalentou Com ela, mas não lembrava, Até que a avó o lembrou. Zé não sentiu mais ciúmes, Também não tinha razão. Sinhana contou histórias Para ele e o primo João, Foi uma tarde regada Aos encantos do sertão. Depois, a avó seguiu Para preparar a ceia. Afinal era Natal, E sua alma estava cheia De alegria pelo filho Que veio de terra alheia.

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À noite, se reuniram, Além dos familiares, Amigos das redondezas E de distantes lugares Para cantar a “lapinha” De versos tão singulares. Pra quem não sabe, a “lapinha” É uma celebração Na casa, em frente ao presépio, Onde há a recriação Do nascimento de Cristo Nas moradas do sertão.


João e o filho Joãozinho Ouviram as lindas loas Para o Menino Jesus, Cantadas por almas boas, Moradoras dos remotos Recantos das Alagoas. A luz fraca da candeia Iluminava a varanda. Lá fora muitas crianças Dançavam linda ciranda, Louvando a vida que segue, A marcha que não desanda. Devotos de Santos Reis Cantavam com muita fé: “– Ô de casa, ô de fora. – Maria, vai ver quem é. – São os cantadô de Reis. Quem mandou foi São José.”. Finda a ceia, vem a missa Celebrada na capela. João Wenceslau, o menino Da cidade, se revela Como herdeiro de Sinhana. Foi uma ocasião bela. Depois dormiu e sonhou Um sonho muito bonito: Um azul que derramava Suas cores do infinito E depois tingia a terra Em um momento bendito.


Despertou quando Zé Silva Disse a ele: – Acorda, João! E foram ver a avó Com um grande caldeirão Tirar o leite das vacas No curral da apartação. João, impressionado, disse: – Mano, juro, não sabia Que o leite vinha da vaca, Pois aquele que eu bebia Vinha na caixa comprada Em mercado e padaria. Zé disse: – Lá na cidade, Isso não é ensinado? Mas vou falar um poema Que dá um belo recado. Cego Aderaldo escreveu, Um certo tempo passado: “Pelejo e não me acostumo Na capital da Nação. Tudo aqui é diferente Das coisas do meu Sertão. Lá tiram leite da vaca, Aqui é no caminhão.”.

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João achou muito engraçado, E para Zé perguntou Quem era o Cego Aderaldo. O primo então lhe narrou A vida do repentista Que nem a morte calou. Disse que a avó Sinhana Foi quem falou de Aderaldo, Que, mesmo cego, alcançou Em vida imenso respaldo E deixou versos eternos Que merecem todo saldo.


João depois foi à avó E pediu que ela cantasse Mais versos de repentistas, Caso ela os recordasse. Sinhana então lhe mostrou Dos grandes mestres a classe. Falou de Chica Barrosa, De Inácio da Catingueira, De Mocinha de Passira, De Romano do Teixeira, Do mestre contemporâneo Geraldo Amâncio Pereira. Depois Sinhana falou Dos romances encantados Sobre vaqueiros valentes E touros endiabrados, E heróis do povo que são Pelos poetas cantados. Mostrou-lhe um velho baú Que guardava no porão. De lá tirou três folhetos: Rosinha e Sebastião, O pavão misterioso, Juvenal e o dragão.

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E disse: – À tarde lerei Pra você essas histórias. E lhe explicou que guardavam Dos poetas as memórias E que aqueles que escreveram Alcançaram muitas glórias. Dito e feito. À tarde leu O romance do pavão, Obra de José Camelo, Famosa em todo o sertão, E em seguida declamou Rosinha e Sebastião. Disse: – Este aqui foi escrito Pelo Manoel Pereira Sobrinho, paraibano. Um trovador de primeira, É uma história de amor, Bem sincera e verdadeira. Juvenal e o dragão, Um romance de aventura, Obra de Leandro Gomes De Barros, grande figura, Dos poetas populares É o de maior estatura.


Zé Silva disse: – Em meu livro Da escola chamam cordel A essa arte que foi Registrada no papel. E diz mais, que o cordelista É chamado menestrel. Joãozinho falou: – Em São Paulo Se tem cordel, eu não sei, Lá tem rap, mas não é A mesma coisa. Saquei… Mas, quando pra lá voltar, Essa arte pesquisarei. João, seu pai, disse: – Meu filho, Em São Paulo há cordel, sim. – Mas, meu pai, por que você Nunca o mostrou para mim? – Por não saber se você Gostaria, agi assim. Agora que já conhece, Comprarei para você. O filho disse: – O cordel É melhor que RPG. Daí a avó lhe mostrou Viagem a São Saruê.


E leu pra ele alguns trechos Desse folheto de estilo, Imortalizado pelo Mestre Manoel Camilo, E depois mostrou-lhe outro: Proezas de João Grilo. – João Grilo? Nossa! Da hora! Esse quem foi que escreveu? – Foi João Ferreira de Lima – A sua avó respondeu. Joãozinho disse: – Ambos têm O mesmo nome que eu. Assim, o que começou De forma muito acanhada Cresceu, se multiplicou, Com a palavra encantada, E, no dia do retorno, Foi uma hora minguada. João e José se abraçaram, E o primeiro prometeu: – Volto no ano que vem – O que, de fato, ocorreu. Durante todos os anos, Da jura não se esqueceu.

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José veio pra São Paulo, Passou uma temporada, Conheceu muitos lugares, Aumentou a sua estrada, Mas retornou pra Alagoas, Pra junto da avó amada. Só saiu de sua terra Pra cursar Agronomia, Prometendo para a avó Que pra casa voltaria. Como era de palavra, A promessa cumpriria. Já seu primo dedicou-se De alma e de coração À medicina e, formando-se, Foi morar lá no sertão, A terra que, na infância, Ganhou o seu coração. Sinhana há tempos havia Deixado a esfera terrena, Mas os seus ensinamentos, Voz suave, doce e amena, Do teatro da memória Nunca saíram de cena. A nossa história singela Não pretende ser o hino, Mas um sincero relato De como um dia o destino Pôs a Cidade Criança Junto do Sertão Menino.

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“Peguei caneta e papel, Remexi nos meus lembrados, Invoquei sabedoria Dos nossos antepassados, Lembrei-me da minha avó Fazendo seus proseados.” Pedro Monteiro em O triunfo do poeta no reino do Cafundó.

E se a gente também rimasse? O livro que você acabou de ler é resultado do trabalho de muitas mãos. Além do autor Marco Haurélio e do ilustrador Laerte Silvino, ele também passou por outros profissionais antes de virar este objeto mágico que acompanhou você ao longo dessa jornada. Esses profissionais são editores, revisores, diagramadores, designers, além dos profissionais

Seção elaborada por Andréia Manfrin Alves, bacharel em Letras pela Universidade de São Paulo (USP) e mestre em Didática do ensino de francês pela Sorbonne Université. Trabalha há 15 anos como revisora, preparadora, editora e tradutora de textos, e escreve materiais de apoio para livros de literatura há pelo menos cinco anos. É também atriz, locutora e contadora de histórias e adora envolver toda a sua formação prática e teórica no trabalho com textos em diferentes vertentes. A literatura infantojuvenil é a menina dos seus olhos. 1

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da gráfica. Todos trabalharam para garantir que você tenha acesso a esta linda obra de arte. Você concorda que a literatura é uma arte? Pois ela é sim! A literatura é um dos quatro principais tipos de arte que existem: pintura, literatura, música e escultura. Dentro do universo da literatura, existe um mundo inteirinho, que vai da poesia ao teatro, passando por contos, crônicas, lendas, fábulas e uma infinidade de outros gêneros textuais que podem, inclusive, ser fruto de uma combinação desses que foram listados. O encontro da Cidade Criança com o Sertão Menino é classificado como literatura de cordel. Esse gênero textual tem algumas características marcantes, que estão presentes em quase todas as obras do gênero. São elas: texto escrito em versos; versos com rimas, que podem variar conforme a escolha do autor e o ritmo que ele quer dar ao texto e que são construídas com as últimas palavras de dois ou mais versos, terminando com o mesmo som (no caso do cordel que você acabou de ler, as rimas estão sempre no segundo, quarto e sexto versos); uso de linguagem informal, ou seja, palavras que geralmente utilizamos em situações mais familiares, quando falamos com parentes ou amigos, por exemplo; marcas de oralidade, que são palavras e expressões que não costumamos usar em textos escritos e que dão a impressão de que o texto é falado; histórias cheias de humor, que mesmo assim podem abordar temas mais sérios; temáticas sociais e cotidianas; adoção de termos e expressões regionais etc. Por meio da leitura deste livro, você também conheceu outras artes relacionadas ao cordel, como o repente, produzido por cancioneiros (ou repentistas) que criam suas músicas de improviso e participam de uma espécie de batalha musical com outros cancioneiros, e a


xilogravura, que é uma técnica de ilustração tradicionalmente feita em madeira talhada, pintada com tinta e depois pressionada no papel, como um carimbo. Neste livro, o ilustrador Laerte Silvino não fez as ilustrações da forma clássica, usando a madeira talhada, mas recorreu a recursos digitais usando um software de design para criar imagens que lembram as xilogravuras tradicionais. Ou seja, ele fez uso de uma técnica moderna para reproduzir uma técnica artesanal, que é a xilogravura tradicional. Isso é muito interessante, você concorda? Com todas essas informações e características, podemos perceber que a arte tem infinitas possibilidades. No entanto, este livro é mais do que só o seu formato. Ele convida o leitor a conhecer dois mundos bastante diferentes, mas igualmente ricos e interessantes: o de Zé Silva e sua avó Sinhana, que vivem no sertão do estado de Alagoas, e o de Joãozinho e seus pais, Inês e João, que vieram de São Paulo a fim de passar alguns dias na casa da avó para que ela e seu neto Joãozinho se conhecessem. Por meio da história do primo Zé Silva, você conheceu um pouco das brincadeiras típicas da cidade onde ele vive, como “boca de forno”; entrou em contato com as festas da região, como a Festa de Santos Reis; viu como ele e sua família têm contato com as plantas e os animais que costumam nos fornecer alimentos do dia a dia, como a árvore umbuzeiro e as vacas; e também descobriu alguns dos importantes cordelistas e repentistas da nossa cultura, como Cego Aderaldo, Chica Barrosa, Romano do Teixeira, Inácio da Catingueira, Geraldo Amâncio Pereira, José Camelo, Manoel Pereira Sobrinho, Leandro Gomes de Barros, entre outros. Com Joãozinho, você fez uma viagem de São Paulo até Alagoas e percebeu que há uma resistência inicial que costuma surgir 28


quando nos deparamos com realidades diferentes das nossas. Mas não demorou muito para Joãozinho entender que nos abrir para o novo nos permite desfrutar das belezas que essas realidades têm a nos oferecer. Quanta coisa um texto literário pode nos ajudar a refletir, não é mesmo? Você consegue pensar nos temas que mais lhe chamaram a atenção nesta história?

De onde veio a rima? “[...] cordel e repente não são a mesma coisa, pois, à medida que a árvore cresce, os galhos vão se distanciando, embora estejam unidos pela origem comum.” Marco Haurélio

As expressões culturais de nosso país são muito diversas e, com o passar dos anos, nasceram e se transformaram de acordo com as influências que nós absorvemos de outros países e de outras culturas. A literatura de cordel é um grande exemplo disso. Ela nasceu há muitos anos, inicialmente de forma oral, por influência dos portugueses que vieram ao Brasil e trouxeram em sua bagagem cultural o hábito dos trovadores medievais de cantar poemas. Esses trovadores tinham o objetivo de difundir histórias entre a população que, em sua maioria, não sabia ler. No Brasil, essa literatura se popularizou no Nordeste do país como poesia popular, que era registrada em folhetos, cada um contando uma história com princípio, meio e fim. Como você viu em O encontro da Cidade Criança com o Sertão Menino, muitos autores se destacaram ao longo da história da literatura de cordel por meio de seus textos, que registram a cultura, os hábitos, as questões políticas e sociais e que também denunciam problemas encontrados com frequência nas cidades espalhadas pelo país. 29


E qual é, então, a importância de conhecer a literatura de cordel? Além de ser uma literatura muito agradável de ler – por conta das rimas e do ritmo do texto e porque as histórias costumam ser engraçadas e retratar acontecimentos de interesse comum –, conhecer os mais variados tipos de expressão literária e artística de nosso país contribui para que possamos compreender quem nós somos como seres humanos e como parte de uma cultura na qual estamos inseridos. A cada texto que lemos, a cada música que ouvimos e a cada filme que assistimos, estamos nos divertindo, distraindo-nos, mas estamos também refletindo e compreendendo melhor como as pessoas pensam, o que elas consideram importante e quais universos cabem dentro de uma obra de arte. Além disso, ao lermos histórias de personagens com os quais podemos nos identificar, seja pelas semelhanças que temos com eles, seja pelas diferenças de realidades, temos a oportunidade de refletir sobre comportamentos, hábitos e formas de nos relacionar com tudo e todos à nossa volta. É por isso que o autor Marco Haurélio e o ilustrador Laerte Silvino são tão importantes para a literatura infantojuvenil, porque conseguem traduzir tudo isso na forma de texto e

Arquivo pessoal

de imagem, respectivamente. Vamos conhecer mais sobre eles?

Marco Haurélio, o autor Marco Haurélio nasceu em Riacho de Santana, na Bahia, e estudou Letras. Mas você sabia que, além de escritor, ele é um grande estudioso da literatura de cordel e das expressões populares do país? Pois é, ele também é editor (ou seja, ele cuida dos livros de outros escritores para que

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eles cheguem perfeitos às mãos dos leitores) e é chamado de folclorista, pois pesquisa muito a respeito de lendas populares e de cultura regional brasileira. O trabalho feito por Marco Haurélio é tão importante que ele é frequentemente convidado para dar palestras em escolas, participa de bienais e, em 2018, foi até os Emirados Árabes Unidos, no Oriente Médio, a convite de um importante instituto chamado Institute for Heritage, e lá recebeu uma medalha de honra ao mérito pelas pesquisas e pela difusão que faz no campo das tradições populares. Além deste livro que você acabou de ler, Marco Haurélio já escreveu muitos outros, como Presepadas de Chicó e Astúcias de João Grilo, O príncipe que via defeito em tudo, Histórias de combates, amores e aventuras do cavaleiro Palmeirim de Inglaterra, em coautoria com José Santos e Jô Oliveira, entre outros. Se você quiser saber mais a respeito da história do autor, os livros publicados, a história do cordel e de outros cordelistas, sugerimos a você visitar o blog: https://marcohaurelio.blogspot.com (acesso em: 29 ago. 2021).

Como você já sabe, Laerte Silvino é o responsável pelas ilustrações que compõem o livro O encontro da Cidade Criança com o Sertão Menino. Laerte

Arquivo pessoal

Laerte Silvino, o ilustrador

é ilustrador há muitos anos. Nascido em Recife, no estado de Pernambuco, ele se formou em Geografia e, depois de viajar por diversas regiões do país, decidiu fixar residência e transformar tudo o que conheceu em suas viagens em imagens e ilustrações, tanto para os livros como para os quadrinhos. 31


Além de ilustrador, Laerte também é escritor, assim como Marco Haurélio, e já publicou livros escritos e ilustrados por ele, muitos deles em formato de histórias em quadrinhos. Laerte Silvino tem ainda um site que você pode visitar para saber mais a respeito do trabalho dele e de sua biografia: https://cargocollective.com/laertesilvino (acesso em: 29 ago. 2021). Nesse site, você vai encontrar muitas ilustrações que ele fez para livros diversos, jornais e revistas.

Até as próximas leituras! Esperamos que você aproveite ao máximo tudo o que o livro e este texto complementar podem oferecer. Sempre que sentir vontade, releia novamente a história dos primos Zé Silva e Joãozinho, passeie pelas ilustrações, fale em voz alta as rimas e pesquise um pouquinho mais a respeito de tudo o que esse texto traz de novidades para você. Assim como somos pessoas diferentes em cada momento de nossa vida, a história também ganha novas formas e cores sempre que a lemos novamente. E, acredite, ela fica cada vez melhor. Aproveite! 32



O que será que um menino da agitada cidade de São Paulo tem em comum com um garoto do interior do estado de Alagoas? Não se avexe, não, que, apesar de essas duas realidades parecerem contramão, criança é criança em qualquer ocasião! A vó Sinhana, guardiã de um tesouro que vale mais que ouro, vai apresentar aos leitores e a esses dois primos as fantásticas histórias e canções da tradição popular. Escrita em estrofes de seis versos e sete sílabas poéticas, forma consagrada do cordel, este livro homenageia grandes cordelistas e repentistas nordestinos. Uma verdadeira celebração das tradições populares de nosso sertão.

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