SARTRE E A FENOMENOLOGIA DO OPRESSOR
SARTRE AND THE PHENOMENOLOGY OF THE OPPRESSOR
Hamilton Cezar Gomes Gondim1
Resumo: No texto A violência revolucionária, Sartre traça um projeto de fazer uma
fenomenologia do senhor/opressor baseado nos eventos históricos da escravidão dos negros nos
Estados Unidos da Américas e na exploração do operariado europeu no período colonial e do
capitalismo industrial. Este texto inacabado e publicado como o apêndice II dos Cadernos para
uma moral (1983) apresenta a análise parcialmente histórica da situação de opressão do homem
negro escravizado nos E.U.A e um esboço da situação operária europeia para fins de comparação
a partir de categorias filosóficas. Pretendemos neste artigo abordar e aprofundar a perspectiva
inacabada sartriana de uma fenomenologia do opressor utilizando o seu levantamento feito acerca
da situação escravagista norte-americana e operária em conjunção à ontologia fenomenológica
encontradas em O ser e o Nada (1943) e nos Cadernos para uma moral. Acreditamos que para
constituirmos esta fenomenologia do opressor as condutas de má-fé, a noção de violência e
legalidade são fundamentais, além de uma perspectiva histórica ainda insurgente nas reflexões de
Sartre durante o período de escrita dessas duas obras fundamentais na década de quarenta.
Palavra-chave: Opressor. Fenomenologia. História.
Abstract: In the text entitled La violence révolutionaire, Sartre outlines a project of making a
master/oppressor phenomenology based on the historical events of black slavery in the United
States of America and the exploitation of the European working class in the colonial period and
industrial capitalism. This unfinished and published text as Appendix II of Cahiers pour une
morale (1983) presents the partially historical analysis of the situation of oppression of the
enslaved black man in the U.S.A. and a sketch of the European working situation for purposes of
departing from philosophical categories. In this article we intend to approach and deepen the
unfinished Sartrian perspective of a phenomenology of oppressor using his survey of the North
American working class and slave situation in conjunction with the categories of the
phenomenological ontology found in The Being and the Nothing (1943) and in the Cahiers pour
une morale. We believe that in order to constitute this phenomenology of the oppressor, the
conduct of bad faith, the notion of violence and legality are fundamental, in addition to a historical
perspective still insurgent in Sartre's reflections during the period of writing of these two
fundamental works in the forties.
Keywords: Opressor. Phenomenology. History.
1. Introdução
Pretendemos tratar da questão da opressão baseada numa discussão
contextualizada dos escritos póstumos sartrianos, intitulado A violência revolucionária
no Apêndice II dos Cadernos para uma moral (1983). A responsável legal da obra
1
Doutorando em Filosofia na Universidade de Goiás – UFG. Bolsista Capes. E-mail: hamiltonczar@gmail.com. ORCID:000-0001-6675-8410
Sartre e a fenomenologia do opressor
sartriana, Elkaim-Sartre (1983) em uma nota de apresentação acerca do texto não precisa
o ano em que este segundo apêndice foi escrito, mas acredita que tal apêndice seria
posteriormente aglutinado adequadamente ao corpo do texto dos Cadernos para uma
Moral, escrito entre 1947 e 1948.
Circunscrevemos como obras principais para complementar o apêndice o próprio
Cadernos para uma moral e o Ser e o Nada (1943) pois, ainda que haja elementos
importantes em outras obras, existe uma unidade entre O ser e o nada e os Cadernos,
além de serem obras vinculadas ao período de escrita do artigo inacabado de Sartre.
Conforme a reconstituição historiográfica de Almeida (2018), Sartre apresenta
contato e interesse na questão negra norte americana por volta de 1945 quando viajou aos
Estados Unidos da América e é incumbido de escrever para uma série de jornais como o
Le figaro e Combat. Já a questão operária faz parte de uma discussão europeia que advém
desde a revolução industrial e ao qual Sartre tem interesse a partir de suas leituras do
marxismo, particularmente num momento em que começa a refletir mais sobre a questão
da história nas suas teorizações.
Em sua análise sobre a opressão ocorrida no período escravocrata nos Estados
unidos da América se pretendia, entre outros aspectos, constituir uma ponte entre a
situação do escravo e do proletariado na sua relação de opressão. O ponto de análise
sartriana que unificaria tal projeto estaria numa constituição de uma “fenomenologia do
opressor” (SARTRE, 1983, p.579, tradução nossa), havendo o exame da opressão a partir
de uma reconstituição da vivência do opressor nestas duas situações históricas. Por ser
um texto incompleto, Sartre explora mais o exemplo da opressão dos Estados Unidos da
América e revela uma história da má-fé no período escravagista. Sartre desnaturaliza a
história para que compreendamos a postura de má-fé de uma época e, assim, avaliemos
como foi viável uma certa visada do opressor.
Sem dúvida há distinções entre a estrutura ontológica do Para-si e aspectos como
o local, nacionalidade, pertencimento de classe, isto é, o contexto histórico-social ao qual
se está inserido. Mas fazer uma fenomenologia do opressor, considerando um dado
contexto não vai de encontro ao pensamento ontológico sartriano. Tais elementos sociais
e históricos envolvem a apreensão do mundo e da situação do Para-si, ainda que haja uma
permanência de suas distinções ontológicas: “Não somente estou arremessado frente ao
existente em bruto: estou jogado em um mundo operário, francês, lorenense ou sulista,
que me oferece sua significação sem que eu nada tenha feito para descobri-los”
(SARTRE, 2007, p.631). Uma fenomenologia do opressor, se é possível, precisa ser
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expressa em situação para analisar seus traços comuns advindos de uma explicação
ontológica, bem como suas peculiaridades históricas específicas. Neste sentido o trabalho
da ontologia, embora autônomo, pode ser o esteio para compreensão da dimensão
histórica, social e psicológica de indivíduos e grupos na medida em que remetem sempre
a uma realidade de um Para-si situado.
Sartre compreende o opressor como aquele que está numa situação de má-fé para
permanecer na situação de domínio frente ao outro. A má-fé é descrita por Sartre em O
Ser e o Nada como uma forma de inversão, oscilação ou identidade entre dois aspectos
inerentes da condição humana que são a transcendência e a facticidade. A transcendência
se remete ao caráter do Para-si como um ser que é constantemente remetido as suas
possibilidades frente a situação e engajado em um projeto. A facticidade se caracteriza
como o background ao qual o Para-si precisa ser para exercer sua liberdade e ao qual não
pode se eximir, tal qual como o seu corpo e o seu passado. A oscilação, inversão ou
alternância do caráter de transcendência e facticidade constitui a má-fé. Utiliza-se este
caráter duplo na má-fé para a evasão da situação e da responsabilidade, embora o próprio
Para-si compreenda que está num movimento de fuga e evasão. Sartre propõe que,
entretanto, a má-fé do opressor apresenta toda a complexidade de um aparato social que
o legitima, o que torna mais dificultoso trazer a luz ao oprimido acerca da sua própria
situação e relegando para o opressor uma situação em que se eludir da livre decisão de
explorar o Outro aparece como um estado de normalidade. A despeito de todo este
aparato, Sartre insiste que o opressor entende a sua posição, embora se evada dela: “No
entanto, ao mesmo tempo em que ele encontra uma filosofia, uma lógica, uma religião,
uma sociologia e uma política, o opressor não pode negar dentro de si que é um opressor”
(SARTRE, 1983, p.594, tradução nossa).
Cogitar que o opressor assuma sua liberdade e responsabilidade por seus atos, ao
qual Sartre liga a postura denominada de autenticidade, é impossível se nos remetermos
a consequência de tal postura autêntica frente ao relacionamento com o Outro
desenvolvido nos Cadernos para uma Moral. Nos Cadernos para um moral é exposto a
impossibilidade de ser autêntico sozinho e uma proposta colaborativa junto a alteridade2.
Sem dúvida, ser autêntico tem ainda a dimensão individual ao escolher a liberdade como
fonte de valor (coincidente com sua própria condição humana livre). Mas para que o
2
Em O Ser e o Nada as relações de alteridade são marcadas pelo domínio e conflito. Embora exista uma
complementariedade entre O Ser e o Nada e os Cadernos para uma moral, Sartre pensa uma nova forma
de lidar com a alteridade nos Cadernos marcada pela colaboração entre projetos.
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homem seja autêntico concretamente é necessário que haja também uma relação que
reconhece mutuamente os demais como livres, criando um circuito e uma sociedade que
evita a má-fé e formas desnecessárias de alienação3. Este não é o caso do escravocrata,
que se evade da evidência que mostra o escravo como outro ser livre, nem do
capitalista/burguês, que age tal qual como se estivesse numa falsa condição de igualdade
com o operário. Senhor de escravos e capitalista, são nesse caso, exemplares de
opressores e o fio condutor para evidenciar tal fenomenologia.
2. O olhar do opressor no período escravocrata
Para entendermos a visada do opressor no período escravocrata precisamos
compreender a situação da escravidão para o senhor de escravos, isto é, uma compreensão
histórica da situação. A compreensão de mundo do senhor de escravo aparece a partir de
duas instâncias: a de um discurso natural e um discurso legal instituído pela pátria ou da
metrópole em relação à colônia. Neste quadro a opressão aparece na exploração do
homem pelo homem ao qual priva a liberdade por um aparato jurídico. O opressor assume
a escravidão pela legalização que gera uma boa consciência (imaculada) e que é
legitimada pelo respeito à lei do Estado. Assim o escravocrata assume irrefletidamente o
direito de possuir escravos “Não tem necessidade de decidir simplesmente a favor ou
contra a escravidão, mas contra a lei” (SARTRE, 1983, p.580, tradução nossa). A lei
visada pelo escravocrata legitima a escravidão e ir contra a escravidão é ir contra a lei.
Sartre também considera que o escravocrata percebe a lei sobre a ótica do que é chamado
em O Ser e o Nada de espírito de seriedade. O espírito de seriedade é, grosso modo, a
postura de que o homem não se reconhece como livre criador ou fonte de valores, mas
age como se o mundo, as ações e as coisas tivessem um valor intrínseco exterior ao
homem. No caso, o opressor age como um espírito sério que coloca a lei tal qual um valor
preestabelecido e que refletir sobre a validade da escravidão seria equivalente a questionar
a lei. Questionar a lei seria entrar em especulações sobre se há uma “lei do coração” 4 e
3
Como expõe Sartre (1995) em Questão judaica (1946) autenticidade em termos mais políticos pode ser
definido tomar consciência lúcida e verídica da situação, assumir as responsabilidades e os riscos que uma
dada situação implica. Uma análise clara e lúcida da situação não se evade da dimensão da alteridade ao
qual é abordada de modo cooperativo nos Cadernos para uma moral.
4
A referência sartriana a essa teoria é da lei do coração encontrada em Hegel na Fenomenologia do Espírito
(1807) no capítulo V, “Certeza e Verdade da Razão”. Hegel explicita nessa figura do espírito a ideia
romântica de que há uma dimensão universal, interiorizada, coincidente da lei na consciência singular. A
lei do coração coloca o seu interesse e desejo como se fosse de todos e manifestação de todos (tal qual fosse
o bem comum). Hegel critica essa ideia visto haver um descompasso entre a lei do mundo social e as
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se esta é manifestada nas leis escritas ou se as leis são convenções. Essas questões são,
entretanto, evitadas pela boa consciência do senhor. O escravocrata tende a colocar o
respeito às leis e suas prescrições diversas (como matrimônio e deveres cívicos) em
conjunto à lei de possuir escravos. Questionar a lei dos escravos é questionar as demais
leis e suas origens.
Mas este seria o único modo de legitimar a visão do senhor sobre o seu escravo?
Por qual motivo e meio a opressão escravocrata mascara o seu caráter além da legalidade?
Justificativas históricas e ideológicas se multiplicam, embora Sartre exponha de modo
mais sistemático quatro. Sartre enumera entre elas (1) que os negros vendiam outros
negros aos navios negreiros o que isentaria a responsabilidade do homem branco. É uma
argumentação de má-fé baseada na conduta do outro, para legitimar a própria conduta,
como se a prática e oferta comercial por homens negros legitimasse a livre compra e
escravização deliberada dos latifundiários norte-americanos. (2) Os negros não eram
cristãos porque não teriam alma e não poderia se cristianizar o escravizado, pois haveria
maior proximidade deste com um animal do que com um homem. A recusa de cristianizar
os escravos advém de que, se eles têm alma, estes poderiam ser convertidos e, assim,
sujeitos ao questionamento se não deveriam ser libertos. Apenas no século XVIII é
possível ser ao mesmo tempo escravo e cristão após os pastores e padres conseguirem
conciliar a escravidão e o cristianismo ideologicamente. A figura de Noé a amaldiçoar
descendência de Cam, que apresentavam pele escura no velho testamento, é um exemplo
de legitimação da escravidão. Sartre acredita que essa mudança ocorrida entre o período
colonial e de independência estadunidense mostra um exemplo claro de má-fé. Isto
porque antes da conciliação ideológica da bíblia, o escravo era um ser sem alma e, por
não terem alma, podiam ser cativos. Depois o negro passou a ter alma, mas a religião
legitimava a escravidão. A má-fé do opressor está em tentar encontrar um discurso que
permita uma prática efetiva que não quer se evidenciar: que o opressor apenas quer
explorar o oprimido, sendo a escusa discursiva pouco relevante. (3) Os negros teriam
estado mental extremamente baixo, isto é, seriam sociedades primitivas ou subhomens e
fora da sua situação de escravos valeriam ainda menos para a sociedade. A má-fé aparece
numa perspectiva do opressor em menosprezar completamente o modo de vida
sociopolítico africano que é distinto da forma europeia e associá-la a uma suposta a
incapacidade do negro. A contradição sobre tal incapacidade aparece mais claramente
demandas individuais, havendo uma “presunção” na lei do coração e da consciência singular em relação a
sociedade.
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com o fato de que era proibido instruir os escravos, incluso o processo básico de
alfabetização. Mas se são incapazes, por qual motivo o impedimento e proibição? O
opressor impede assim que o negro aprenda para que se mantenha a situação de opressão
sem críticas pela parte explorada. (4) Os negros eram vítimas da própria violência, logo
os negros seriam escravizados por outros negros. Se os escravizados não tivessem sido
comprados das tribos vencedoras teriam sido mortos por serem de uma tribo perdedora.
Nesse caso um dos discursos é que mais vale escravo entre homens brancos do que mortos
ou entre negros também escravocratas. Ser tutelado supostamente por homens melhores,
isto é, os brancos, esconde a má-fé na necessidade de mão de obra nas grandes plantações
sob a escusa de salvá-los da morte.
A forma de má-fé do opressor escravocrata se modifica com a história e entre
gerações. Os escravos que não eram nascidos das Américas, mas trazidos da África
apresentaram resistência ou inadequação ao modo de trabalho submetido, o que mostrava
ao proprietário e traficantes de escravo a violência necessária em relação à subjugação do
escravo. Mas o senhor de escravo de terceira ou quarta geração não têm lembranças
penosas da violência, pois após 1808 houve a proibição do tráfico negreiro e todos os
escravos são nascidos escravos. Assim, o jovem senhor de escravos é parcialmente alheio
a violência que institucionalizou a escravidão:
O escravo é nascido como propriedade do Branco e o direito de possuílo não é reconhecido somente pela lei, ele é um direito secundário ao
direito de propriedade que todo mundo aceita na época. Nascido de
escravos, eles mesmos filhos de escravo, ele é nascido para a escravidão
(SARTRE, 1983, p.582, tradução nossa).
O sulista em 1808 nasce num mundo em que o branco é superior e são qualidades
naturalizadas. O projeto da região Norte abolicionista aparece abstrato frente a vivência
concreta pelo homem branco acerca do negro no sul estadunidense. O caráter natural e a
legalidade se misturam, e o opressor jovem se vê legitimado por essas duas instâncias de
naturalização e vivência sem compreensão histórica:
Assim a opressão não se descobre ao opressor. Ela é mascarada. E não
considera com cinismo como um estado de fato, mas fato e direito são
inextricavelmente misturados. A opressão é na natureza porque é um
fato natural que o negro é inferior ao branco. Ela é de direito divino
porque a natureza num mundo criado é organizado segundo a vontade
de Deus (SARTRE, 1983, p.589, tradução nossa).
Há então a inversão “ingênua” do jovem senhor escravagista quanto ao que
concerne a algumas explicações do modo de ser do homem negro que tem motivos
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diretamente históricos. Um exemplo citado por Sartre (1983) é a questão do relaxamento
das relações familiares dos negros escravizados. Tal relaxamento ocorria devido à venda
dos filhos e esposas pelo escravagista. Não é possível ao escravizado constituir relações
familiares duradouras sobre a constante iminência de ser vendido e distanciado dos seus
parentes. Mas o escravagista justifica o procedimento de comércio de separação da
família do escravo ao naturalizar a indiferença do negro com a família como uma
característica inata. Não se percebe que essa indiferença é gerada pela história anterior
não vivida pelo jovem senhor.
Entretanto, não deixam de haver atitudes de má-fé do jovem opressor, pois há
sinais que impedem que a visão naturalizada e harmônica do mestre seja adequada. Entre
elas estão os caprichos do mestre em face ao escravo doméstico. O escravo negro é um
prolongamento do mestre e os caprichos do mestre quanto ao escravo doméstico aparece
para que este seja espelho e confirme as qualidades do mestre “O mestre tagarela/falante
e o escravo, que não tem opinião pessoal, se limita a refletir sua tagarelice na dimensão
do objetivo pelo intermédio do escravo. [...] o mestre recupera seu Ser-para-outro”
(SARTRE, 1983, p.585, tradução nossa). Assim, certos tratos humanos aos escravos
negros ocorrem pelo mestre e há um reconhecimento de uma dimensão de alteridade,
embora não numa relação recíproca. A má-fé do opressor cria a possibilidade latente de
uma moral para alguns negros, uma vez que há cuidado com o negro doméstico que
reconhece o mestre e o auxilia a constituir sua imagem. Essa relação e cuidado, entretanto
mostra sua má-fé por ser observada basicamente no escravo doméstico, uma realidade
distinta do escravo de plantação, explorado e objetificado ao limite para fins produtivos
numa situação pior que o proletariado. O cuidado é selecionado a alguns e a revelia.
Assim a despeito dos caprichos do senhor, se reconhece estritamente do escravo,
as qualidades de uma posição fundamental em relação ao escravocrata: "a perfeição moral
do escravo é seu devotamento e obediência” (SARTRE, 1983, p.584, tradução nossa). A
existência do homem negro e seus comportamentos são circunscritos e legitimados pela
sua função social de escravo. Existir escravo é basicamente ser-para-Outro, tornando uma
existência sem sentido se não houver aquele a qual se deve obedecer:
[...] dito de outro modo, o escravo está em posição de justificar a sua
existência pela existência de um outro. Esta justificação é vã, muito
aparentemente, no mundo democrático porque é necessário ainda que
eu decida que o outro valha mais do que eu. Ela é, ao contrário,
aparentemente verdadeira no mundo do escravo a quem o ensinaram
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que Deus criou duas raças, uma para servir a outra. (SARTRE, 1983,
p.586, tradução nossa).
Outra reação de má-fé que ocorre a todos senhores de escravo, ainda que de
terceira ou quarta geração, são as revoltas escravas que são interpretadas como supostas
aberrações ou fenômenos esporádicos. Tais revoltas deveriam evidenciar o quão
inadequada é a ideia de que o negro é dócil e feliz naturalmente enquanto escravo. Mas,
a má-fé do jovem opressor verá tal anomalia fruto de má domesticação e que vai de
encontro à hierarquia natural e legal da realidade. A má-fé chega ao ponto máximo em
que o caráter livre do Outro num acontecimento social (a revolta de um grupo) é visto
como uma exceção dentro da realidade ordenada.
Embora essa descrição de formas de má-fé do opressor no período escravocrata
revele algumas posturas de fuga e evasão a partir da dimensão natural e legal vigente,
outras formas de má-fé surgem frente às mudanças das formas de trabalho e modificação
do campo histórico-social. Com a abolição da escravidão, não desaparece o opressor, mas
apenas desaparecem certos modos de má-fé em relação a situação do oprimido. A relação
entre legalidade é transformada e a perspectiva de uma hierarquia natural é substituída
parcialmente por uma forma de má-fé em que a igualdade é usada para eludir a forma de
opressão entre opressor e oprimido.
3. O olhar do opressor na situação operária5
A situação do operariado quanto ao opressor, é “para-institucional” (SARTRE,
1983, p.579, tradução nossa). Isto é, a opressão ocorre, mas não é deliberadamente
defendida por meios legais, nem garantida.
Além disso, existem aspectos distintos entre o burguês/capitalista e o escravocrata.
Uma das principais características do burguês, segundo Sartre além do seu poder
econômico e político é que este não se reconhece como pertencente a uma classe6. Isso o
5
Como observamos anteriormente, Sartre não chega a terminar paralelo da escravidão com a situação de
opressão do operariado, mas podemos encontrar no próprio O Ser e o Nada elementos que contribuem para
preencher essa lacuna quando Sartre traz exemplos em tal obra de ontologia sobre aspectos de conjuntura
histórica, particularmente sobre o operário, ainda que para outros fins. Boa parte das passagens a qual
recolhemos remete-se à discussão que mostra a distinção entre suas noções de nós-objeto (uma dimensão
ontológica e real) e de nós-sujeito, que é só uma experiência psicológica. Acreditamos que, entretanto, tais
passagens e exemplos nos revelam de forma colateral reflexões acerca do modo de vida do burguês e sua
opressão constitutiva.
6
“O "burguês" não se define somente como um certo homo oeconomicus dispondo de poder e privilégio
precisos no âmago de uma sociedade de certo tipo: descreve-se a partir de seu interior como uma
consciência que não reconhece seu pertencer a uma classe” (SARTRE, 2007, p.530).
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diferencia do senhor de escravo, que se percebe ao menos como pertencente ao grupo de
homens brancos. O burguês utiliza uma forma distinta de evasão no que concerne a
opressão, na medida em que não se quer se ver distinto do operário. Seu discurso frisa a
ausência de classes e que a injustiça e desigualdade não são sistêmicas, mas acidental e
contornável:
O "burguês" geralmente nega a existência de classes, atribui a
existência de um proletariado à ação de agitadores, a incidentes
lamentáveis, a injustiças aptas a serem reparadas por medidas de
detalhe; afirma a existência de uma solidariedade de interesses entre o
capital e o trabalho; opõe à solidariedade de classe uma solidariedade
mais vasta, a solidariedade nacional em que o operário e o patrão
integram-se em um Mitsein que suprime o conflito (SARTRE, 2007, p.
530).
Um dos argumentos quanto ao opressor na relação entre o capitalista e o operário
é o de supostos interesse comum. Se o operário no capitalismo industrial admite que o
modelo de trabalho em que cede nove décimos do trabalho ao patrão é o justo, poder-seia dizer que há interesses comuns. Se nos remetemos também ao caso do escravo e
pressupomos que há uma hierarquia natural entre brancos e negros, também se poderia
dizer que há interesses comuns. A má-fé de ambos os exemplos se encontra na
ambiguidade do interesse comum e de mascarar a relação de benefício vinculado a alguém
que explora o outro. A visada do opressor sobre a realidade frisa uma suposta
solidariedade e cooperação entre as partes para fugir da própria responsabilidade de
contribuir para um modelo social baseado em interesses estritos de certos grupos e
classes: “[…] o burguês se faz burguês negando que existam classes, assim como o
operário se faz operário afirmando o contrário e realizando-se “ser-na-classe” por sua
atividade revolucionária” (SARTRE, 2007, p.651).
Sartre coloca ainda que não há uma visada do próprio burguês como sendo parte
da comunidade dos opressores em tempos que não são de revolta dos operários. Embora
o patrão possa ver uma relação instrumental dos operários na sua fábrica, isto é, vê-los
como um utensílio, este pode ver a si mesmo como indivíduo neutro ou imparcial em
relação a eles. O capitalista observa o conjunto dos operários como “ele-sujeitos”
(SARTRE, 2007, p.530) como indivíduos, não uma comunidade oprimida que teria como
correlato oposto os capitalistas como opressores, ou ainda, o capitalista autoavaliando
como se constituindo dentro de tal grupo de opressores. O burguês apenas se vê como
pertencendo a um grupo ou um “nós”, isto é, enquanto classe opressora, quando é
ameaçado e é visto pelos operários como sendo parte de tal comunidade:
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Sartre e a fenomenologia do opressor
É somente quando a classe oprimida, pela rebelião ou o brusco aumento
de seus poderes, coloca-se frente aos membros da classe opressora
como "se-olhar" que os opressores experimentam-se como nós. Mas
isso ocorrerá no temor e na vergonha, e como um nós-objeto (SARTRE,
2007, p.531).
Nesta situação é difícil manter a tese inicial do burguês de que não há classes, na
medida em que o operariado o visa como parte de um “nós” ou grupo que obriga o próprio
burguês agir de forma cindida e contra aqueles que o visam como opressor a si e os demais
em condições semelhantes. Podemos especular que, assim como o jovem senhor
escravocrata de terceira e quarta geração é alienado em relação a história da violência, é
possível que o herdeiro do capitalista, ao qual não viu situações anteriores de revolta do
operariado, seja alheio às disparidades de condições fabris de um empregado. Mas, o
jovem burguês ao se captar numa situação de perigo ou revolta dos seus empregados não
pode deixar de se eximir doravante da má-fé da situação de se negar enquanto de classes
distintas.
4. Fenomenologia do Opressor
Observado esses exemplos históricos de opressão, podemos partir para elementos
mais teóricos e que se abstraem a partir destes casos. Se há uma fenomenologia do
opressor no Sartre da década de quarenta , esta se caracteriza por três aspectos comuns a
todo opressor e sua visada: (1) O opressor visa o outro em má-fé, (2) o opressor busca
uma legalidade e (3) se utiliza de processos violentos para se manter opressor. Além disto,
Sartre nos Cadernos para uma moral define de modo mais geral quando há opressão ou
clima de opressão:
Há um clima de opressão quando minha subjetividade livre se dá como
inessencial, minha liberdade como um epifenômeno, minha iniciativa
como subordinada e secundária quando minha atividade é dirigida pelo
Outro e toma o Outro por fim” (SARTRE, 1983, p.380, tradução nossa).
A visada do opressor observa a liberdade alheia como inferior, subordinada e a
oprime. O opressor desconsidera a liberdade do Outro fundamentalmente e o reduz a sua
facticidade aproximando-o de um objeto. É o caso histórico do escravo que apresenta uma
essência de escravo e um lugar natural e fixo, negligenciando sua liberdade. Ou, em outra
oscilação de má-fé, assume abstratamente a transcendência do Outro para negligenciar a
facticidade. Temos neste segundo caso exemplificado historicamente o patrão sobre o
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Sartre e a fenomenologia do opressor
operariado, no qual a facticidade do corpo do operário (isto é a fome, a sede, o frio) o
impele a oferecer sua força de trabalho, e o opressor (patrão) age tal como se o seu
empregado tivesse em igualdade de condições para recusar o salário precário ofertado,
desconsiderando as demandas fisiológicas imediatas do assalariado.
A oscilação entre dois extremos, hiperbolizando o campo da facticidade ou da
transcendência em relação a como se vê o outro oprimido é um dos modos efetivos de
opressão. Entretanto a má-fé do opressor não se circunscreve aos extremos, mas pode
haver intercâmbio destes dois aspectos ontológicos, sendo um modo do Para-si visar o
outro de maneira inventiva para se evadir da condição humana alheia expressa em
situação. A única visada vedada a condição do opressor é a que considera adequadamente
a duplicidade do oprimido, isto é, enquanto um ser igualmente livre e dotado de projetos
próprios, mas que ao mesmo tempo circunscrito a sua facticidade. Se o opressor tenta de
modo autêntico visar o outro sem se evadir do que olha, isto é, de um Outro ser livre
situado, haveria uma dificuldade em manter o modo de opressão e má-fé, pois visar a
situação, coloca em risco a sua posição também fixada/acomodada de dominação. No
caso do senhor de escravo tal lugar fixo é o de lugar superior do branco, no caso do patrão
a posição igualitária diferenciada “apenas” por ser detentor dos meios de produção.
Não é impossível, porém, que o opressor abdique da sua própria posição de
opressor. Entretanto, uma automática mudança de um processo de opressor para
emancipador com uma visada autêntica frente ao oprimido é improvável. Isto porque o
opressor já está em evasão de uma compreensão da situação e de escolhas ao qual se quer
evitar tematizar sobre a visada do oprimido. Um modo autêntico de visar a situação e o
outro exigiria um abandono reiterado da posição de opressor e busca por um reino da
liberdade7 em que há cooperação mútua entre projetos. Esperar tal gesto de boa vontade
pelo opressor é problemático porque o opressor está inserido num modo de vida que é
legitimado de modo institucional e para-institucional, numa (2) legalidade da opressão .
A má-fé do opressor é mantida a partir de uma (2) legalidade da violência.
Legalidade significa uma manutenção de um certo mundo e seus modos de interação.
Assim, a opressão e a legalidade se interconectam, pois a legalidade dá legitimidade de
um grupo sobre outro. No campo jurídico específico Sartre trata o assunto do direito com
7
Nos Cadernos para uma moral frente a realidade opressiva do capitalismo, ao qual envolve o operariado
europeu, Sartre se refere a um reino dos fins como uma sociedade sem classes. Podemos dizer que esta
noção de uma sociedade livre, tem seus desafios históricos a cada época de modo que numa situação
escravocrata abolição da opressão se instaura com o movimento abolicionista, assim como numa sociedade
opressora através de classes finda com o processo de extinção das classes.
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ambiguidade, como expõe Almeida: “Observa-se que o uso da palavra direito (droit) tem
certa flutuação, ora como sinônimo de legalidade (legalité), ora como sinônimo de certa
exigência no plano ético-político” (ALMEIDA, 2011, p.146). Isto porque o direito
aparece por vezes nos Cadernos para uma moral como um sinônimo de manutenção do
status quo do opressor, embora também como um sinônimo de direito em porvir dos
oprimidos, ainda não estatuído. Como o nosso trabalho explora a visada do opressor
ficaremos com a primeira perspectiva de manutenção da opressão através da lei. Nos
Cadernos para uma moral Sartre explicita que a legalidade enquanto direito jurídico tem
uma origem que se remete à força e que os opressores utilizaram para assegurar seus
privilégios. Há após uso dessa força a busca por uma justificação discursiva da força
usada pelos vencedores sobre os vencidos; “[...] o direito é a exigência do mais forte de
ser tratado por aquele que lhe serve como uma pessoa” (SARTRE, 1983, p.150, tradução
nossa). Tal necessidade do opressor aparecer como uma pessoa, isto é, como um mero
cidadão despojado da sua característica fundamental de opressor/vencedor, é necessária
para manter a situação desigual de modo institucional. O direito gera aparência necessária
de justificação, na medida que o mero uso da força é ineficaz para a manutenção longeva
da dominação: “o direito é sempre a partir de um status quo que se engaja a não mudar”
(SARTRE, 1983, p.150, tradução nossa). Há na legalidade supostamente o englobamento
e consideração das liberdades e projetos diversos através da lei, mas na prática utiliza os
oprimidos como objetos ou instrumentos dos opressores concretamente. Neste caso o
opressor não reconhece a liberdade concreta alheia, mas abstrata, criando um direito que
cria a aparência de efetivação da justiça. A solução de Sartre para mudar tal situação seria
que o oprimido usasse de uma violência contra o opressor, mas esta é recusada pelo direito
estatuído pelo opressor. Desse modo temos tipificado a estratégia do opressor:
Assim o direito é a recusa absoluta da violência que pode servir apenas
ao opressor porque a violência da qual o direito saiu é anterior ao
estabelecimento do direito e porque a desigualdade concreta é
inteiramente fora da esfera jurídica (SARTRE, 1983, p.150, tradução
nossa).
Assim, outro aspecto do opressor que transparece nos Cadernos para uma moral
e nos respectivos casos históricos analisados é o uso de (3) violência por parte do
opressor, reverberada no direito instituído. Como propõe Santoni “O corpo dos Cadernos
[para uma moral] confirma a opressão como uma forma de violência” (SANTONI, 2003,
p.29, tradução nossa). A compreensão de violência por Sartre é ampla e não se reduz ao
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aspecto físico, nem se circunscreve apenas a um âmbito moral, mas também político. Nos
Cadernos para uma moral Sartre diferencia basicamente três tipos de violência: a
violência ofensiva, defensiva e a contraviolência8. A violência ofensiva trata-se do uso da
violência no sentido de destruição ou decomposição do objeto ou do outro enquanto um
projeto deliberado. A violência defensiva faz o recurso eventual do uso da violência em
meio a processos não violentos e a contraviolência é uma resposta a uma violência
anterior infligida. Quanto a diferença entre violência defensiva e contraviolência, Sartre
melhor explicita:
Isto que eu nomeio violência defensiva se distingue da contraviolência,
nisto que [a contraviolência] é uma resposta a uma agressão ou esforço
para remover um jugo mantido pela força (Estado), enquanto que a
violẽncia defensiva é o recurso à violência contra os processos não
violentos (SARTRE, 1983, p.216, tradução nossa).
O opressor enquanto tal se utiliza de uma violência ofensiva ou defensiva, na
medida que já tem um projeto deliberado de violência no tratamento com o outro ou
utiliza de violência esporádica em situações não violentas de interação. Já a
contraviolência é uma violência que serve para instaurar o fim da opressão sobre uma
liberdade, sendo o instrumento de emancipação do oprimido sobre o Estado ou grupos
opressores que o violentam previamente. A instauração legitimada do colonizador de uma
escravidão num novo continente, onde este tipo de relação é quase inexistente, instaura
uma violência ofensiva sistêmica e que instrumentaliza o outro, por conseguinte, uma
opressão. Do mesmo modo, a instauração de um processo de herança e concentração de
meios de produção também constituem um processo violento de alienação do trabalhador
como instrumento de produção de mercadorias, embora legitimado novamente pela
legalidade do direito. Estes mecanismos legais, como trata Eshleman(2015), frisam o
caráter de violência estrutural que normalizam um nível de violência a ponto de não ser
questionado por aqueles que padecem de tal violência:“[é] pela violência estrutural, o tipo
de violência que não apenas tira sangue e esmaga ossos, mas também mata crianças e
subjuga as pessoas através da pobreza profunda e da servidão por dívidas” (ESHLEMAN,
2015, p.64, tradução nossa). A legalidade do opressor vem anterior a ele, através de dado
momento histórico violento prévio, mas é decidida pelo opressor perpetuá-la, como no
caso do jovem senhor de escravo ou do filho do capitalista.
8
“Um tratado da violência deveria comportar três descrições: 1 ° violência ofensiva. 2° violência defensiva
(enquanto defesa violenta contra a não violência); 3° contraviolência” (SARTRE, 1983,p.216, tradução
nossa).
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Visto estes três aspectos que caracterizam o modo ordinário de efetivar a opressão,
passaremos brevemente a algumas ambiguidades sobre a opressão e que denotam alguns
limites na perspectiva de visada do opressor dada por Sartre.
5. Ambiguidades na fenomenologia do opressor
Na teoria sartriana, existem ainda algumas ambiguidades nesta relação entre
opressor e oprimido que são difíceis de se resolver no interior dos textos da década de
quarenta. A relação de colaboração dos oprimidos não é explorada plenamente em Sartre
nos Cadernos, mas tal problemática é melhor sintetizada por Beauvoir9: “Mas o opressor
não seria tão forte se não tivesse cúmplices entre os próprios oprimidos” (BEAUVOIR,
1970, p.83). O oprimido de fato se liga às ideias e noções de mundo legalizadas e
naturalizadas pelo opressor, mas não é ou se torna o opressor. Nos exemplos históricos
citados o escravo não se torna senhor de escravos, e o assalariado em condições precárias
raramente se torna patrão, mas ainda assim apoiam a estrutura de opressão ao qual são
submetidos. Esta relação de submissão passiva a tal sociedade opressora e, por vezes, de
desejo ou identificação em ser capitalista ou senhor de escravos, isto é, desejar ser o
opressor, é uma relação que há entre alguns oprimidos que adotam a legalidade instituída
pelo opressor, sem questioná-la. Tal legalidade assegura e faz parte do discurso dos
grupos dominantes sobre os dominados para a manutenção de aceitação de sua
exploração. Tal discurso auxilia a criação de uma ilusão ou ocultamento de relações
históricas de opressão para os oprimidos, o que se assemelha, grosso modo, ao conceito
de ideologia marxiana e os seus efeitos quanto à classe operária.
Uma outra questão não explorada em Sartre é quando as relações apresentam
diversas instâncias de opressão que se interpenetram. O mesmo indivíduo vive situações
onde pode ser opressor e oprimido ou ainda quando se padece uma pluralidade de
opressões diversas. Podemos pensar, por exemplo, um operário que é oprimido por seu
patrão, mas que oprime sua esposa em casa, denotando uma dimensão de opressão entre
gêneros. Não seria de uma só vez este indivíduo (empregado e marido) opressor e
oprimido? Não há entrecruzamento entre diversos tipos de opressão que tomam a
liberdade alheia como subordinada? Este não é um problema explícito em Sartre em sua
investigação sobre opressão. Sem dúvida os Cadernos para uma moral têm uma
9
Não indiciamos aqui uma identidade entre o pensamento de Sartre e Beauvoir, mas a utilizamos pela
reflexão que complementa e traz contribuições no que concerne a temática intrínseca da opressão.
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preocupação maior da opressão em termos de diferença de classes. Isso não significa que
Sartre seja negligente às questões de opressão relativa ao racismo ao conhecer e trabalhar
a história norte-americana da escravidão, tratar sobre o antissemitismo, além da situação
do homem negro nas colônias francesas em outros textos. Seu conhecimento sobre o
racismo e suas visões ficam evidentes em outro texto da década de 40, como Orfeu Negro,
de 1948, uma obra que versa sobre a questão da negritude, poesia e colonialismo. Neste
texto, por exemplo, Sartre faz um paralelo e ligação entre o proletariado e o homem negro:
[o homem negro] não aspira de modo algum a dominar o mundo: quer
a abolição dos privilégios étnicos, venham de onde vierem; afirma sua
solidariedade com os oprimidos de todas as cores. De pronto, a noção
subjetiva, existencial, étnica de negritude “passa” como diz Hegel,
àquela – objetiva positiva exata – de proletariado (SARTRE, 1968,
p.122).
O proletariado seria aquele grupo mais universal justamente porque é despojado
de todos os privilégios e particularidades de classe, sua característica é padecer de todo
os males do sistema exploratório do capitalismo. Sua exploração é a base para a
manutenção de uma sociedade cindida entre classes. Neste caso, a emancipação do
proletariado implicaria no surgimento de uma sociedade sem classes. De modo análogo,
os homens negros escravizados e seus descendentes, que sofreram a forma mais violenta
de racismo oriundo da escravidão e do colonialismo, seriam parte do grupo que mais
amplamente tem possibilidade de promover uma sociedade sem discriminação racial. A
afirmação da negritude aparece em Sartre como um momento dialético frente ao homem
branco que culminaria numa “sociedade sem raças”:
[…] na realidade, a Negritude aparece como o tempo fraco de uma
progressão dialética: a afirmação teórica e prática da supremacia do
branco constitui a tese, a posição da negritude como valor antitético é o
momento da negatividade. Mas este momento negativo não possui
autossuficiência e os negros que o usam o sabem muito bem; sabem que
visa preparar a síntese ou a realização do humano numa sociedade sem
raças (SARTRE, 1968, p.122).
Ou seja, a afirmação do homem negro e a denúncia do racismo é um momento
para uma sociedade sem discriminação racial. Além disto Sartre vê uma ligação íntima
entre aqueles que lutam por estas duas formas de opressão, afirmando que “[…] os bardos
mais ardentes da Negritude são ao mesmo tempo militantes marxistas” (SARTRE, 1968,
p.122)
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Sartre e a fenomenologia do opressor
Estas teses de uma relação de lutas coordenadas entre classe e raça, além da busca
de uma sociedade sem raças num movimento dialético é questionável. O homem negro
colonizado não necessariamente afirma a solidariedade com todos outros grupos étnicos
oprimidos. Nem mesmo é consenso entre os homens negros a constituição de uma
sociedade integrada entre etnias. Embora possamos fazer uma ligação histórica entre
capitalismo mercantil/colonial e o racismo devido a escravidão nas Américas e na África,
não existe um movimento ao qual o indivíduo passa da luta contra o racismo para o
marxismo e solidariedade com o proletariado. É possível pensar em pessoas que
conciliam capitalismo, liberalismo e lutas antirracistas, embora seja compreensível no
interior de uma perspectiva marxista que tal visão conciliadora apareça como uma forma
cooptação da ideologia dominante. Além disso, embora tenha um potencial maior sobre
outros grupos tradicionalmente opressores pelo seu histórico, não há consenso entre os
homens negros sobre suas formas de emancipação apenas porque sofrem uma opressão
compartilhada.
Sartre em Reflexões sobre a questão judaica (1946) avalia o antissemitismo
particularmente na França, descrevendo entre outras temáticas as modalidades e tipos de
antissemitismo francês. O antissemitismo é uma postura de má-fé em que o outro (o
judeu) aparece como ameaçador e estranho à nação por pressuposto, tal qual um “bode
expiatório” para todas as mazelas e problemas sociais: “lembremos que o antissemitismo
é uma concepção maniqueísta e primitiva do mundo onde o ódio ao judeu aparece a título
de grande mito explicativo” (SARTRE, 1968, p.85). O antissemita propõe-se enquanto
aquele que representa realmente a França e trata a situação de culpabilização do judeu
como modo geral de omitir/esquivar-se dos problemas advindos de luta entre classes e
outras contradições do seu país. Já numa sociedade sem classes, Sartre acredita no fim do
antissemitismo justamente porque não haverá necessidade de culpabilização de um grupo
para explicar os antagonismos e contradições sociais. Mas, numa sociedade onde ainda
não ocorre o fim do antissemitismo, Sartre tematiza a necessidade do judeu ter uma
postura autêntica frente a sua condição, afirmando sua identidade e não se refugiando em
posturas de má-fé como um cosmopolitismo ou humanismo abstrato que o escusam de
lidar com o problema de sua situação. Sartre acredita que há uma dupla via: o judeu deve
identificar-se com suas origens e lutar contra o antissemitismo ao mesmo tempo que a
assimilação do judeu na sociedade será possível numa sociedade que suprime as classes:
358
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Sartre e a fenomenologia do opressor
Assim o judeu autêntico que se pensa como judeu porque o antissemita
o colocou em situação de judeu não se opõe à assimilação mais do que
o operário que, tornando-se consciente de sua pertinência a uma classe,
se opõe à liquidação das classes (SARTRE, 1968, p.86).
A visão de opressão e a demanda por autenticidade por parte de Sartre quanto ao
judeu é criticável na medida que não necessariamente o cosmopolitismo ou humanismo
de um judeu é sinônimo de evasão, mas de sincretismo de valores. Nem é claro e evidente
que numa sociedade sem classes haverá a assimilação da cultura judaica, nem que ela se
pauta apenas num antagonismo com o antissemitismo, ainda que no contexto da segunda
guerra mundial. Sartre também não indicia expressamente nesta obra o caráter sui generis
de opressão quanto à condição judaica junto às outras condicionantes como gênero e
classe.
Não podemos dizer também que Sartre seja de todo ignorante ao feminismo e à
opressão sofrida pelas mulheres. Ainda na década de 30 em Diários de uma guerra
estranha, embora sem maior profundidade sobre o assunto, Sartre encontra dificuldades
de resolver a questão do fim da opressão entre gêneros e revisa sua própria posição:
Durante muito tempo pensei que lhes expressava da melhor maneira
minha estima dizendo que eram iguais aos homens e reclamando para
elas a igualdade de direitos. Ao mesmo tempo, recusava-me a admitir
qualquer diferença radical entre os sexos e atribuía as diferenças
secundárias à educação e à sociedade. Mas estava servindo mal à causa
delas […] Toda a questão deve ser revisada. Mas certamente não será
afirmando a igualdade dos sexos, como bons racionalistas kantianos,
que resolveremos o problema; esse conceito de igualdade nada significa
e eu estava completamente errado (SARTRE, 1983, p.342).
Sartre explicita que a igualdade formal de direitos não é suficiente para assegurar
o fim do machismo e o asseguramento de uma igualdade, além de se dever considerar a
distinção entre o homem e a mulher, bem como suas condicionantes históricas.
Apesar dessas reflexões, o fato é que não tematiza este intercâmbio/
entrecruzamentos das relações entre opressor e oprimido, hoje melhor explorada pela
dimensão de interseccionalidade, conceito inspirado inicialmente na vivência das
mulheres negras estadunidenses. Crenshaw nos elucida metaforicamente a noção de
interseccionalidade:
O ponto é que as mulheres negras podem sofrer discriminação de várias
maneiras e que a contradição decorre de nossas suposições de que suas
reivindicações de exclusão devem ser unidirecionais. Considere uma
analogia para trafegar em um cruzamento, indo e vindo nas quatro
359
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Sartre e a fenomenologia do opressor
direções. A discriminação, como o tráfego através de um cruzamento,
pode fluir em uma direção e em outra. Se um acidente ocorrer em um
cruzamento, poderá ser causado por carros que viajam de várias
direções e, às vezes, de todas elas. Da mesma forma, se uma mulher
negra é prejudicada por estar no cruzamento, sua lesão pode resultar de
discriminação sexual ou discriminação racial (CRENSHAW, 1989,
p.149, tradução nossa)
Como expõe Crenshaw a ausência de compreensão da interseccionalidade, gerou
no contexto estadunidense uma referência central à vivência dos homens negros enquanto
vítimas do racismo e a discriminação de gênero referentes prioritariamente ao grupo de
mulheres brancas10. O não reconhecimento de formas de opressão híbridas ou
entrecruzadas excluem principalmente a realidade das mulheres negras em formas
particulares de preconceito11 nas Américas. Crenshaw (1989) desenvolve a recusa do
reconhecimento de discriminação específica entre mulheres negras, como evidente
marginalidade deste grupo que padece opressões interpenetradas: “Como resultado, as
mulheres negras – a classe de funcionários que, por causa de sua interseccionalidade, é
mais capaz de desafiar todas as formas de discriminação – são essencialmente isoladas e
geralmente precisam se defender por si” (CRENSHAW, 1989, p.145, tradução nossa)
Esta discussão sobre interseccionalidade, entretanto, não é incompatível, com a
análise sartriana e pode ser aglutinada a uma teorização sobre a opressão. Podemos
englobar essa tematização não desenvolvida em Sartre recorrendo a análise de situação.
O opressor oprime e perpassa diversas instâncias de opressão a partir do seu olhar acerca
de gênero, raça e classe. Embora haja opressores que perpassam todas essas dimensões
opressivas na sua visada, há também as opressões que ocorrem matizadas. Assim, um
operário pode oprimir sua esposa no ambiente doméstico e ser oprimido na fábrica pelo
patrão. Um homem negro oprimido pelo racismo pode reproduzir machismo no
relacionamento. Uma mulher branca pode oprimir a sua empregada doméstica negra.
Assim como uma mulher negra assalariada pode padecer de todas as dimensões de
opressão racista e classista numa fábrica através do patrão.
10
“Em outras palavras, o paradigma da discriminação sexual tende a basear-se nas experiências das
mulheres brancas; o modelo de discriminação racial tende a basear-se nas experiências dos negros mais
privilegiados” (CRENSHAW, 1989, p.150, tradução nossa).
11
“[...] Estou sugerindo que as mulheres negras podem sofrer discriminação de maneiras semelhantes e
diferentes daquelas vividas por mulheres brancas e homens negros. [...] E, às vezes, elas experimentam
discriminação como mulheres negras - não a soma de discriminação de raça e sexo, mas como mulheres
negras” (CRENSHAW,1989, p.149, tradução nossa).
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Sartre e a fenomenologia do opressor
Havendo uma multiplicidade de opressões e uma multiplicidade de visadas
opressoras há também vários modos de como os oprimidos padecem tal visada e um
intercâmbio de situações em que um indivíduo pode visar o outro como opressor ou ser
visado como oprimido. Não existe uma essência de opressor única que emana a cada
instante, mas é um modo de agir ligado ao projeto em curso numa dada situação e que em
outro momento pode não ocorrer, embora haja aparatos institucionais voltados para
reiterar esta opressão. Em suma, existem situações em que nós perpetuamos um projeto
opressor e em outros não, ainda que de modo irrefletido. Assim, é preciso frente ao caráter
ambíguo da opressão, que tem instâncias diversas e que vão além do capitalismo e do
racismo explicitados no apêndice II, estar numa vigilância para não reiterarmos de modo
irrefletido posições opressivas não exploradas e interseccionadas.
Neste sentido, a fenomenologia do opressor sartriana com as atualizações sobre
as uma dimensão interseccional de opressão contemporânea ressignificam a possibilidade
de investigar uma história de má-fé opressora. Compreende-se não só como o opressor
visa e age, mas se percebe que existem diversas formas de opressão interseccionais e que
analisá-las passa a ser não um simples estudo isolado da história opressora de classe ou
de raça. Passa-se a uma dimensão para os oprimidos de reavaliação de sua opressão, da
sua identidade e das diversas lutas que a perpassam. Como propõe Angela Davis: “O
grande desafio a nos encarar, [...] é uma compreensão do que as feministas
frequentemente chamam de interseccionalidade. Não apenas interseccionalidade de
identidades, mas interseccionalidade de lutas” (DAVIS, 2016, p. 144, tradução nossa)
6. Considerações finais
Analisamos neste artigo a proposta sartriana de uma fenomenologia do opressor e
observamos que a forma como o opressor visa o outro e o mundo são formas de má-fé
apoiadas em aparatos discursivos, políticos e institucionais. A má-fé, embora constituída
como uma das posturas possíveis do caráter ontológico do homem, é formada dentro de
quadros históricos e apresenta especificações contextualizadas no caso do opressor.
Observamos que o opressor no período escravocrata se baseou na má-fé de uma
legitimidade hierárquica e natural, enquanto a perspectiva do burguês se baseia numa máfé que nega a existência de classes e lutas entre classes, sendo as desigualdades e
distinções sociais apagadas por uma suposta cooperação entre os donos do meio de
produção e o trabalhador.
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Sartre e a fenomenologia do opressor
Observamos também que para além de uma situação histórica específica uma
fenomenologia do opressor se mostrou com três aspectos comuns: (1) a alteridade e a
liberdade alheia é vista pelo opressor numa atitude de má-fé; (2) o opressor procura uma
legalidade ao seu projeto de má-fé; (3) há a manutenção de sua atitude opressiva de máfé por meio de processos violentos. Avaliamos também que uma teorização da opressão
sartriana pode aglutinar uma discussão posterior sobre interseccionalidade para a
compreensão de ambiguidades sobre intercâmbios de papéis nas relações de opressão.
Se pensamos os dois exemplos (escravo e operário) tomados por Sartre em seu
artigo inacabado, podemos propor que atualmente estes grupos oprimidos se modificaram
e se encontram herdeiros de novas relações de opressão. Um dos casos é a do homem
negro nas Américas, ainda marginalizado e ao qual padece do racismo reverberado
historicamente da escravidão. A evasão do opressor hoje se encontra em esquivas e
negações
de
haverem
locais
institucionais
vedados
majoritariamente
aos
afrodescendentes como na universidade e altos postos políticos. Outra forma de má-fé é
a evasão do racismo pelo opressor ocorre pelo discurso de miscigenação étnica como
formas de mitigar a relevância de políticas públicas como implementação de cotas para
grupos étnicos.
Já o operariado explorado foi ampliado para um modelo mais abrangente de
precarização, sem necessariamente estarem vinculados à forma de exploração fabril
clássica e denota transformação histórica entre a opressão e o trabalho. A má-fé do
opressor em qualificar o setor de serviços atualmente como uma dimensão não insalubre
para a vida do trabalhador e a constante flexibilização dos direitos trabalhistas sob falsos
pretextos de adaptação geram um novo tipo de evasão ou má-fé opressora que também
merecem ser analisados por meio do pensamento sartriano, agora sob as condições do
século XXI.
Mostramos, por fim, que não é impossível fazer uma análise que considera
também o histórico-social por meio de categoria do período de escrita ainda dos anos
quarenta. Concluímos sob a perspectiva de que uma fenomenologia do opressor precisa
ser sempre reinvestida de reflexão de acordo com os novos opressores e mudança de
situação, mas que tal análise é um exemplo de como as caracterizações da ontologia
fenomenológica podem ainda encontrar reverberações nas áreas das humanidades mais
diversas e na compreensão da situação sociopolítica.
Referências
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Kínesis, Vol. XIII, n° 34, julho 2021, p.343-363
Sartre e a fenomenologia do opressor
ALMEIDA. L. Sartre, Direito e política. Ontologia, liberdade e Revolução. 223 f. Tese
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Recebido em: 22/11/2020
Aprovado em: 19/12/2020
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