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Funções reais de duas variáveis reais, limites e continuidade

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reais

Características:

2. Limites de funções reais de duas

Aplicação de conjuntos de nível para obtenção das imagens de algumas funções reais de duas variáveis reais.

3. Limites de funções reais de duas

Aplicação de conjuntos de nível para obtenção de máximos e mínimos de algumas funções reais de duas variáveis reais condicionadas a determinados subconjuntos dos seus domínios.

Tratamento extensivo de todas as expressões indeterminadas.

Apresentação de três estudos exaustivos de limites: limites iterados, análise geométrica do limite e limites infinitos.

Tratamento da continuidade de uma função real de duas variáveis reais, sob seus aspectos práticos.

Sugestões de projetos que desenvolvem um tópico específico em uma sequência de exercícios.

variáveis reais: noções gerais

variáveis reais: métodos de cálculo

4. Continuidade de funções reais de

duas variáveis reais: noções gerais

5. Continuidade de uma função real de duas variáveis reais: obtenção da extensão contínua

Referências bibliográficas Índice remissivo

FUNÇÕES REAIS DE DUAS VARIÁVEIS REAIS, LIMITES E CONTINUIDADE

1. Funções reais de duas variáveis

Este livro é destinado a estudantes de graduação em Matemática que necessitem se aprofundar em funções reais de duas variáveis reais, limites e continuidade, como preparação para a disciplina de Análise em ℝn.

NOVAES

CONTEÚDO

GILMAR PIRES NOVAES GILMAR PIRES NOVAES

FUNÇÕES REAIS DE DUAS VARIÁVEIS REAIS, LIMITES E CONTINUIDADE

Graduado em Matemática pela Universidade Federal de Viçosa (UFV). Mestre em Matemática pela Universidade de Brasília (UnB). Professor na Universidade Paulista (Unip; de 2001 a 2005); na UnB (de 2001 a 2002 e 2005); na Universidade do Planalto Catarinense (Uniplac; de 2003 a 2005) e na Faculdade Alvorada (de 2004 a 2005). Professor efetivo na Universidade Federal do Tocantins (UFT) no curso de Matemática (desde 2006) e no curso de Engenharia Civil (desde 2015). Professor do Programa de Mestrado Profissional em Matemática em Rede Nacional (ProfMat) (de 2012 a 2021), tendo orientado 15 alunos. Coordenador orientador do Programa de Iniciação Científica da Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (PIC/OBMEP, região Tocantins) desde 2016. Autor dos livros Introdução à teoria dos conjuntos (Editora da Sociedade Brasileira de Matemática – SBM); Funções reais de várias variáveis reais, limites e continuidade (Ciência Moderna). Autor de diversos artigos pela Revista do Professor de Matemática (RPM)-SBM. Revisor técnico do livro Lógica: cálculo sentencial, cálculo de predicados, cálculo com igualdade, de L. Hegenberg (Forense Universitária).


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Gilmar Pires Novaes

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Conteúdo 1 Funções reais de duas variáveis reais

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1.1

Funções reais de duas variáveis reais . . . . . . . . . . . . . .

18

1.2

Alguns tipos especiais de funções reais de duas variáveis reais

26

1.3

Gráfico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

32

1.4

Conjuntos de nível . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

34

1.5

Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

53

2 Limites de funções reais de duas variáveis reais: noções gerais

65

2.1

Algumas noções topológicas . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

66

2.2

Definição de limite de uma função real de duas variáveis reais

74

2.3

Demonstração da existência de limites por meio da definição ε−δ . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

78

2.4

Propriedades operatórias de limites . . . . . . . . . . . . . . .

84

2.5

Interpretações geométricas da definição de limite de uma

2.6

função real de duas variáveis reais . . . . . . . . . . . . . . . .

97

Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

98

3 Limites de funções reais de duas variáveis reais: métodos de cálculo

103

3.1

Limite da restrição de uma função . . . . . . . . . . . . . . . .

105

3.2

Limite ao longo de curvas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

109

3.3

Limite do produto de um infinitésimo por uma função limitada 119

3.4

Teorema do confronto . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

122

3.5

Limite do valor absoluto de uma função . . . . . . . . . . . . .

123

3.6

Limitação local . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

128

3.7

Limite de uma função composta . . . . . . . . . . . . . . . . .

132

3.8

Expressões indeterminadas: 00 , 1∞ e ∞0 . . . . . . . . . . . .

139

3.9

Coordenadas polares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

145

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3.10 Série de Taylor . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

152

3.11 Limites iterados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

158

3.12 Análise geométrica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

169

3.13 Limites infinitos (em um ponto), limites no infinito e limites infinitos (no infinito) . . . . . . . . . . . . . .

179

3.14 Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

200

4 Continuidade de funções reais de duas variáveis reais: noções gerais 4.1

A noção de função real contínua de duas variáveis reais . . . .

4.2

Interpretações geométricas da definição de continuidade de uma função real de duas variáveis reais . . . . . . . . . . . . . . . .

4.3 4.4

221 223 227

Alguns resultados sobre continuidade de uma função real de duas variáveis reais . . . . . . . . . . . . .

228

Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

235

5 Continuidade de uma função real de duas variáveis reais: obtenção da extensão contínua 5.1

Continuidade de uma função em todo o seu domínio (subconjunto próprio de R2 ) . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

5.2

5.4

246

Continuidade de uma função em todo o seu domínio (o próprio R2 ) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

5.3

241

251

Extensão contínua de uma função em seu domínio (subconjunto próprio de R2 ) a todo o R2 . . . . . . . . . . . .

256

Exercícios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

260

Referências bibliográficas

273

Índice

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Capítulo

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Funções reais de duas variáveis reais Apesar de ser possível descrever uma grande variedade de situações-problema por meio de funções reais de uma variável real, muitas outras requerem o uso de funções reais de duas variáveis reais. Há muitas fórmulas familiares ao leitor em que uma variável dada depende (do ponto de vista do conceito de função) de outras duas variáveis. Em última análise, funções reais de duas (mais precisamente, várias) variáveis reais constituem o objeto matemático por excelência para modelar determinados problemas. Motivados pelo ora exposto, iniciamos este capítulo tornando preciso o conceito de função real de duas variáveis reais em toda a sua generalidade, o qual é a base para todo o estudo subsequente, de modo que, relativamente a tal classe de funções, tratamos dos seguintes assuntos: a) alguns tipos especiais de funções reais de duas variáveis reais que desempenham papel importante, tanto em Matemática como nas mais diversas áreas do conhecimento humano; b) conceito de gráfico de uma função real de duas variáveis reais, cuja representação, por meio de um software apropriado, apresentamos associada à correspondente função, tendo como objetivo a sua ulterior aplicação nesse livro; c) conceito de conjunto de nível de uma função real de duas variáveis reais, o qual empregamos nas seguintes aplicações: i) aplicação (clássica) de conjuntos de nível à representação geométrica de uma função real de duas variáveis reais; ii) aplicação de conjuntos de nível à obtenção das imagens de algumas funções reais de duas variáveis reais;

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iii) aplicação de conjuntos de nível à obtenção de máximos e mínimos de algumas funções reais de duas variáveis reais condicionadas a determinados subconjuntos dos seus domínios.

1.1

Funções reais de duas variáveis reais

A definição de função real de duas variáveis reais é análoga à de função real de uma variável real. Definição 1.1.1. Uma função real de duas variáveis reais f : A ⊆ R2 → R (A ̸= ∅)1 é uma regra que associa a cada par ordenado de números reais (x, y) ∈ A um único valor f (x, y) ∈ R. Assim, uma função real de duas variáveis reais f : A ⊆ R2 → R consiste no seguinte: i) um conjunto A, denominado domínio de f (conjunto que contém todos os pontos (x, y) de R2 para os quais há sentido em calcular f (x, y) ∈ R — valor da função f em (x, y), ou seja, o conjunto em que a função está definida); ii) o conjunto dos números reais (R), denominado contradomínio de f (conjunto que contém os valores f (x, y) da função f , ou seja, o conjunto em que a função toma valores); iii) uma regra2 f que permite associar, de modo bem determinado, a cada par ordenado (x, y) ∈ A, um único f (x, y) ∈ R. 1 2

Daqui em diante, admitiremos, tacitamente, que A ̸= ∅. Tal regra, a qual prescreve as operações a serem realizadas com cada par ordenado (x, y) ∈ A para obter o correspondente valor f (x, y) da função f , é inteiramente arbitrária, sendo sujeita apenas às seguintes condições: 1) não deve haver exceções: para que a função f tenha A como domínio, a regra deve fornecer f (x, y) para todo (x, y) ∈ A; 2) não deve haver ambiguidades: a cada (x, y) ∈ A, a regra deve fazer corresponder um único f (x, y) ∈ R.

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Formalmente falando, conforme essa definição, (A, R, f ) é uma função real de duas variáveis reais, embora seja comum referirmo-nos a ela simplesmente por f , ou seja, apenas pela regra que define tal função (apenas um dos três conceitos que definimos, intrínsecos àquele de função). Entretanto, esse uso do mesmo símbolo para expressar a função e sua regra nos fornece um modo muito mais maleável para tratar funções. Tal uso já é corrente não apenas em Matemática mas também em toda área que emprega funções, de modo que é também o que empregaremos, às vezes, ao nos referirmos à f mais precisamente como “uma função real de duas variáveis reais f : A ⊆ R2 → R”. Ademais, existem várias outras terminologias que são comumente usadas como sinônimos de “função”, por exemplo, “aplicação”, “operador” ou “transformação”. Tais terminologias são usadas em contextos que melhor sugerem a transmissão do papel desempenhado por uma dada função específica. O conjunto que consiste propriamente nos valores da função, ou seja, o conjunto Im(f ) = {f (x, y) : (x, y) ∈ A} ⊆ R, é denominado imagem da função: cada elemento f (x, y) desse conjunto é a imagem, por f , de um elemento (x, y) de A. (Também referida na literatura matemática como imagem direta de A por f , denotada por f (A).) Às vezes, escrevemos z = f (x, y), para tornar explícitos os valores de f em (x, y). Denominamos x e y variáveis independentes, e z , variável dependente. Em resumo: z é uma função de x e y , no sentido de que valores específicos (porém arbitrários) das variáveis independentes x e y determinam um único valor real da variável dependente z . Dada uma função real de duas variáveis reais f : A ⊆ R2 → R, consideremos a sua regra de associação aquela expressa por meio de uma fórmula3 . Ao nos referirmos a problemas sobre obtenção do domínio de tal função, entenderemos 3

Dada uma função real de duas variáveis reais f : A ⊆ R2 → R, uma fórmula (algébrica) que representa f é uma expressão que estabelece operações (algébricas) a serem realizadas com todos os pares ordenados (x, y) ∈ A para obter os valores f (x, y) correspondentes. Consideraremos apenas funções que podem ser representadas por meio de fórmulas, a menos de menção em contrário.

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por domínio de f o maior subconjunto A de R2 tal que a fórmula dada nos forneça, para cada par (x, y) ∈ A , um único número real f (x, y) bem definido. Em outras palavras, podem constituir o domínio de f todos (e somente) os elementos de R2 para os quais é possível efetuarmos todas as operações mencionadas na expressão algébrica que define f . Em particular, no caso em que a função modela um problema de natureza prática (nas ciências em geral), entenderemos que o seu domínio será determinado também pelas restrições físicas sobre suas variáveis independentes, restrições essas inerentes a uma situação-problema de interesse específico em cada qual de tais ciências). Em geral, a fórmula que expressa uma dada função real de duas variáveis reais consiste em combinações de outras funções expressas por frações, potências, raízes, logaritmos ou funções inversas de senos e cossenos, de modo que, para obter efetivamente o domínio daquela função, devemos considerar as interseções dos domínios dessas funções. Em outras palavras, dada uma função real de duas variáveis reais f : A ⊆ R2 → R (expressa por uma fórmula), para obter o seu domínio A, devemos considerar simultaneamente todas as condições a que devem satisfazer as coordenadas do par ordenado (x, y) ∈ A para os quais tal fórmula tenha sentido. Uma classe geral particularmente importante de funções é aquela de uma função composta, conforme definimos a seguir4 . Definição 1.1.2. Dadas as funções f : A ⊆ R2 → R e g : B ⊆ R → R, a função composta g ◦ f : C ⊆ R2 → R é a função real de duas variáveis reais definida def. por (g ◦ f )(x, y) = g(f (x, y)), cujo domínio C é dado por C = {(x, y) ∈ A : f (x, y) ∈ B}. De acordo com essa definição, para formarmos a composta de f e g , é suficiente que a imagem de f seja subconjunto do domínio de g . 4

O leitor pode consultar a definição de função composta que apresentamos no exercício da Subseção 1.1.2, de modo que ambas as opções são possíveis, bem como equivalentes para o desenvolvimento da teoria.

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Capítulo

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Limites de funções reais de duas

variáveis reais: noções gerais O conceito de limite de uma função real de duas variáveis reais é análogo ao de limite de uma função real de uma variável real: baseia-se na noção intuitiva de aproximação. Consideremos uma função real de duas variáveis reais f : A ⊆ R2 → R e (a, b) ∈ / A, tal que possamos aproximar (a, b) por pontos (x, y) ∈ A. Usamos a notação lim f (x, y) = L (L ∈ R) para significar, intuitivamente, o seguinte: (x,y)→(a,b)

os valores f (x, y) se aproximam do número real L quando o ponto (x, y) se aproxima do ponto (a, b), tal que (x, y) ̸= (a, b), para todo (x, y) ∈ A. Em outras palavras: lim f (x, y) = L significa que podemos tornar os valores f (x, y) tão (x,y)→(a,b)

próximos de L quanto quisermos considerando pontos (x, y) suficientemente próximos do ponto (a, b), mas diferentes de (a, b). Ou, ainda, de modo equivalente: lim f (x, y) = L significa que, à medida que um ponto qualquer (x, y) do (x,y)→(a,b)

domínio A de f se aproxima de um ponto (a, b) não pertencente a A, a imagem de (x, y), por f — f (x, y) —, se aproxima de algum número real L. A seguir, mencionamos alguns dos conceitos que usam a noção de limite de uma função real de duas variáveis reais, com os quais o leitor terá contato em seus estudos posteriores de Cálculo (o primeiro dos quais, em verdade, constitui-se no terceiro dos assuntos de que tratamos nesse livro): 1) definição de função contínua; 2) definição de derivada parcial; 3) conceito de plano tangente;

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4) definição de derivada direcional; 5) conceito de vetor gradiente; 6) definição de integral; 7) conexão com o conceito de derivada de uma função complexa. Motivados pelo ora exposto, tratamos, nesse capítulo, das noções gerais do conceito de limite (aspectos teóricos de limite). Consideramos, inicialmente, algumas noções topológicas que lhe são inerentes: distância, vizinhança, ponto de acumulação. Enfatizamos, em particular, a necessidade dessa última ao definir formalmente o conceito de limite (definição ε − δ de limite): descrevemos como procedemos para estabelecer a conexão entre a desigualdade que envolve o ε dado e a desigualdade que envolve o δ correspondente que devemos obter. A última observação a respeito do Teorema 2.4.1 (Propriedades operatórias de limites) justifica a necessidade do estudo dos métodos de limite que consideraremos em todo o Capítulo 3. Ao final, apresentamos a clássica interpretação geométrica de limite (expressas de três formas equivalentes).

2.1

Algumas noções topológicas

Para realizar, de modo matematicamente preciso, o estudo do conceito de limite de uma função real de duas variáveis reais, é necessário, inicialmente, considerarmos algumas noções topológicas, as quais lhe são inerentes, a saber: i) distância (euclidiana) entre dois pontos de R2 ; ii) vizinhança (de um ponto dado); iii) ponto de acumulação (de um conjunto dado). Definição 2.1.1. Dados dois pontos quaisquer (x1 , y1 ) e (x2 , y2 ) de R2 , a distância (euclidiana) entre eles é dada por d[(x1 , y1 ), (x2 , y2 )] =

p

(x1 − x2 )2 + (y1 − y2 )2 .

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Limites de funções reais de duas variáveis reais: noções gerais

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Definição 2.1.2. Dado (a, b) ∈ R2 , a vizinhança de (a, b) e raio r > 0 é o subconjunto de R2 dado por Vr (a, b) = {(x, y) ∈ R2 : d[(x, y), (a, b)] < r}.

Em outras palavras, uma vizinhança de um ponto (a, b) é o conjunto de todos os pontos cuja distância a (a, b) é menor que algum número real positivo (região interna ao círculo de centro (a, b) e raio r). No caso particular em que excluímos o próprio ponto (a, b), denominamos essa vizinhança de vizinhança reduzida (ou perfurada) de (a, b) e raio r > 0, a qual denotamos por Vr∗ (a, b). Definição 2.1.3. Um ponto (a, b) ∈ R2 é denominado ponto de acumulação (ou ponto limite) de um conjunto A ⊆ R2 se toda vizinhança de centro (a, b) e raio r > 0 contém algum ponto de A, diferente de (a, b). Em linguagem simbólica: ∀r > 0, ∃(x0 , y0 ) ∈ A : 0 <

p

(x0 − a)2 + (y0 − b)2 < r,

ou, mais simplificadamente, Vr (a, b) ∩ A − {(a, b)} = ̸ ∅.

Dado A ∈ R2 , denotamos o conjunto dos pontos de acumulação de A por A′ (denominado derivado de A). Observamos que um ponto de acumulação de um conjunto pode ou não pertencer a esse conjunto. Um ponto (a, b) ∈ A que não é ponto de acumulação de A é denominado ponto isolado de A. Em linguagem simbólica: ∃r > 0 : Vr (a, b) ∩ A = {(a, b)}.

Um conjunto cujos pontos são todos isolados é denominado discreto. i

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Embora a definição de ponto de acumulação (a, b) ∈ R2 de um conjunto A ⊆ R2 requeira que toda vizinhança de centro em (a, b) e raio r > 0, Vr (a, b), contenha algum ponto de A, diferente de (a, b), em verdade, fixado (a, b), cada qual de tais vizinhanças contém uma infinidade de pontos de A, diferentes de (a, b), conforme nos mostra o seguinte Teorema 2.1.1. (Caracterização de ponto de acumulação) Dado um conjunto A ⊆ R2 , A ̸= ∅, (a, b) é um ponto de acumulação de A se e somente se, para todo número real positivo r, a vizinhança de centro (a, b) e raio r, Vr (a, b), contém infinitos pontos de A. Demonstração. (Direta) Se toda vizinhança Vr (a, b) contém uma infinidade de pontos de A, então, claramente, algum deles é diferente de (a, b) (se todos esses pontos fossem iguais entre si, então tal infinidade seria constituída por um só, o que é absurdo). Logo, da definição de ponto de acumulação decorre que (a, b) ∈ A′ . Reciprocamente, se (a, b) ∈ A′ , então, dada uma vizinhança Vr (a, b), existe (x1 , y1 ) ̸= p (a, b) tal que (x1 , y1 ) ∈ Vr (a, b)∩A. Consideremos r1 = (x1 − a)2 + (y1 − b)2 . Logo, 0 < r1 < r. Assim, existe (x2 , y2 ) ̸= (a, b) tal que (x2 , y2 ) ∈ Vr1 (a, b) ∩ A. p Consideremos r2 = (x2 − a)2 + (y2 − b)2 . Logo, 0 < r2 < r1 < r. Assim, existe (x3 , y3 ) ̸= (a, b) tal que (x3 , y3 ) ∈ Vr2 (a, b) ∩ A. Consideremos r3 = p (x3 − a)2 + (y3 − b)2 . Logo, 0 < r3 < r2 < r1 < r. Esse procedimento nos mostra que (x1 , y1 ), (x2 , y2 ), (x3 , y3 ) são pontos distintos entre si, todos pertencentes a A, contidos na vizinhança Vr (a, b). Prosseguindo analogamente, obtemos uma infinidade de pontos (x1 , y1 ), (x2 , y2 ), (x3 , y3 ), . . ., pertencentes a A, contidos na vizinhança Vr (a, b) dada inicialmente, todos distintos entre si. Demonstração. (Por contradição) Se toda vizinhança Vr (a, b) contém uma infinidade de pontos de A, então, claramente, algum deles é diferente de (a, b) (se todos esses pontos fossem iguais entre si, então tal infinidade seria constituída por um só, o que é absurdo). Reciprocamente, suponhamos, por contradição, que exista i

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Limites de funções reais de duas

variáveis reais: métodos de cálculo Apesar de que o conceito de limite de funções reais de duas variáveis reais é análogo ao de limite de funções reais de uma variável real, é conveniente revelar antecipadamente ao leitor a realidade com a qual ele está prestes a ter contato: o estudo de limite de funções reais de duas variáveis reais é, em geral, muito mais complexo do que o estudo de limite de funções reais de uma variável real. O leitor pode apreciar tal complexidade, tanto por meio da análise minuciosa dos exemplos fornecidos, quanto (principalmente) por meio dos exercícios propostos nesse livro. É precisamente com o desejo de que o leitor consiga entender possivelmente todos esses exemplos, que fornecemos a resolução detalhada de cada um deles, de modo que eles devam lhe servir como base para a consecução de um dos principais objetivos a ser por ele almejado: a resolução de todos os exercícios propostos. O primeiro resultado que apresentaremos, além de importante em si mesmo, constitui, de certo modo, a base de todo o nosso estudo sobre limites. Mais precisamente, conquanto a definição ε − δ de limite nos forneça apenas o critério formal para demonstrarmos que um dado número real L é o limite de uma dada função f em um dado ponto de acumulação (a, b) do seu domínio A, nada, até o presente momento, assegura-nos que tal número real L, em verdade, exista (na prática, um possível valor do limite é tipicamente desconhecido), tampouco, em caso afirmativo, se é ou não único. Pois bem, o resultado sob consideração assegura-nos que, se uma função real de duas variáveis reais tem limite, então esse

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limite é único. Esse resultado é, pois, conhecido na literatura matemática naturalmente como unicidade do limite. Teorema 3.0.1. (Unicidade do limite) Se f : A ⊆ R2 → R é uma função real de duas variáveis reais tal que lim f (x, y) = L e lim f (x, y) = M , em (x,y)→(a,b)

(x,y)→(a,b)

que (a, b) ∈ A′ , então L = M . Demonstração. Por hipótese, dado qualquer ε > 0, existem δ1 > 0 e δ2 > 0 tais que, para p ε todo (x, y) ∈ A, 0 < (x − a)2 + (y − b)2 < δ1 ⇒ |f (x, y) − L| < e

2 ε (x − a)2 + (y − b)2 < δ2 ⇒ |f (x, y) − M | < . 2 Consideremos δ = min{δ1 , δ2 }. Como (a, b) é um ponto de acumulação do p domínio A de f , podemos obter (x, y) ∈ A tal que 0 < (x − a)2 + (y − b)2 <

0<

p

δ . Usando esse (x, y), decorre que |L − M | = |L − f (x, y) + f (x, y) − M | ≤ ε ε |L − f (x, y)| + |f (x, y) − M | < + = ε, ou seja, |L − M | < ε. 2 2 Portanto, como ε é arbitrário, resulta que L = M .

O Teorema 3.0.1 (Unicidade do limite) é útil para demonstrarmos a não existência do limite de uma dada função real de duas variáveis, tal como no exemplo a seguir. Exemplo. Dada f : R2 − {(0, 0)} → R, definida por f (x, y) = demonstre que

lim (x,y)→(0,0)

f (x, y) não existe.

Resolução. Suponhamos que lim

xy

(x,y)→(0,0) x2 + y 2

xy x2 + y 2

,

= L.

Assim, de acordo com a definição ε − δ de limite, dado ε > 0, deve existir δ > 0 tal que, para todo (x, y) ∈ R2 − {(0, 0)}, (x, y) ∈ Vδ (0, 0) ⇒

xy x2 + y 2

− L < ε.

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Limites de funções reais de duas variáveis reais: métodos de cálculo

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105

δ ∈ Vδ (0, 0), temos |0 − L| < ε. Dado que Por um lado, uma vez que 0, 2 ε > 0 é arbitrário, temos L = 0. δ δ , ∈ Vδ (0, 0), temos Por outro lado, uma vez que, também, 2 2 δ δ · 1 − L < ε, 22 2 2 − L = 2 δ δ + 2 2 1

de modo que (pelo mesmo motivo anterior) L = , o que contradiz o Teorema 2 3.0.1 (Unicidade do limite). Portanto, lim f (x, y) não existe. (x,y)→(0,0)

3.1

Limite da restrição de uma função

O próximo teorema assegura-nos que, se uma função tem limite, então qualquer restrição sua a um subconjunto do seu domínio que contenha em comum com esse o ponto de acumulação, relativamente ao qual aquele limite está sendo considerado, não só tem limite, mas também tal limite coincide com o daquela função. De outro modo, esse teorema afirma, em particular, que a existência, bem como o valor do limite de uma função dependem apenas do comportamento dessa função em uma vizinhança do ponto de acumulação sob análise — ou seja, traduz, assim, o importante caráter local do limite. Como já tivemos a oportunidade de observar que, na prática, um possível valor do limite é tipicamente desconhecido, decorre da contrapositiva daquele fato estabelecido nesse teorema que, se a referida restrição não tem limite, então também não tem limite a função dada, contrapositva essa que, por sua vez, usamos tanto (principalmente) na Seção 3.2 quanto na Seção 3.6.

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Funções reais de duas variáveis reais, limites e continuidade

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Teorema 3.1.1. (Limite da restrição de uma função) Consideremos f : A ⊆ R2 → R uma função real de duas variáveis reais, e (a, b) ∈ A′ . Dado B ⊂ A tal que (a, b) ∈ B ′ , definamos a restrição g : B ⊂ A → R de f (ou seja, g = f|B ). i) Se lim f (x, y) = L, então lim g(x, y) = L. (x,y)→(a,b)

(x,y)→(a,b)

ii) Se B = Vδ (a, b)∩A, tal que

lim (x,y)→(a,b)

g(x, y) = L, então

lim (x,y)→(a,b)

f (x, y) = L.

Demonstração. i) Esse item é uma consequência imediata da própria definição ε−δ de limite. Por hipótese, temos ∀ε > 0, ∃δ > 0 : ∀(x, y) ∈ A, 0 <

p (x − a)2 + (y − b)2 < δ ⇒

|f (x, y) − L| < ε.

Restringindo (x, y) a B ⊂ A, decorre, evidentemente, que a condição acima permanece satisfeita para tal (x, y), ou seja, ∀ε > 0, ∃δ > 0 : ∀(x, y) ∈ B, 0 <

p (x − a)2 + (y − b)2 < δ ⇒

|g(x, y) − L| < ε.

Portanto,

lim (x,y)→(a,b)

g(x, y) = L.

ii) Esse item é, de certo modo, o próprio Teorema 3.0.1 (Unicidade do limite). Por hipótese, temos ∀ε > 0, ∃δ > 0 : p ∀(x, y) ∈ B(= Vδ (a, b) ∩ A), 0 < (x − a)2 + (y − b)2 < δ ⇒ |g(x, y) − L| < ε.

Ora, a condição acima é, evidentemente, satisfeita, em particular, para todo (x, y) ∈ A, ou seja, ∀ε > 0, ∃δ > 0 : p ∀(x, y) ∈ A, 0 < (x − a)2 + (y − b)2 < δ ⇒ |f (x, y) − L| < ε.

Portanto,

lim (x,y)→(a,b)

f (x, y) = L.

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Capítulo

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4

Continuidade de funções reais de duas

variáveis reais: noções gerais Nesse capítulo, tratamos das noções gerais do conceito de continuidade de uma função real de duas variáveis reais. Ao mesmo tempo em que enfatizamos a diferença entre os conceitos de limite e de continuidade, discutimos esta noção em termos daquela. Também apresentamos a clássica interpretação geométrica de continuidade, alguns tipos especiais (clássicos) de funções reais contínuas de duas variáveis reais e finalizamos o capítulo considerando alguns resultados importantes pertinentes. O conceito de função contínua é fundamental em toda a Matemática. A modelagem matemática de um determinado fenômeno sob estudo, por meio de uma função, requer, por vezes, que tal função seja, essencialmente, contínua. De modo geral, a razão desse fato é que o valor de uma função contínua em um ponto do seu domínio é “estável” por pequenas variações nesse ponto, no seguinte sentido: considere f : A ⊆ R2 → R uma função real de duas variáveis. Dado (a, b) ∈ A, f associa (a, b) a f (a, b). Dada uma aproximação (x, y) de (a, b) (ou seja, x é uma aproximação de a, e y é uma aproximação de b), o que podemos afirmar a respeito de f (x, y) (o valor de f calculado na aproximação) e f (a, b) (o valor de f calculado em (a, b))? Se f é contínua, podemos afirmar que f (x, y) é uma aproximação de f (a, b) tão boa quanto desejarmos, desde que (x, y) esteja suficientemente próximo de (a, b) (ou seja, x esteja suficientemente próximo de a, e y esteja suficientemente próximo de b). O significado desse fato, do ponto de vista da modelagem matemática que mencionamos, é que o modelo será tanto mais preciso quanto mais precisas forem as aproximações daquele ponto. i

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Funções reais de duas variáveis reais, limites e continuidade

Ora o conceito de continuidade de uma função é condição suficiente, ora é tanto condição necessária quanto suficiente para garantir a validez de alguns dos resultados mais importantes da Análise Matemática. A seguir, mencionamos alguns dos conceitos, definições e teoremas que usam a noção de continuidade de uma função real de duas variáveis reais, com os quais o leitor terá a oportunidade de ter contato em alguns dos seus estudos posteriores em Matemática: 1) a continuidade é condição necessária e suficiente para o seguinte: a) Teorema de Weierstrass (também conhecido como Teorema do Valor Extremo); b) Teorema do Valor Intermediário; c) Teorema de Fubini (também conhecido como Teorema da Inversão da Ordem nas Integrais Repetidas); d) Teorema da Mudança para Coordenadas Polares em uma Integral Dupla; e) definição de área da superfície de uma equação z = f (x, y); f) Teorema da Mudança de Variáveis em uma integral Dupla; g) Teorema do Valor Médio para Integrais Duplas. 2) a continuidade é condição suficiente para o seguinte: a) diferenciabilidade (consequentemente, exigência de continuidade das derivadas parciais); b) Regra da Cadeia; c) Teorema da Função Implícita; d) Teste da Segunda Derivada; e) Teorema de Clairaut; f) existência da integral; g) Valor Médio de uma função.

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Continuidade de funções reais de duas variáveis reais

4.1

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A noção de função real contínua de duas variáveis reais

O conceito de continuidade de uma função real de duas variáveis reais é análogo ao de continuidade de uma função real de uma variável real. Consideremos uma função real de duas variáveis reais f : A ⊆ R2 → R. Intuitivamente, dizemos que f é contínua em (a, b) ∈ A se é possível tornar f (x, y) arbitrariamente próximo de f (a, b), desde que consideremos (x, y) suficientemente próximo de (a, b). Assim, diferentemente da noção de limite (a qual está relacionada ao estudo do comportamento da função na vizinhança de um ponto de acumulação do seu domínio, independentemente de essa função estar ou não definida em tal ponto), a noção de continuidade relaciona o comportamento da função na vizinhança de um ponto do seu domínio com o valor dela nesse ponto. A definição a seguir torna matematicamente preciso esse conceito intuitivo de continuidade de uma função real de duas variáveis reais. Definição 4.1.1. Consideremos uma função real de duas variáveis reais f : A ⊆ R2 → R, e (a, b) ∈ A. f é contínua em (a, b) se, para todo número real ε > 0 dado arbitrariamente, existe um número real δ > 0 tal que, se p (x, y) ∈ A, (x − a)2 + (y − b)2 < δ , então |f (x, y) − f (a, b)| < ε. Em linguagem simbólica: ∀ε > 0, ∃δ > 0 : ∀(x, y) ∈ A,

p (x − a)2 + (y − b)2 < δ ⇒ |f (x, y) − f (a, b)| < ε.

Observações. 1) (Diferença entre as definições de limite e continuidade). Diferentemente da definição de limite, só há sentido em estudar a continuidade de f em um ponto (a, b) que pertença ao domínio A de f . 2) (Caso trivial de continuidade). Se (a, b) é ponto isolado de A, então toda função real de duas variáveis reais f : A ⊆ R2 → R é, necessariamente, contínua em (a, b). (Se (a, b) é um ponto isolado de A, então, da definição de ponto i

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Funções reais de duas variáveis reais, limites e continuidade

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isolado decorre que, para todo ε > 0, existe δ > 0 tal que Vδ (a, b)∩A = {(a, b)}. p Considerando esse δ , decorre, para todo (x, y) ∈ A, que (x − a)2 + (y − b)2 < δ ⇒ (x, y) = (a, b) ⇒ |f (x, y) − f (a, b)| = 0 < ε.) Em particular, se A é discreto (todos os pontos de A são isolados), então qualquer função f : A ⊆ R2 → R é contínua (ou seja, toda função definida em um conjunto discreto é, necessariamente, contínua). 3) (Noção de continuidade em termos da noção de limite). Consideremos (a, b) um ponto de acumulação de A que pertença a A, de modo que f (a, b) esteja definido. Suponhamos que lim f (x, y) exista. O valor desse limite (x,y)→(a,b)

pode ou não coincidir com f (a, b). Em caso afirmativo, temos o seguinte fato: f : A ⊆ R2 → R é contínua em (a, b) se e somente se lim f (x, y) = f (a, b) . (x,y)→(a,b)

Esse fato (o qual é comumente usado como definição de função contínua) reduz essencialmente a noção de função contínua àquela de limite. Reciprocamente, podemos definir lim f (x, y) = L por meio da condição de ser contínua em (x,y)→(a,b)

(a, b) a função f ∗ : A ∪ {(a, b)} ⊆ R2 → R, definida por ( ∗

f (x, y) =

f (x, y), se L

, se

(x, y) ∈ A (x, y) = (a, b)

.

(O conceito de limite caracteriza o comportamento de f nas proximidades de (a, b), porém mantendo-se sempre diferente de (a, b), o que nos permite alterar o valor de f no ponto como desejarmos, sem que alteremos o valor do limite.) Denominamos a função f ∗ , assim definida, extensão contínua de f . No caso da existência de tal função, dizemos que f é estendível por continuidade a A ∪ {(a, b)}. Funções do tipo de f ∗ acima são as que mais nos interessam em nosso estudo de continuidade. Mais precisamente, o principal problema de interesse nesse contexto é o seguinte: dada uma função f : A ⊆ R2 → R, juntamente com um ponto de acumulação (a, b) do seu domínio, não pertencente a esse, desejaremos estudar a possibilidade de estender f a uma função f ∗ : A ∪ {(a, b)} ⊆ R2 → R que seja contínua em (a, b). A observação sob análise nos fornece a solução desse

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Capítulo

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5

Continuidade de uma função real

de duas variáveis reais: obtenção da extensão contínua Nesse último capítulo, analisamos a continuidade de algumas funções reais de duas variáveis reais sob o ponto de vista prático, com o objetivo de responder às seguintes perguntas: i) dada uma função f : A → R definida em um subconjunto próprio A de R2 , ela é contínua em A?; ii) dada uma função f : R2 → R, ela é contínua em todo o R2 ? (Em caso negativo, é possível estendê-la continuamente a todo o R2 ?); iii) dada uma função f : A → R, contínua em um subconjunto próprio A de R2 , é possível estendê-la continuamente a todo o R2 ? (Em caso negativo, qual é o maior subconjunto de R2 ao qual é possível estendê-la continuamente?). Motivados por esses questionamentos, introduzimos algumas terminologias que lhe são inerentes, as quais são importantes para a adequada consecução dos nossos propósitos, quais sejam, responder às perguntas ora formuladas. Definição 5.0.1. Uma função f : A ⊆ R2 → R é denominada contínua se é contínua em todos os pontos do seu domínio A. Exemplo 1. Dada f : R2 → R, definida por  x  (3 − 1)seny , se xy f (x, y) =  p , se

x ̸= 0 e y ̸= 0

.

x = 0 ou y = 0

obtenha o valor de p para que f seja contínua em todo o seu domínio (R2 ). i

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Funções reais de duas variáveis reais, limites e continuidade

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Resolução. Inicialmente, observemos que podemos expressar f como segue: ( f (x, y) =

g(x)h(y), se

x ̸= 0 e y ̸= 0

, se

x = 0 ou y = 0

p

.

3x − 1 seny , para todo x ̸= 0, e h(y) = , para todo y ̸= 0. x y Como, pela Regra de l’Hôspital, lim g(x) = ln3, e lim h(y) = 1 (limite trigo-

em que g(x) =

x→0

nométrico “fundamental”), resulta que

y→0

lim (x,y)→(0,0)

f (x, y) = ln3.

Portanto, para que f seja contínua em todo o seu domínio (R2 ), devemos ter p = ln3. Pode ocorrer que a condição de continuidade que mencionamos na Definição 5.0.1 não se verifique em um dado ponto (a, b) ∈ A, caso em que denominamos tal ponto, naturalmente, ponto de descontinuidade de f . Exemplo 2. Dada f : R2 → R, definida por  4   (y − x2 ) x , se y f (x, y) =   0 , se

|y| > x2 |y| ≤ x

,

2

a) demonstre que f é contínua em (0, 0) ao longo de toda reta que passa por (0, 0). b) f não é limitada em qualquer vizinhança Vδ (0, 0). c) f é descontínua apenas em (0, 0). Resolução. a) Por definição, f é identicamente 0 ao longo dos eixos coordenados. Restringindo f à reta y = mx (m ̸= 0), temos o seguinte: i) para |x| ≥ |m|, f é identicamente 0, por definição. ii) para |x| < |m|, lim (x,y)→(0,0)

f (x, y) = lim (mx − x2 ) x→0

x 4 mx

mx − x2 = 0. x→0 m4

= lim

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Continuidade de uma função real de duas variáveis reais

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Logo, f é contínua em (0, 0) ao longo de toda reta que passa por (0, 0). b) Ao longo da curva y = x 2 (vide Figura 5.1 a seguir), temos 3

lim (x,y)→(0,0) 3 y=x 2

3 2

2

f (x, y) = lim+ (x − x ) x→0

x 3

x2

4

= lim+ x→0

= +∞. 1 − 1

1

x2

3

Figura 5.1: a curva y = x 2 , contida em y > x2 (parte superior de |y| > x2 ), em uma vizinhança Vδ (0, 0).

Logo, f não é limitada em qualquer vizinhança Vδ (0, 0). Nota. É instrutivo que o leitor entenda a escolha de tal curva, como parte da análise da situação pertinente mais geral, a saber, do comportamento de f , quando (x, y) tende a (0, 0), ao longo da curva y = mxp (m, p ̸= 0). c) Uma vez que, em seu domínio, ou f é zero ou f resulta de operações algébricas entre funções contínuas, o fato de que f é descontínua apenas em (0, 0) decorre do item b) (de outro modo, vide o Teorema 3.6.1 (Limitação local)).

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Funções reais de duas variáveis reais, limites e continuidade

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Conforme a relação existente entre a noção de limite e a noção de continuidade que descrevemos na Observação 3 na Seção 4.1, podemos classificar os tipos possíveis de descontinuidade de uma função dos seguintes modos: i) descontinuidade removível (não essencial ou estendível): se existe lim f (x, y), porém lim f (x, y) ̸= f (a, b);

(x,y)→(a,b)

(x,y)→(a,b)

ii) descontinuidade não removível (essencial ou não estendível): se não existe lim f (x, y).

(x,y)→(a,b)

Exemplo 3. Dada f : R2 → R, definida por f (x, y) = ⌊x2 − x + y⌋ (função piso), obtenha o conjunto dos pontos nos quais f é contínua. Resolução. Consideremos (a, b) pertencente à parábola x2 − x + y = k (k ∈ Z). Por um lado, ao longo de uma curva C1 contida no interior dessa parábola, ou seja, C1 = {(x, y) ∈ R2 : x2 − x + y < k}, temos ⌊x2 − x + y⌋ = k − 1, de modo que lim f (x, y) = k − 1. (x,y)→(a,b) C1

Por outro lado, ao longo de uma curva C2 contida no exterior dessa parábola, ou seja, C2 = {(x, y) ∈ R2 : x2 − x + y > k}, temos ⌊x2 − x + y⌋ = k , de modo que lim f (x, y) = k . (x,y)→(a,b) C2

Logo, não existe

lim

f (x, y) ̸=

(x,y)→(a,b) C1

lim (x,y)→(a,b)

f (x, y).

lim (x,y)→(a,b) C2

f (x, y), para todo k ∈ Z, de modo que

Portanto, f é contínua em R2 − {(x, y) ∈ R2 : x2 − x + y = k (k ∈ Z)}. Observamos (vide Observação 3 na Seção 4.1) que a não existência do limite é, por si só, condição suficiente para a descontinuidade. Sendo, de outro modo, a existência do limite apenas condição necessária para a continuidade, de que modo podemos torná-la também uma condição suficiente? A definição a seguir, na qual se fundamenta a terminologia estendível que mencionamos em i), fornece-nos a resposta precisa a essa pergunta.

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reais

Características:

2. Limites de funções reais de duas

Aplicação de conjuntos de nível para obtenção das imagens de algumas funções reais de duas variáveis reais.

3. Limites de funções reais de duas

Aplicação de conjuntos de nível para obtenção de máximos e mínimos de algumas funções reais de duas variáveis reais condicionadas a determinados subconjuntos dos seus domínios.

Tratamento extensivo de todas as expressões indeterminadas.

Apresentação de três estudos exaustivos de limites: limites iterados, análise geométrica do limite e limites infinitos.

Tratamento da continuidade de uma função real de duas variáveis reais, sob seus aspectos práticos.

Sugestões de projetos que desenvolvem um tópico específico em uma sequência de exercícios.

variáveis reais: noções gerais

variáveis reais: métodos de cálculo

4. Continuidade de funções reais de

duas variáveis reais: noções gerais

5. Continuidade de uma função real de duas variáveis reais: obtenção da extensão contínua

Referências bibliográficas Índice remissivo

FUNÇÕES REAIS DE DUAS VARIÁVEIS REAIS, LIMITES E CONTINUIDADE

1. Funções reais de duas variáveis

Este livro é destinado a estudantes de graduação em Matemática que necessitem se aprofundar em funções reais de duas variáveis reais, limites e continuidade, como preparação para a disciplina de Análise em ℝn.

NOVAES

CONTEÚDO

GILMAR PIRES NOVAES GILMAR PIRES NOVAES

FUNÇÕES REAIS DE DUAS VARIÁVEIS REAIS, LIMITES E CONTINUIDADE

Graduado em Matemática pela Universidade Federal de Viçosa (UFV). Mestre em Matemática pela Universidade de Brasília (UnB). Professor na Universidade Paulista (Unip; de 2001 a 2005); na UnB (de 2001 a 2002 e 2005); na Universidade do Planalto Catarinense (Uniplac; de 2003 a 2005) e na Faculdade Alvorada (de 2004 a 2005). Professor efetivo na Universidade Federal do Tocantins (UFT) no curso de Matemática (desde 2006) e no curso de Engenharia Civil (desde 2015). Professor do Programa de Mestrado Profissional em Matemática em Rede Nacional (ProfMat) (de 2012 a 2021), tendo orientado 15 alunos. Coordenador orientador do Programa de Iniciação Científica da Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (PIC/OBMEP, região Tocantins) desde 2016. Autor dos livros Introdução à teoria dos conjuntos (Editora da Sociedade Brasileira de Matemática – SBM); Funções reais de várias variáveis reais, limites e continuidade (Ciência Moderna). Autor de diversos artigos pela Revista do Professor de Matemática (RPM)-SBM. Revisor técnico do livro Lógica: cálculo sentencial, cálculo de predicados, cálculo com igualdade, de L. Hegenberg (Forense Universitária).



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