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PNLD 2023 | O3 - ADIVINHA QUEM FOI O MIOLO DO BOI - Arco 43 Editora

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Ilustrações:

Brasil: o Bumba Meu Boi. Assim como os garotos, que se envolvem em brincadeiras, essa bonita tradição folclórica – nada mais que uma brincadeira! – vem nos envolver em sotaques diferentes, cores fortes e sons alucinantes… por várias regiões do país e pelas belas páginas deste livro.

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Você já ouviu falar de Catirina, Pai Francisco ou Mimoso? Sabe

LUCIANA GRETHER

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WILSON MARQUES





WILSON MARQUES ilustrações: LUCIANA GRETHER


© Arco 43, 2021 Todos os direitos reservados Texto © Wilson Marques Ilustrações © Luciana Grether Direção-geral: Vicente Tortamano Avanso Direção editorial: Felipe Ramos Poletti Gerência editorial: Gilsandro Vieira Sales Edição: Paulo Fuzinelli Assistência editorial: Aline Sá Martins Apoio editorial: Maria Carolina Rodrigues Supervisão de artes: Andrea Melo Edição de arte: Daniela Capezzuti Design gráfico: Ana Matsusaki Supervisão de revisão: Elaine Silva Revisão: Andréia Andrade e Martin Gonçalves Supervisão de iconografia: Léo Burgos Pesquisa iconográfica: Daniel Andrade e Priscila Ferraz Supervisão de controle de processos editoriais: Roseli Said Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Marques, Wilson Adivinha quem foi o miolo do boi / Wilson Marques ; ilustrações Luciana Grether. -- 2. ed. -São Paulo : Arco 43 Editora, 2021. ISBN 978-65-86987-59-1 (aluno) ISBN 978-65-86987-58-4 (professor) 1. Conscientização social nas crianças 2. Cultura popular - Literatura infantojuvenil 3. Literatura infantojuvenil I. Grether, Luciana. II. Título. 21-89021

CDD-028.5 Índices para catálogo sistemático:

1. Literatura infantil 028.5 2. Literatura infantojuvenil 028.5 Maria Alice Ferreira - Bibliotecária - CRB-8/7964

2ª edição, 2021

Rua Conselheiro Nébias, 887 São Paulo, SP – CEP: 01203-001 Fone: +55 11 3226-0211


Este livro é dedicado aos que constroem com alegria e criatividade a nossa rica cultura popular. Wilson Marques

Dedico minha arte aos mestres brincantes de todos os tempos, que mantêm a festa viva, a dança encantada, o brilho dos bordados e a poesia das toadas, com quem aprendi a brincar de boi e me inspirei para ilustrar este livro. Luciana Grether


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– Adivinha, Duda, quem vem passar as férias com a gente? – papai chegou do trabalho perguntando. – Quem? – O seu primo Beto. – Que irado! Aquelas férias prometiam. Festas juninas e a chegada do primo que eu conhecia só de rede social. – Quando ele chega? – perguntei, ainda mais animado, porque com visita em casa eu tinha mais desculpas para sair e aproveitar. – Daqui a pouco. Vamos já buscá-lo no aeroporto. Naquela mesma noite o primo dividiu o quarto comigo. Mas bastaram dois ou três dias para as coisas azedarem e eu querer ver a visita pelas costas. Não que eu seja pouco hospitaleiro nem nada. Pelo contrário, sempre gostei de receber parentes e amigos e mostrar as coisas legais da nossa cidade. O problema é que, com a chegada do primo, aconteceram algumas coisas que me deixaram incomodado. Uma delas é que eu fiquei invisível. Quer dizer, não invisível, invisível. Eu fiquei tipo ofuscado com a presença daquele menino desinibido, cheio de histórias para contar, tão inteligente e corajoso, como mamãe não cansava de repetir, que tinha sido capaz de viajar sozinho.

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Claro que eu não admitia estar sofrendo de inveja ou coisa parecida. Mas a verdade é que comecei a cismar com tudo que vinha do primo: seu jeito de andar, seu sotaque, suas roupas, suas histórias. O primo fazia que não era com ele. Até que um dia, cansado de ouvir minhas zombarias, papai veio com o papo reto dele: – Duda, em vez de ficar zoando com o Beto, você devia era aproveitar a companhia para aprender coisas novas, fortalecer a amizade de vocês. É muito feio o que você está fazendo – ele disse. Depois exigiu que eu pedisse desculpas. – Como assim, desculpas? Mas eu não fiz nada! Nem tenho nada pra aprender com ele. – Claro que fez. E você sabe que fez! – papai insistiu. – Tudo bem. Vai que fiz alguma coisa mesmo. Mas se ele não aceitar minhas desculpas?


Papai pensou um pouco. Depois falou: – Tenho uma ideia. Já que estamos em temporada junina, por que não convida ele para ver o Bumba Meu Boi? Vai ser uma ótima maneira de mostrar que você é um garoto legal, e não o chato que tem sido até agora. – Mas ele nunca perguntou nada sobre o boi. Acho que não tem interesse – eu disse, tentando tirar o corpo fora. – Não disse porque é muito educado e está esperando você tomar a iniciativa. E aí, o que acha? – Ninguém merece! – respondi, mas baixinho, para o pai não escutar.


De noite, mal terminamos o jantar, fomos para o arraial. Eu, o primo e papai, que estava decidido a me vigiar de perto. – Quais são as origens do boi, primo? – ele foi logo perguntando assim que entrou no carro, comprovando o que eu já sabia: que aquela seria uma das festas de São João mais aziadas de toda minha vida. – Uns dizem que são indígenas, outros, que são africanas e europeias. Mas você vai perceber que ele tem um pouquinho de tudo isso – respondi, tentando demonstrar boa vontade. – Ouvi dizer que existem diversos estilos de boi, isso é verdade? Para minha sorte, papai se adiantou. – É sim. É o que chamam de sotaques. Por aqui existem bois de diversos sotaques, cada qual com ritmos, fantasias e instrumentos próprios. – Muito massa, estou supercurioso pra conhecer – disse o primo, todo agitado. Quando chegamos, rojões pipocavam no céu. O boi dançava na praça lotada, enfeitada de bandeirinhas coloridas, e um cordão de dançarinas homenageando os indígenas alinhava-se na frente do grupo, abrindo alas. Em seguida vinham os diversos personagens


da brincadeira: burrinha, cazumbás, feiticeiros, vaqueiros. E o mais importante deles: o boizinho Mimoso, com seu couro de camurça decorado com desenhos de canutilhos de todas as cores. – É o espetáculo mais irado que já vi – disse o primo, querendo chegar mais perto. Forçando passagem entre a multidão, papai nos guiou até a primeira fila. O Amo, um homem de chapéu de fitas e um maracá na mão, cantava para a multidão.

A lua brilha no horizonte As folhas balançam no coqueiro Vou cantar toada Pro meu boi dançar no terreiro.


Finalmente, ouviu-se um apito, fazendo silenciar matracas e pandeirões. Então foi anunciada a aguardada apresentação do auto do Bumba Meu Boi. – É a história de Catirina, ou Catita, e Pai Francisco, que se passa nos ermos do sertão nordestino – esclareci antes do mala perguntar.


personagens principais: amo ou senhor dono da fazenda.

catirina (catita) esposa de pai francisco. mulher teimosa que, estando grávida, deseja comer a língua do boi mimoso.

pai francisco (chico) marido de catirina e o mais confiável serviçal da fazenda.

boi mimoso o boi queridinho do amo, sob os cuidados de pai francisco.


catirina, na verdade um homem vestido de mulher grávida, foi a primeira a falar, e fez isso de um jeito tão engraçado que arrancou gargalhadas da plateia. catirina – chico, tô com desejo. pai francisco – de novo, catita? desejo de que dessa vez? catirina – de comer língua de boi. pai francisco – isso não é problema. hoje mesmo o patrão vai mandar matar um boi. peço a língua pra ele e pronto. catirina (manhosa) – mas chico, não é a língua de qualquer boi que eu tô desejando. pai francisco (preocupado) – explique isso direito, mulher. catirina – quero a língua do boi mimoso, bem temperadinha pro jantar.


pai francisco (assustado e depois furioso) – tá maluca, catita? como é que vou matar o bichinho só para satisfazer esse seu desejo, sua teimosa? além do mais, mimoso é o novilho mais querido do patrão. ele manda para a forca quem fizer algum mal ao pobre. tanto catirina insistiu, que pai francisco cedeu: passou a faca em mimoso e entregou a língua à mulher, que a devorou. o senhor, porém, que tudo via e sabia, descobriu o mal feito e condenou o casal à forca. mas, por gostar muito do velho chico, e como este muito implorasse por perdão, decidiu dar-lhe uma chance. senhor – se der um jeito de ressuscitar mimoso, tem sua liberdade e sua vida de volta, e a da sua mulher. pai francisco – farei tudo ao meu alcance. que deus tenha piedade de nós.


dizendo isso, o velho vaqueiro pediu licença e caiu no mundo. até voltar na companhia de um doutor que encontrou em terras distantes. uma vez na fazenda, o doutor (na verdade, um feiticeiro) examinou mimoso de tudo que era jeito. depois, sacudindo chocalhos e dizendo palavras estranhas, realizou seus procedimentos mágicos. e com isso o boizinho deu um urro, levantando e firmando-se nos próprios cascos. senhor – viva! mimoso está de volta. pai francisco – viva! todos – viva! a alegria foi geral. feliz da vida, o senhor perdoou o destrambelhado chico, libertou a teimosa catirina e decretou vários dias de festa.



– Então, satisfeito? – perguntei ao primo, na esperança de que ele não tivesse mais perguntas. Ele não respondeu. Olhei para um lado e outro. Nada. Então me dei conta de que o primo tinha sumido. – Meu Deus! Onde seu primo foi parar? – papai perguntou, pois também tinha notado sua ausência. – Não sei. Estava aqui agorinha mesmo. – Como não sabe, se ele estava fazendo perguntas o tempo todo? – papai insistiu. Depois, torcendo a cara, disse: – Ora, já sei o que aconteceu. Tanto você tratou ele mal que a paciência dele se esgotou. Senti um nó na garganta.


– Não tratei mal coisa nenhuma! – eu reagi, irado, porque pelo menos naquela noite eu estava tratando o primo como se ele fosse um reizinho mandão, de modo que achei a acusação um bocado injusta. Mas aí o rosto de papai ficou ainda mais sombrio, depois de ele ligar para o primo e o celular dele dar fora de área. – E agora, o que vamos fazer? – perguntei, cheio de culpa. E apavorado só de imaginar o que poderia acontecer se não encontrássemos o fujão. – Vamos procurar ele, ora essa. Ou você tem ideia melhor? – esbravejou papai, quase soltando fumaça. Enquanto eu só sentia medo.



Achar alguém, ainda mais um garoto, no meio daquele mundão de gente e penachos, com certeza não seria coisa fácil. Mas a gente não podia perder tempo e começamos a perguntar e andar de um lado para o outro. Quinze minutos de busca e nem sinal do Beto. Tentamos o serviço de alto-falante, que também não deu resultado. O próximo passo, pensei com um arrepio, era dar parte na polícia. Depois ir aos hospitais. Depois, sabe-se lá onde. Foi papai, na verdade, quando o desespero já começava a tomar conta da gente, quem primeiro percebeu o estranho jeito de o boizinho dançar. Meio desengonçado, o Mimoso dava rodopios e corria em direção da criançada, ameaçando com os chifres. Depois voltava ao centro da roda e outra vez atacava, enquanto todos riam e aplaudiam. – Não vê alguma coisa de familiar nesse boizinho? – papai perguntou intrigado. Fiquei boiando. – Tipo o quê? – perguntei. – Observe o jeito de ele dançar – disse papai, sem tirar os olhos do boi.

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Então, depois de observar o boi atentamente por alguns segundos, saquei: – Caraca! O miolo do boi é o primo Beto! – quase gritei, quando um homem, o verdadeiro miolo, que é a pessoa que fica por baixo do boi dando vida à armação de pano e madeira, se aproximou, levantou o animal de brinquedo e fez o primo sair lá de baixo com a cara mais deliciada do mundo. Quando o vimos, papai ensaiou uma bronca. Eu também quis dar uma bronca daquelas no primo, afinal ele era o responsável pelo maior susto que eu já tomara na vida. Mas naquele instante ele estava recebendo tamanha chuvarada de aplausos que pegaria muito mal pra gente brigar com o artista assim, em público. Além do mais, tanto quanto o pai, eu estava tão aliviado com sua volta que a minha raiva foi embora. E então o primo fez a primeira coisa que realmente achei legal desde que chegou à nossa casa: falou com o homem para que deixasse eu ser o miolo do boi. E o homem concordou. “Que maneiro!”, pensei. Aquele era um sonho que eu tinha desde que vi um Bumba Meu Boi pela primeira vez, mas nunca tinha realizado.

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Entrei logo debaixo do boi e comecei a dançar. E, embora nunca tivesse feito aquilo, percebi que estava dando um verdadeiro espetáculo, pois quanto mais eu rodopiava e dava breques, mais ouvia o povo gritar e aplaudir. – Muito obrigado, primo, você é 10! – eu me vi no dever de reconhecer. – Eu é que agradeço por terem me apresentado essa linda festa – disse o primo, que dessa vez não me pareceu nem um pouco chato ou presunçoso. Passado o susto, papai não deixou, como sempre, de dar conselhos, tipo “você não devia ter feito isso”, “e você não devia ter feito aquilo” etc. etc. Depois sorriu e levou a gente numa barraca de comidas típicas onde saboreamos suco de frutas, arroz de cuxá e peixe frito.

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Quando chegamos em casa, fui logo perguntando: – Mãe, sabe quem foi o miolo do boi? – Não faço ideia. – Duda e Beto. Você não imagina como esses meninos dançam – papai respondeu. Contamos todos os detalhes da história. Mamãe, achando tudo muito engraçado, confessou estar arrependida por não ter ido à festa. Quando não deu mais para segurar o sono, fomos deitar. Pela manhã, na mesa do café, o primo comunicou: – Agora que assisti a uma apresentação do boi, posso voltar para casa. É uma pena, porque estou me divertindo muito – ele disse. E foi aí que percebi definitivamente que, depois daquela pequena aventura, minha opinião a respeito do primo tinha mudado de vez. Porque, assim como meus pais, fiquei muito triste com a notícia. – Por que não fica mais uns dias? – papai perguntou. – Minhas aulas vão começar. Além do mais, estou morrendo de saudades de casa – ele disse, com seu jeito de falar diferente, que dessa vez não achei ridículo. – Que pena! Mas fique sabendo que estaremos sempre prontos para recebê-lo, não é, Duda? – perguntou mamãe tentando nos animar, embora ela mesma não conseguisse disfarçar seu abatimento.

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Fomos deixar o primo no aeroporto. Mamãe e papai quase choraram quando as bagagens foram despachadas, e ele, depois de dar um abraço em cada um, se encaminhou para a sala de embarque. Antes que passasse pela porta onde a comissária de bordo o aguardava, dei um jeito de falar sobre uma coisa que eu tinha entalada na garganta. – Olha, primo, queria pedir desculpas. – Como assim, desculpas? – ele perguntou como se não estivesse entendendo. – Pelo jeito que tratei você. O primo ficou um tempo pensativo. Depois disse: – Tudo bem. Você estava mesmo estranho, mas o importante é que não está mais. Não esquenta com isso – ele disse e me abraçou, do mesmo modo, lembrei, como fez o Senhor quando perdoou Pai Francisco e Catirina depois da grande besteira que tinham feito. Na volta para casa, soube da notícia: o primo pedira aos meus pais que me deixassem passar as próximas férias em sua casa. E eles haviam concordado. – Muito maneiro! – eu disse, começando a contar os meses, as semanas, os dias. Só não queria que me elogiassem tanto e me tratassem tão bem quanto trataram o primo por aqui. Para não correr o risco da minha presença fazer ele se sentir invisível, ou ofuscado. Porque aí já se sabe o que pode acontecer.

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Bumba Meu Boi,

uma das maiores festas populares do Brasil O Bumba Meu Boi, uma manifestação folclórica muito popular em diversas partes do Brasil, em especial no Maranhão, serviu como ponto de partida para a construção da história que você leu. É uma brincadeira que gira em torno da história de Catirina e seu marido, Pai Francisco. Grávida e desejando comer língua de boi, ela induz o esposo vaqueiro a matar o novilho mais querido do Amo ou Senhor, o Boi Mimoso. No Bumba Meu Boi maranhense destaca-se a variedade de ritmos, chamados sotaques. Na capital, São Luís, são mais comuns os bois de sotaque de matraca, assim chamados por usarem as matracas (pedaços de madeira) entre seus instrumentos mais marcantes. Existem ainda os sotaques de zabumba, costa de mão e os de orquestra. Em todo o estado existem cerca de 300 grupos de boi. Vistos de forma preconceituosa até a década de 1940, os grupos eram impedidos de se apresentar no centro da capital, São Luís. Felizmente, já faz tempo que essa história mudou. Hoje o Bumba Meu Boi, com sua riqueza de ritmos, cores e danças, está definitivamente incorporado à cultura do povo não só do Maranhão mas do Brasil. Prova disso é o reconhecimento dessa tradição como um dos nossos patrimônios imateriais. Wilson Marques



vamos falar sobre este livro?

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A união entre o verbal e o não verbal Ao ler este livro, você deve ter reparado que ele não possui só um texto escrito por Wilson Marques, mas também ilustrações criadas por Luciana Grether, que acompanham a narrativa escrita e oferecem nova dimensão à história de Beto e Duda. A ilustração é uma expressão artística que tem como objetivo comunicar ideias não verbais de um texto. “Não verbais” significa que não são utilizadas palavras, apenas imagens ou símbolos. A ilustração transmite ao leitor as ideias exploradas no texto e, às vezes, detalhes novos, que não são mencionados pelo autor. Viu como uma imagem tem muito a dizer?

Seção elaborada por Daniela Aparecida Francisco, doutora em Literatura e Vida Social com ênfase em Literatura Infantil e Juvenil pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp) e mestre em Literatura Infantil e Juvenil pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). Graduada em Pedagogia pela Unesp, cursou magistério, atuou como professora do Ensino Fundamental e foi formadora no Programa Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa. É coordenadora pedagógica na Educação Básica desde 2008. Atua também na formação continuada de professores e como docente em curso de Pedagogia.

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No caso deste livro, Luciana Grether criou ilustrações alegres e com cores fortes, que, além de ilustrar a história, mostram um pouco como são as festas folclóricas exploradas pelo texto e também as tradições culturais da cidade de São Luís, no Maranhão, onde a história se passa. Ela se inspirou em fotografias de várias festas tradicionais desse lugar para dar vida às palavras de Wilson Marques utilizando materiais artísticos. Durante a leitura, é possível perceber que a junção entre texto e imagem torna viva a nossa imaginação e nos faz querer embarcar nessas férias tão legais com os primos Duda e Beto, lá na Região Nordeste do Brasil.

O gênero Há várias maneiras de contar uma história. Ela pode ser longa ou curta, conter vários detalhes e pessoas ou apenas algumas informações e poucos personagens. Se pensarmos na história de Duda e Beto, veremos que se trata de uma narrativa curta que inclui poucos personagens (Duda, Beto e os pais de Duda) e que conta sobre as férias que eles passaram juntos. Quando temos uma história assim, curta, com poucos personagens e que narra apenas um acontecimento específico, algo que aconteceu em determinado lugar, espaço ou tempo, podemos chamá-la de conto. Você deve ter percebido que não ficamos sabendo muitos fatos da vida de Beto e Duda antes 33


daquelas férias, nem depois. Isso também é uma característica desse gênero textual. Se a história fosse comprida e ocorresse em várias cidades do Maranhão e de São Paulo, por exemplo, e tivesse muitos acontecimentos diferentes em um longo período de tempo, não teríamos mais um conto, mas uma novela ou até um romance. Mas vamos nos concen­trar no conto, já que esse é o gênero textual escolhido por Wilson Marques para narrar a história de Duda e Beto. Agora que você já sabe que a história que acabou de ler é um conto, uma narrativa breve e concisa que narra um acontecimento específico, que tal explorar todos os elementos que fazem do conto um conto? Vamos começar pelo narrador, ou seja, aquele que conta a história. Um conto (ou uma novela ou um romance) pode apresentar vários tipos de narrador: narrador personagem (aquele que participa da história), narrador testemunha (aquele que só relata a história) e narrador onisciente (aquele que narra a história e sabe tudo o que aconteceu e o que os personagens fizeram, pensaram e sentiram). Neste livro, quem assumiu a função de narrador do conto foi Duda. Mas não foi ele quem escreveu essa história. Para ficar mais fácil de entender, lembre-se de que o escritor é Wilson Marques, mas quem conta tudo que aconteceu quando Beto foi passar as férias na casa dos

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tios foi o personagem Duda. Então, Duda é narrador e personagem de uma história escrita por Wilson Marques. Lembre-se também que, mesmo quando um escritor escreve sobre si mesmo, ele não é o narrador da história, pois quem conta os fatos é um narrador fictício, criado pelo escritor. Agora, um narrador que também é personagem vai usar o pronome em primeira pessoa (eu), mas um narrador que não participa da história vai usar a terceira pessoa (ele/eles). Você já sabe que Duda é um narrador-personagem. Mas você conseguiu perceber que ele narra toda a história em primeira pessoa? Volte algumas páginas e tente identificar marcas do texto que provam isso. Vamos lá, será como uma caça ao tesouro! Além do narrador, há outros elementos que se unem para formar o conto, como apresentação, desenvolvimento, clímax e desfecho. Ou seja, mesmo sendo curto, um conto tem começo, meio e fim. Você sabe como funciona cada um desses elementos? Primeiro, temos a apresentação: é quando conhecemos o narrador, os personagens, o local da narrativa, o tempo etc. Agora que já sabemos quem, onde e quando, o conto entra na segunda parte, que é o desenvolvimento. No desenvolvimento, descobrimos o que irá acontecer com os personagens, que ações irão realizar, que fatos irão se desenvolver etc. Isso chega a um ponto máximo, ou seja, o momento mais emocionante da narrativa: o clímax. E, por fim, temos o desfecho,

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que serve como um ponto final nas aventuras dos personagens e do conto. Vamos tentar identificar cada um desses elementos na história de Duda e Beto? Quando a história começa? Você se lembra? É a partir desse evento inicial que a história é apresentada a nós, leitores. As narrativas acontecem em uma sequência, em uma sucessão de tempo, de eventos e personagens que transformam o evento inicial. O que transformou a situação inicial na história de Duda? O que aconteceu de extraordinário que transformou algo simples em uma aventura digna de ser contada? A próxima parte a ser identificada é o clímax. Qual foi o momento mais emocionante, aquele em que algo diferente aconteceu e que transformou os personagens de alguma maneira? O desfecho envolve os fatos que fecham a narrativa. O que Duda nos contou ao final do livro sobre o que aconteceu depois do clímax? Agora, vamos conhecer mais alguns elementos que também fazem parte do gênero textual conto.

°° Tempo: é quando acontece ou aconteceu a história. Podemos

contar algo que ocorreu no passado, no presente e até mesmo fatos do futuro. 36


°° Espaço: é onde a história se passou. Pode ser um local geral – um país, um estado ou cidade. E também um local mais específico, como a casa de alguém, um parque, uma rua.

°° Enredo: é como a história acontece, como se desenvolvem as

ações, os fatos narrados. É pelo enredo que entendemos o tema, o motivo central do texto.

°° Personagens: são os agentes do conto, aqueles que estão presentes para a ação, ou que contam a história, ou ainda aqueles que participam da narrativa, mas não são os personagens principais.

Você consegue identificar cada um desses elementos no livro que acabou de ler? Explore quem são os personagens principais e secundários, em que cidade a história se passa e os demais lugares por onde os personagens passam e se ela é contada no passado ou no presente. Pronto, agora você sabe bastante coisa sobre o gênero textual conto. Mas você sabia que uma história pode ter mais do que só um gênero? Nas páginas 13 a 16, temos a história de Catirina, que não é contada em formato de conto, como a história de Duda e Beto, mas de teatro! Repare que os personagens são apresentados no começo do texto e depois a história só tem diálogos e indicações de como cada um age ou onde está ocorrendo a ação. Quantas informações sobre esse texto, não é mesmo? E o mais incrível é saber que ele foi criado por alguém. Vamos conhecer mais sobre o autor e a ilustradora deste livro. 37


Wilson Marques, o autor

Arquivo pessoal

Wilson Marques escreveu este livro usando a imaginação e seus conhecimentos sobre o estado em que nasceu, o Maranhão. Ele nasceu na cidade de Caxias e mudou-se com poucos meses de vida para a capital, São Luís, onde cresceu, viveu muitas aventuras e leu muitos livros (e ainda lê muito!). Estudou Comunicação Social e se formou em Jornalismo. Também morou em outras cidades, como São Paulo e Manaus. Visitou outras terras, outros lugares, mas nunca perdeu suas raízes mais profundas, que, segundo ele, vêm da cultura popular: dos tempos de infância, quando, sem autorização para sair de casa de noite, adormecia ouvindo o som doce dos pandeirões dos bois-bumbás nas madrugadas juninas, e da juventude, quando acompanhava os grupos Boi da Madre Deus e Boi da Maioba, que amanheciam se apresentando pelos arraiais de São Luís. Esse livro é um tributo, um retorno de sonho e fantasia àqueles tempos de infância e juventude que homenageia uma das mais belas e tradicionais manifestações artísticas do povo brasileiro: o Bumba Meu Boi! Wilson Marques escreve contos, poemas, crônicas e outros gêneros textuais em livros, blogs, redes sociais, revistas e diversas outras plataformas on-line e impressas. É um escritor que valoriza a cultura do Maranhão e que divulga, às crianças e aos jovens leitores como você, as belezas e tradições da Região Norte e Nordeste do país por meio de histórias inspiradas 38


em mitos, lendas, cordel, festas tradicionais; enfim, na cultura popular. Que tal pesquisar outras obras do escritor? Temos certeza de que há muitas outras histórias que você vai gostar de ler.

Luciana Grether, a ilustradora

Arquivo pessoal

Como já conversamos, um livro pode ter aspectos que vão além do texto, e é o que acontece com este, cheio de ilustrações, imagens e cores criadas pela ilustradora Luciana Grether. Luciana vive no Rio de Janeiro e ilustra livros infantis há algum tempo. Muitos anos atrás, em 1996, viajou para o Maranhão e viu um boizinho dançar com devoção para um menino adoecido que havia se curado. Ela ficou apaixonada por toda aquela festa. Desde que retornou da viagem, ela brinca e borda para o Boi Cascudo. As ilustrações deste livro foram inspiradas nessas experiências e em fotos que ela mesma fez quando esteve em São Luís. São pinturas com bordados. Para ela, cada ilustração é uma declaração de amor ao brilho dessa festa brasileira. Além dos inúmeros livros que ilustrou, Luciana também produziu ilustrações para o Jornal do Brasil e para a abertura da novela “Joia Rara”, além de participar de inúmeras exposições no Brasil e no exterior. Duas vezes foi finalista do prêmio da Associação de Escritores e Ilustradores de Literatura Infantil e Juvenil na categoria Ilustração e recebeu importantes reconhecimentos, como o Selo Distinção da Cátedra Unesco de Leitura. 39


Qual será seu próximo livro? Não há nada como mergulhar em uma história, conhecer lugares diferentes e aprender alguma coisa pelo caminho, não é mesmo? E há tantas formas diferentes de contar histórias: uma caverna cheia de pinturas, uma dança, uma peça, até uma estátua! Também é possível ter histórias dentro de outras histórias, como você viu neste livro. Você percebeu como não são apenas os textos e as imagens que contam uma história em Adivinha quem foi o miolo do boi? O Bumba Meu Boi é mais do que uma brincadeira, é uma manifestação folclórica de música, dança e palavras que existe há muitos e muitos anos e também serve para contar uma história. E essa história é uma representação de parte importante da cultura do nosso país. Mas nem todo mundo a conhece, por isso mesmo Wilson Marques escolheu contar a história de Duda e Beto, dois primos de regiões completamente diferentes do nosso país, e dentro dessa história, ele nos trouxe o Bumba Meu Boi. Uma história dentro de uma história, dentro de outra história. Quanto mais histórias nós conhecemos, mais rica fica a nossa experiência de leitura, dentro e fora da sala de aula. Por isso, depois de ler este livro, que tal escolher outro?



Ilustrações:

Brasil: o Bumba Meu Boi. Assim como os garotos, que se envolvem em brincadeiras, essa bonita tradição folclórica – nada mais que uma brincadeira! – vem nos envolver em sotaques diferentes, cores fortes e sons alucinantes… por várias regiões do país e pelas belas páginas deste livro.

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pouquinho de uma das festas populares mais famosas do

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Em meio à história de Beto e Duda, esta obra mostra um

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Ao ver aquele grande espetáculo, Beto se empolga tanto que

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o que é maracá e zabumba? Beto não sabe, mas durante as

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WILSON MARQUES


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